Bolivia
Importantes lutas enfrentam a política salarial de Evo Morales
22/05/2007 La Verdad Obrera N° 234
Nas últimas semanas uma onda de greves e mobilizações de distintos setores de trabalhadores correu pelo país. Entre elas, as de professores, da saúde e dos mineiros:
Mais de 12 mil trabalhadores do sistema de saúde pública pararam por duas semanas, com mobilizações, bloqueios de ruas e até uma breve ocupação do Ministério reivindicando aumento de 20% no salário mínimo, entre outras melhorias, até que o governo e dirigentes acordaram um compromisso que apenas aumenta em 6% o salário e não atende as principais demandas.
Dezenas de milhares de professores urbanos e rurais realizaram paralisações e marchas gigantescas em La Paz e outras cidades, exigindo um aumento salarial superior ao 6% oferecido pelo governo, a devolução dos descontos e outras demandas. A Confederação do Magistério Urbano (dirigida pelo stalinista Partido Comunista da Bolívia que é parte do governo) traiu a luta e aceitou o ponto final imposto pelo MAS. Entretanto, o descontentamento segue e a Federação Departamental do Magistério Urbano de La Paz anuncia novas medidas de pressão resistindo aos ataques a antigas conquistas, incluídas no atual quadro docente, que significará a nova lei educativa que impulsiona o oficialismo.
No final de abril, os 5 mil mineiros de Huanuni, após fazer massivas assembléias, se declararam em greve geral por tempo indeterminado e pararam vários dias até obrigar as autoridades da COMIBOL (Corporação Mineira da Bolívia) a manter o bônus na produção de 70% sobre o salário, que na verdade queriam que fosse apenas 40%. Ainda que o governo tenha desmobilizado esses importantes conflitos, continua o descontentamento nas ruas: os estudantes normalistas (que protestam contra a nova lei da educação), os universitários da UPEA e Siglo XX, os vendedores de brechós, os trabalhadores excluídos do sistema jubilatório, os descapacitados, os ex-mineiros de Catavi-Siglo XX (que ocuparam a sede da COMIBOL) e outros setores reivindicam com marchas, greves de fome e outras medidas pelas sentidas demandas setoriais que o MAS nega a atender.
A questão salarial, uma "bomba de tempo"
O aumento do salário mínimo nacional (SMN) de 5% anunciado por Evo Moralos no 1° de maio é uma piada: são 25 pesos bolivianos (3 dólares) que apenas compensam a inflação de 2006, estimada oficialmente em 4,95%. O gesto demagógico de fazê-lo estensivo ao setor privado, busca bloquear a pressão salarial.
Em efeito, ainda que os salários industriais estejam muito baixos e em muitos casos nem sequer se paga o SMN de 525 bolivianos (bs.), em certos setores (minério, construção, etc) há uma tendência do boom destas atividades: o pagamento em algumas zonas mineiras está em 100 bs. e os agroindustriais de Santa Cruz temem que este anos lhes falta a mão de obra barata das “safras” andinos.
Enquanto a economia cresceu nos últimos dois anos uns 10%; as exportações se triplicaram até 4.000 milhões de dólares; o Estado acumula um crescente superávit fiscal e os lucros empresariais se tem elevado astronomicamente; o salário perdeu no mesmo lapso 10% de seu poder aquisitivo. A Central Operária Boliviana (COB) se vê obrigada a pedir um SMN de 1800 bs quando a média nacional é de apenas uns 870 bs. (110 dólares)
Esta situação é intolerável para centenas de milhares de trabalhadores. Objetivamente, a discussão do salário está começando a colocar-se na ordem do dia nas empresas, fábricas e oficonas, e é um dos motores do processo de reorganização de novos sindicatos e do descontentamento com a burocracia sindical.
O MAS protege os lucros dos capitalistas contra os trabalhadores
Porém isso ameaça um dos pilares do pacto entre os industriais e exportadores e o MAS, que é a manutenção do status quo salarial e as condições subumanas de trabalho nas fábricas, fonte dos enormes lucros que vem embolsando os capitalistas de todos os rubros.
Não é casual então a dureza com que Evo Morales (que ameaçou declarar como "profissional liberal" os professores) e todo seu governo saíram a enfrentar as reivindicações salariais, inclusive com repressão policial. Nem tampouco a hostilidade com que o Ministério do Trabalho recebe qualquer tentativa de organização sindical nas empresas.
A direção da COB, COR de El Alto, Federação de Fábricas de La Paz e outras instâncias sindicais que apoiam o governo "olharam para o outro lado", deixando as lutas a sua sorte ou colocando-se abertamente contra elas.
Essa "aliança" que opõe governo, empresários e burocracia sindical as lutas setoriais obedece ao temor de que seu triunfo possa "contagiar" ao conjunto da classe trabalhadora.
Por um grande movimento pelas demandas operárias
Ainda que por hora não tenha podido ultrapassar a política salarial do governo, esta importante onda de lutas mostra que há condições para dar grandes passos no caminho de colocar de pé as forças do proletariado.
Junto a dirigentes e trabalhadores da SITRASABSA (aeronáuticos), fabris, Limpeza Urbana de El Alto, operários e operárias de outros setores, os trotskistas da LOR-CI chamamos os sindicatos combativos, os trabalhadores avançados, os grupos da esquerda que se reivindicam operários e socialistas a impulsionar um grande movimento pelas demandas operárias e a organização dos trabalhadores, pelo apoio e coordenação das lutas, plena democracia operária e a independência política da classe trabalhadora em relação ao MAS e aos partidos burgueses. Neste sentido seria um importante passo adiante concretizar um instrumento político dos trabalhadores baseado nos sindicatos, como se vêm discutindo há tempos nos meios sindicais.
Impulsionamos este movimento propondo um programa transicional que, partindo das reivindicações mais sentidas, como o salário, a jornada de 8 horas, a estabilidade trabalhista e contra o despotismo dos empresários, prepare a perspectiva da auto organização dos trabalhadores e da luta por um governo operário e camponês.
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– O governo do MAS e os trabalhadores
Após um ano e meio de governo, o MAS vem aplicando a rajatabla sua estratégia de colaboração de classe com empresários, latifundiários e transnacionais; e pra além de gestos ou discursos, não há respostas para a "Agenda de Outubro" (verdadeira nacionalização do gás) e as demandas dos trabalhadores, camponeses, povos nativos e setores populares.
Neste marco, tem começado um importante processo de experiência política com o reformismo do MAS entre setores avançados das massas, como mostraram o levantamento de Cochabamba em janeiro, a luta do Chaco depois e as recentes greves e mobilizações salariais.
Ao mesmo tempo, continua o processo de reorganização das fileiras operárias, expressado no surgimento quase cotidiano de novos sindicatos e no questionamento aos burocratas.
Tudo isso coloca a necessidade de desenvolver a mobilização dos trabalhadores e do povo, por suas justas e impostergáveis demandas, defendendo a independência política de nossas organizações frente ao governo e aos partidos burgueses. É necessário pôr de pé a classe trabalhadora para que essa possa aparecer com toda sua força no cenário político nacional e forjar a aliança operária, camponesa, nativa e popular que se necessita para triunfar, abrindo o caminho a uma saída operária e camponesa frente a miséria, a opressão, a exploração e a submissão ao imperialismo.