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França: apesar da repressão e do isolamento

O que fica da revolta

24/11/2005

O que fica da revolta

Autor: Lucas Pizzutti

Fonte: La Verdad Obrera - 176

Após três semanas de enfrentamentos, a revolta das periferias aparentemente se acalmou. O governo impôs o Estado de Emergência, e com uma importante ofensiva repressiva conseguiu acalmar a situação. Uma vez concluído o período decretado pelo governo, a Câmara de Deputados votou prolongar a medida por três meses. Podem-se contar 3101 detidos e processados, dos que já foram condenados em julgamentos acelerados 562 maiores (de 18 a 25 anos) e 118 menores. As penas vão de 1 mês a 4 anos de prisão. O porta-voz do governo Jean-François Cope declarou recentemente que havia voltado ã normalidade, e que “somente” se haviam queimado “noventa e dois automóveis, a média diária da França”. Ato falho ou não, Cope revelou que nos bairros se vive uma tensão permanente, e que mesmo com o monstruoso aparato repressivo, o estado de ânimo da revolta continua.

É que ali as diferenças sociais são particularmente evidentes. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial os sucessivos governos franceses foram instalando em sórdidos prédios nos arredores das cidades aos imigrantes (em geral provenientes das colônias francesas) que a burguesia necessitava para fazer funcionar uma economia que crescia. Eles faziam (e fazem) os piores trabalhos, ou aqueles que os nativos já não aceitavam fazer. Pese o seu papel na economia, os imigrantes, seus filhos e netos são cidadãos de segunda. Estas urbanizações, com população multi-étnica, constituem uma espécie de semicolonia interna, onde as liberdades democráticas são permanentemente restritas. As prisões pelos traços dos rostos constituem a norma, o que provoca um lógico mal-estar entre a juventude e os trabalhadores das periferias.

Por outro lado, nos guetos o desemprego duplica a média nacional (20%) e entre a juventude chega a 40%. Os “serviços públicos” são defeituosos e mais caros que na cidade, em geral o metrô não chega, os ônibus são caros e lentos. As escolas estão desprovidas e o regime educativo trata de desmoralizá-los, para que entrem nas “escolas de ofícios”. É lógico que os jovens identifiquem estas instituições como algo alheio, ou diretamente hostil.

Os jovens não são “ignorantes” ou “inconscientes” como os chamam os partidos de “esquerda”, ou os sindicatos que querem se envolver e os deixam isolados: cada vez que têm oportunidade de se expressar dizem claramente que estão contra o racismo que lhes impede de conseguir trabalho, denunciam a repressão e pedem claramente a renúncia de Sarkozy. A sua maneira tentam fazer com que suas reivindicações triunfem. É justamente por esta posição da “esquerda” e dos sindicatos que se viu fortalecida a política repressiva do governo, cujo representante mais direitista Sarkozy mantém hoje uma imagem positiva superior a 50%.

O que sucedeu nestas três semanas foi um enorme levantamento espontâneo. Não só os partidos do regime chamavam por um lado a ter “calma” e por outro ã repressão; os dirigentes da União de Organizações Islà¢micas da França emitiram uma condenação ao levantamento, fato que foi absolutamente ignorado pelos “revoltosos”, em sua maioria de origem muçulmana. Estes jovens que atualmente não participam na política nem nos sindicatos, fizeram sua primeira aparição no cenário político, ainda que de forma elementar. Poderíamos afirmar que uma nova geração, os filhos da imigração, deu a luz no coração da Europa. O estrago que faz a política dos países imperialistas no chamado Terceiro Mundo começa a mostrar seu contrapeso no Velho Continente. A simpatia e solidariedade com a revolta em dezenas de cidades da Europa revelam a profundidade do processo em curso.

Crise de regime, crise do PS

A crise do “NÃO” ao Tratado Constitucional, se a analisa atentamente, mostrou a grande crise do Partido Socialista. De fato, este partido foi o único que deu uma consigna de voto que não foi respeitada pelos seus votantes. O Congresso de Le Mans deste fim de semana não conseguiu resolver a crise interna. Reelegeram uma direção repudiada nas urnas em 29 de abril, deixaram na “oposição” aqueles que haviam votado NÃO e estes o aceitaram, por que na realidade Fabius, Emmanuelli e Melenchon não têm um projeto alternativo ã direção de Hollande.

A luta interna é por cargos, já que o “partido histórico da classe operária” já não é tal. Já não representa, nem de forma distorcida, as aspirações dos trabalhadores. O OS é hoje uma maquinaria eleitoral, isolada da classe trabalhadora, e cada vez mais distante de sua própria base eleitoral. Muito menos tem algo a dizer das revoltas das periferias! O diário Liberátion publicou dados muito interessantes neste sentido, o mais impressionante é que um terço dos “militantes” têm um cargo eleito (deputado, senador, governador da província ou da região). A isto há que agregar um número similar, ou ainda maior, de “assessores” e empregados destes funcionários. O diário a chama “militância eleitoral”, isto é, quase ninguém milita de forma desinteressada no PS.

Este velho partido, pese haver ganhado as eleições regionais de 2004 (mérito da impopularidade de Chirac), não tem nenhum papel dirigente entre as massas operárias e populares, e se afunda em uma lenta agonia que contagia ao conjunto do regime francês. Nas periferias a relação com a juventude é ainda pior. Seus “militantes” são empregados de “ONG” que tentam “acalmar” os jovens dos subúrbios. Mas não convencem a quase ninguém. “Os garotos com quem eu cresci tentam me fazer entender (...) que não há nada mais que a violência, até me dizem para ir atirar pedras com eles...Não distinguem a esquerda da direita, e me tomam por um tipo que negocia com o poder...”. A crise do PS é a crise de um regime que não tem um partido “dirigente” entre os trabalhadores e os setores empobrecidos e não pode inventá-lo da noite para a manhã.

A unidade operária e popular: assinatura pendente

Contrariamente a posição da esquerda “oficial” e dos sindicatos que condenam a revolta e chamam ordem, os revolucionários entendemos a violência da revolta das periferias como produto da política racista dos sucessivos governos. Entretanto, não compartilhamos seus métodos já que são impotentes para derrotar a política do Estado francês e do imperialismo.

É claro que não é culpa dos jovens, senão dos burocratas sindicais e dos políticos social-liberais (do PS ou de seus aliados Verdes, ou ainda o PCF) o fato de que atualmente esteja isolada a classe trabalhadora. Nas últimas “jornadas de luta” isoladas chamadas pela burocracia sindical, se desgastaram uma parte da energia da classe trabalhadora. Os trabalhadores sabem positivamente que os burocratas não darão a “luta até o final”, e que como se viu no caso das lutas pelo emprego público os “sindicalistas” deixaram passar a privatização da eletricidade e do gás, os recortes na segurança social, nos correios, ensino e etc. Assim como começa a despontar uma nova geração juvenil que entra na cena política, faz falta a entrada em cena de uma nova geração da classe operária que se desembarace dos burocratas e mude de direção este ciclo de derrotas.

A organização dos jovens da periferia em organizações comuns da classe operária, que lutem contra o racismo e a repressão policial, pela repartição das horas de trabalho entre ocupados e desempregados, e pelas demandas legítimas dos imigrantes será um primeiro passo no caminho de unir a classe trabalhadora. Neste caminho, tem que se dar a luta pela construção de um partido revolucionário no qual sejam sujeitos os operários combativos e os “revoltosos” das periferias.

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