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O debate na “extrema esquerda” francesa
11 Mar 2008 |

Na França a chamada extreme gauche (extrema esquerda), termo que se utiliza para diferenciá-la da esquerda reformista tradicional, composta pelo Partido Socialista (OS) e o Partido Comunista (PCF), conta com três organizações principais, que possuem cada uma entre 3 e 5 mil militantes, numerosos simpatizantes e uma importante presença eleitoral. São elas: Lutte Ouvriére (LO), que tem há anos Arlette Laguiller como figura pública, a Liga Comunista Revolucionária (LCR), principal organização do chamado Secretariado Unificado da IV Internacional e o Partido dos Trabalhadores, cujo dirigente histórico, Pierre Lambert, faleceu há poucas semanas.

Em dezembro de 2007, o Congresso da LO adotou uma resolução de constituir candidaturas comuns com o PS e o PCF para as próximas eleições municipais. Na seqüência, em janeiro de 2008, suspendeu sua fração pública [1] que se opunha a essa linha oportunista, o que de fato se constituiu como uma expulsão. Esta orientação se concretizou na apresentação de 59 candidaturas unitárias encabeçadas pelo PCF ou pelo PS no primeiro turno das eleições que se realizarão no dia 9 de março deste ano.

Este é um giro histórico: a LO se incorpora pela primeira vez na “União das Esquerdas” (PS-PCF) que sempre criticou e combateu. Torna-se pior ainda ao mostrar que seu giro não tem um caráter tático, pois a LO se comprometeu em numerosas cidades a votar os orçamentos municipais de eventuais prefeituras do PS, o que implica o apoio político aos financiamentos públicos ás empresas, em troca da presença em algumas candidaturas ou, o que é mais grave, do cargo de adjunto del intendente. Como vemos, um absurdo oportunista que os leva em algumas cidades a votar em patrões de empresas que empregam mais de 700 operários e possuem vendas anuais que superam 100 milhões de euros, como é o caso de Perpignan. A perda de quase dois milhões de votos nas últimas eleições presidenciais (encabeçada por sua figura Arlette Laguiller) levou a direção da LO a buscar qualquer caminho para tentar manter os seus cargos municipais. Quer dizer, uma estratégia eleitoralista que pela via da aliança com o PS a compromete com um bloco de governo participando da “gestão” local do estado burguês.
Por sua vez, a LCR, em seu XVII Congresso, realizado no final de janeiro deste ano, lançou um chamado aos “operários, sindicalistas, altermundistas, internacionalistas, ecologistas e feministas” de distintas “tradições” e “sensibilidades” pela construção de um “novo partido anti-capitalista”. As bases teóricas deste “partido anti-capitalista amplo” já foram criticadas por nossa corrente na revista Estrategia Internacional n°24 [2].

O novo partido não tem um programa definido, o que não impediu a direção da LCR renunciar a toda referência trotskista e a sua auto-definição como “comunista revolucionária”. No entanto, o verdadeiro conteúdo da nova organização pode ser percebido nas declarações dos candidatos para as eleições municipais impulsionados pela LCR. Armelle Chevassu, que não é membro da Liga e encabeça a candidatura em um dos distritos mais importantes da cidade de Marselha, afirmou: “Não somos nem revolucionários e nem extremistas... o que propomos é o que diziam os socialistas há trinta e cinco anos atrás” (Liberation, 09/02/08), quer dizer, o programa reformista comum do PS-PCF que acabavam de trair a greve geral de maio de 1968. Como mostra o “chamado”, o “novo partido anti-capitalista” defende uma “mudança social”, mas não se pronuncia pela necessidade de uma revolução social, por isso não existe a menor referência à luta por um governo operário.

Tudo isso confirma que a renúncia da ditadura do proletariado por parte da LCR (mudança votada pelo Congresso de 2003) não era uma questão terminológica e sim um giro oportunista. Esta orientação se aprofunda agora com a auto-dissolução da LCR em uma organização programaticamente ambígua e aberta ao reformismo, ainda que seja apresentada como um passo adiante para um reagrupamento superior.

O Congresso defendeu como um divisor de águas na esquerda a questão da independência do Estado e suas instituições, recordando que a participação em governo burgueses social-liberais levou ã débâcle da esquerda em países como Itália e Brasil, segundo a intervenção dos principais dirigentes da LCR, referindo-se a integração da corrente Democracia Socialista [3] ao governo Lula, com Miguel Rossetto como ministro e a derrota do projeto da Refundação Comunista na Itália.

No entanto, a defesa da “democracia participativa” presente nos programas municipais das candidaturas da LCR demonstra que esta delimitação é somente parcial. Ao continuar reivindicando a experiência passada da esquerda do Partido dos Trabalhadores (PT) na prefeitura de Porto Alegre e o orçamento participativo, apresentado como um germe de duplo poder pelos teóricos da LCR, prepara as condições para uma integração futura ao estado burguês, tal como ocorreu com a organização irmã da LCR no Brasil. Ainda assim, a crise do reformismo tradicional na França, com a transformação ao social-liberalismo do OS e a crise terminal de seu satélite, o PCF, abre um vazio de representação dos trabalhadores que a LCR, alentada pela simpatia que desperta Olivier Besancenot [4], busca alcançar com o seu chamado.

Frente esta situação é uma obrigação dos que nos reivindicamos revolucionários ter uma política para influenciar os jovens e os trabalhadores de vanguarda que se vejam atraídos por este projeto deliberadamente “ambíguo” da direção da Liga. No marco dos posicionamentos das principais organizações da extreme gauche francesa, apresentamos aos nossos leitores parte do debate que esses acontecimentos incentivaram [5]. Em primeiro lugar publicamos um artigo chamado Lutte Ouvrière: sectarismo e oportunismo de Yvan Lemaitre, dirigente da ex-tendência Démocratie révolutionnaire (Democracia Revolucionária) e hoje membro da maioria da LCR. Em segundo lugar, extratos de uma carta assinada por Jacques Morand em nome da “Fração da LO” ao Congresso da LCR, com que nos solidarizamos frente a exclusão burocrática de sua corrente da LO.

Por último, reproduzimos extratos de um artigo sobre a luta de classes e a situação da extrema esquerda francesa do Groupe CRI (Communiste Révolutionnaire Internationaliste), com o qual a Fração Trotskista - Quarta Internacional, da qual forma o PTS, iniciou discussões fraternais sobre o programa e a prática dos revolucionários na França e internacionalmente.

Traduzido por: Luís Siebel

 

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