O PSOE será o gestor do reajuste econômico sobre os trabalhadores.
Primeiro governo de Zapatero, o pai da paz social.
A principal conquista do PSOE tem sido acabar com o ciclo de lutas que se abriu em 2001 contra o Governo do Partido Popular (PP). Este último se localiza na ofensiva, opondo-se ao Governo “socialista” com um discurso espanhol ultranacionalista e católico. Todos estes fatores fizeram voltar ás suas casas a juventude e os trabalhadores, construindo a imagem de um Governo de “esquerdas” acusado pela direita mais conservadora nas instituições e na rua. A capital da paz social terá agora que utilizar o governo, sim ou sim, para avançar na aplicação das políticas da patronal, que estiveram menos hierarquizadas ultimamente porque o crescimento econômico permitia e a instauração da “pacificação” o requeria.
Ares de crise na economia espanhola
A crise financeira internacional tem aprofundado a desaceleração da economia espanhola e, sobretudo o desinflar da bolha imobiliária. A crise imobiliária está se irradiando para o resto dos setores da economia; a produção industrial vem decaindo desde 2007, o desemprego aumentou em mais de 200.000 pessoas nos últimos meses e as revisões ã baixa do crescimento econômico para 2008 são uma constante. A crise “subprime” tem aberto a caixa de Pandora do capitalismo espanhol, vindo a luz todos os desequilíbrios que tem sido os motores do crescimento fabuloso da ultima década.
Desde a CEOE até o Financial Times tem se advertido que o Estado Espanhol tem que realizar importantes reformas estruturais, que passam, inevitavelmente, por um maior ataque contra a classe operária e a juventude.
A primeira medida anunciada é a intenção de chegar a um Grande Acordo Nacional entre o Governo, a patronal e a burocracia sindical, para fazer frente ã desaceleração. Podemos adiantar dizendo que se tratará de uma contra-reforma que “recupere o tempo perdido”, ao estilo das reformas pactuadas dos anos 1990, que da mão da burocracia introduziram a precariedade trabalhista massiva e a perda de poder aquisitivo.
Um parlamento mais bi-color e ã direita.
Juntos, o PP e o PSOE alcançam 83% dos votos e 92% dos deputados, há 20 anos só somavam 65% dos votos. A burguesia espanhola tem consolidado o modelo bi-partidarista de sua monarquia constitucional.
A direitização do PP tem mobilizado a sua pequena porção de eleitorado que o haviam dado as costas depois do 11M (atentados em Madrid em 11/03/2004), mas, sobretudo o que tem provocado a alta participação de milhares de jovens e trabalhadores como em 2004 é o “medo da direita” e a opção pelo “voto útil” a Zapatero. Estes resultados mostram que existe uma bi-polarização importante, de um lado reacionária/ofensiva e do outro reformista/defensiva. O que quer que ocorra no PP a partir de agora é, todavia, uma incógnita. A disputa entre os “neocon” espanhóis e os moderados marcará se Zapatero conta com a margem necessária para posar de esquerda diante de uma oposição ultra, ou se o “espírito de Estado” reconcilia os grandes partidos.
Os partidos patronais do nacionalismo conservador mantiveram sua influencia, apesar de terem diminuído em votos, mais em Euskadjnque que em Catalunha, e são hoje por hoje peças chaves para a governabilidade. Nas províncias onde o MLNV tem mais peso, Guipuzcoa e Vizcaya, a abstenção (consigna eleitoral da “esquerda abertxale” ante a escandalosa proibição deste partido) tem subido 17 e 8 pontos respectivamente, em contraposição ás cifras do resto do Estado, o qual é um medidor da influência que o independentismo basco mantêm. O grande fracasso foi o das forças ã “esquerda” do PSOE, especialmente IU e ERC. Têm pagado por sua política de submissão ao PSOE no Estado (perdendo 25%), mas seu golpe mais significativo eles levaram na Catalunha (perdendo mais de 50%), onde co-governam com o PSC, tanto pelo voto útil a ZP a nível do Estado, como pela alta abstenção que se deu na Catalunha.
As lutas que se vêm dando na Catalunha contra o Governo Tripartite (PSC-EUiA/IC-ERC), como a dos condutores de ônibus de Barcelona ou o incipiente movimento estudantil contra as reformas universitárias do Plano Bolonha, que expressam rupturas da vanguarda com a paz social geral, são as pontas da lança contra o Governo de parte de setores mais politizados que tem feito uma experiência com Zapatero e seus sócios e buscam as formas de se deslocarem das direções burocráticas de CCOO e UGT.
O que se vê, é um Governo re-eleito, temporalmente fortalecido, disposto a avançar na re-estruturação da economia espanhola e nos gastos dos trabalhadores, com um Parlamento mais ã direita, que pode chegar a se apoiar quase por unanimidade se vence o setor moderado do PP, e em princípio com uma burocracia sindical amiga.
Se preparar para lutar contra o Governo do PSOE e seus sócios no Parlamento e nos sindicatos.
Começa uma nova candidatura diferente da anterior que não vai estar fundamentada sob o teatro da “mudança tranqüila”, mas, ao contrário, num maior ataque. As contra-reformas do PSOE e a deterioração da economia vão pesar e muito sobre a já castigada classe operária e a juventude.
Os anos de crescimento econômico só têm trazido uma deterioração das condições de vida e trabalho. Nos tempos de crise o PSOE garantirá os bons negócios da patronal e os bancos as custas de deixar cair todo o peso de uma reestruturação econômica sobre nossos ombros. O aumento da repressão contra os lutadores operários e estudantis, e de forma brutal contra o MLNV, na primeira candidatura, anunciam também um Governo de linha dura contra os setores que não se submetam ã paz social e ainda mais reacionário em reprimir violentamente as lutas pelos direitos das nacionalidades oprimidas, piorando, no que couber, os problemas democráticos nacionais.
As lutas da Catalunha, que se dão em confronto com o Tripartite (governo catalào formado pelos socialistas, a esquerda republicana e os verdes), com tendências a formas de democracia direta, podem anunciar o que virá: provocarão desprendimentos de setores de vanguarda que dão processos mais qualitativos, fazendo a experiência com o PSOE e questionando a burocracia sindical do CCOO e UGT.
A linha dura e o diálogo social pelas alturas são, ainda, difícil que contenham indefinidamente estes processos. A classe operária do Estado espanhol tem que se colocar em pé para lutar para que a crise seja paga pelos capitalistas, levantando uma alternativa de classe que freie as tentativas de um setor da burguesia de desviar o conflito para posições racistas que dividam a classe em chave reacionária.
Desde o CcC vemos a importância de rodear de solidariedade e apoio as lutas que se dêem, participando em seu seio com um programa que ajude a avançar os explorados sobre os benefícios da patronal e os bancos. E ao mesmo tempo, por um programa de luta que permita superar as direções pró-governo do movimento operário, que promova formas de auto-organização e democracia direta para dirigir as lutas, coordená-las e estendê-las, na perspectiva de recuperar os sindicatos da burocracia traidora que os controla.
Ao mesmo tempo, a débâcle da “esquerda” institucional alternativa mostra sua bancarrota diante de setores importantes da vanguarda. Pode-se abrir a possibilidade de discutir com jovens e trabalhadores a necessidade de forjar uma alternativa política dos explorados. Para nós, marxistas revolucionários, devemos defender entre a vanguarda a idéia de criar uma ferramenta revolucionária que ocupe o espaço da representação operária dos velhos partidos operário-burgueses reformistas já convertidos ao social-liberalismo desde há algumas décadas e que são os agentes das reformas neoliberais no caso do PSOE e seus sócios seguidistas no caso da IU. Uma ferramenta que seja independente de qualquer ala, burguesas ou pequeno-burguesas, que não caia em fórmulas de conciliação de classes com programas antineoliberais ou democráticos radicais, para que não repita formulações de reformismos de esquerda ao estilo Refundação Comunista, que tem acabado na mesma bancarrota, apoiando o Governo Prodi. A superação daqueles que tem expropriado a representação política de nossa classe, capitalizando-a para administrar os ataques aos trabalhadores, tem que se transformar em chave revolucionária, levantando um programa na perspectiva da Revolução Socialista e da luta por um Governo operário e popular, única via para resolver definitivamente os problemas dos explorados com base a nacionalização da economia e sua planificação por parte dos trabalhadores e do povo, além da separação definitiva Igreja/Estado, do direito de autodeterminação e do julgamento e castigo dos responsáveis pela ditadura.
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Siglas
– CEOE: Confederação Espanhola de Organizações Empresariais
– MLNV: Movimento de Libertação Nacional Basco, que compreende o braço militar, ETA, partidos políticos (Batasuna, PCTV, ANV), sindicatos (LAB) e organizações juvenis (SEGI, SAIKA) e sociais (Gestoras pro-anistía). Também é conhecido como “Esquerda Abertxale”.
– IU: Esquerda Unida, a “refundação” do PCE de 1986 com outros setores da esquerda reformista. Na Catalunha se denominam EUiA e vão em conciliação com os eco-socialistas de iniciativa pela Catalunha (IC).
– ECR: Ezquerra Republicana da Catalunha, partido nacionalista, com importantes setores independentistas, sobretudo na sua juventude (JERC), de corte de esquerdas.
– PSC: Partido dos Socialistas Catalàes (sessão català do PSOE)
– CCOO: Comissões operárias, sindicato fundado pelo PCE na etapa final do franquismo, hoje controlado pelo PSOE e pela ala direita da IU.
– UGT: União Geral dos Trabalhadores (central sindical tradicional controlado pelo PSOE).
Traduzido por Felipe Lomonaco.
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