O dia 11/8 na Argentina foi palco de um enorme triunfo da esquerda revolucionária no âmbito eleitoral da luta de classes. Como conclusão de uma grande campanha militante, nas chamadas PASO (ou eleições prévias abertas, um sistema antidemocrático para vetar a participação de organizações não patronais na eleições), a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores, (composta pelo Partido Obrero, pelo Partido dos Trabalhadores Socialistas e a Esquerda Socialista) conquistou mais de 900.000 votos a nível nacional (350.000 na Grande Buenos Aires, 4%), superando amplamente os resultados de 2011 e postulando-se como a quarta força nacional nestas eleições. Em Mendoza, a FIT conseguiu ser a terceira força política, com quase 8% dos votos. Em Córdoba, 5,6% dos votos, 9% na capital. Jujuy (9,3%), Salta (11,3%) e Santa Cruz (7,8%), foram outros destaques da jornada. O governo de Cristina Kirchner sofreu uma derrota sem atenuantes: enquanto nas eleições de 2011 havia-se eleito com 54% dos votos, seu partido Frente Para a Vitória conseguiu apenas 26% a nível nacional, perdeu nos cinco principais distritos (Estado de Buenos Aires, Capital Federal, Córdoba, Santa Fé e Mendoza). Em meio ã crise de sucessão do oficialismo, que se expressa da divisão do peronismo argentino em distintos grupos que se levam por trás de variantes patronais, a FIT fez uma eleição histórica para a esquerda anticapitalista, classista e socialista.
A FIT se transformou em alternativa de esquerda para imensas camadas de trabalhadores e jovens por sua permanente presença militante nas lutas políticas e sociais deste período, tão importante quanto a continuidade das discussões públicas das diferenças entre as distintas forças da Frente na luta de classes (como foi o forte debate programático antes da composição da Frente). A partir do PTS, fomos os que denunciamos a espionagem ilegal do Estado ás organizações de esquerda e movimentos sociais (chamado “Projeto X”); os que levamos adiante a campanha pela prisão do burocrata sindical José Pedraza, responsável pelo assassinato do militante do PO, Mariano Ferreyra. Os que denunciamos as máfias do transporte responsáveis por tragédias sociais nos acidentes no metrô e nas ferrovias; que lutamos pela punição de todos os responsáveis pela ditadura genocida que ceifou a vida de 30.000 pessoas. A mesma militância, que impulsiona dezenas de chapas antiburocráticas nos sindicatos e nos centros estudantis, estando na linha de frente de cada luta operária (desde Zanon, até Kraft, Lear, Kromberg, Volkswagen), lutando pela educação pública nas escolas e faculdades e no movimento estudantil, que batalhamos no terreno das idéias com publicações da esquerda classista e que aproveita as posições provisórias no parlamento para denunciar esta cova de ladrões em sua entrega dos recursos naturais do país ao imperialismo, como no caso do petróleo ã Chevron, são os candidatos apresentados pela FIT, grandes referentes das lutas dos trabalhadores nos locais de trabalho, nas comissões de fábricas, nos sindicatos, nas universidades.
Os próprios candidatos são grandes referentes das lutas dos trabalhadores nos locais de trabalho, nas comissões de fábricas, nos sindicatos, nas universidades. A propaganda eleitoral da FIT fez um estrondo em toda a mídia argentina: teve grande êxito em diferenciar-se de todas as forças da centro-esquerda e da patronal, em apontar que as respostas aos problemas de fundo podem ser dadas nas mobilizações extraparlamentares, enfrentando-se diretamente com a burguesia e seu regime: combinando demandas “mínimas” (contra o imposto ao salário operário, pelo direito a aposentadoria plena, educação, saúde e transporte públicos e de qualidade) com demandas de “transição” (“terminar com a precarização do trabalho”, “varrer a burocracia sindical”, “que os deputados ganhem o mesmo que um trabalhador”), foram tribunas de ataque aos lucros das empresas e ao parasitismo dos funcionários burgueses. Aproveitando-se das lutas de massas no Brasil, mostrou a milhões que o desafio não é meramente canalizar o descontentamento operário e popular para obter bancadas e espaços estáveis por dentro do regime burguês (como costuma fazer a “esquerda tradicional” brasileira, que aprofunda sua adaptação ao regime democrático burguês neste domínio hostil aos trabalhadores), mas em utilizar a tribuna eleitoral para fortalecer as lutas em curso, e ser ferramenta para a construção de um verdadeiro partido revolucionário, com dezenas de milhares de militantes que seja expressão avançada dos trabalhadores tomando seus interesses históricos em suas mãos para dirigir o conjunto de sua classe em toda as manifestações da vida social contra esta sociedade de miséria e exploração.
Em menos de oito meses, desde a paralisação nacional do 20 de novembro na Argentina, a classe trabalhadora da América do Sul posicionou-se como um dos destacamentos fundamentais da luta de classes, enfrentando-se com os fenômenos de reconstrução dos estados burgueses latinoamericanos por governos que atendiam ao imperialismo reivindicando sua aliança com os movimentos sociais (o petismo, Evo Morales, Chávez, Kirchner). A escolha da esquerda classista e anticapitalista e um passo a mais, em um terreno da luta da classes favorável a nossos inimigos, da ruptura de setores de massas com estes governos burgueses e uma busca por uma saída independente. O inegável fato político das eleições da FIT, claramente anticapitalistas e fundadas na presença militante nas lutas, preocupa a mídia e a patronal argentinas, pois revela os espaços que se abrem aos trotskistas no interior da classe operária. A possibilidade de avançar em se converter em uma forte corrente na classe trabalhadora e na juventude é o maior desafio desses resultados, que apontam para as eleições em outubro.
É um exemplo internacional de como a esquerda revolucionária deve atuar no parlamento. A batalha eleitoral, muito importante neste momento, é uma tarefa a mais, dentro de uma estratégia de conjunto, porque “não somos um partido igual aos demais. Não ambicionamos apenas ter mais filiados, mais periódicos, mais dinheiro, mais deputados. Tudo isto falta, mas não é mais que um meio. Nosso objetivo é a total emancipação, material e espiritual, dos trabalhadores e dos explorados por meio da revolução socialista. Se não a fazemos nós, ninguém a preparará nem a dirigirá” (Trotsky, 1938). No sexto ano da crise mundial, o desafio de colocar de pé este partido, com um programa revolucionário e socialista, está na combinação do conjunto destas batalhas. O triunfo eleitoral coloca o desafio de potencializar estas tarefas preparatórias, para intervir com clareza ideológica, programática e estratégica e com suficiente força militante e impor uma saída revolucionária frente ás novas crises que se avizinham.
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