As eleições para o novo governo de Israel que aconteceram no dia 10 de fevereiro não tem até o momento um claro vencedor. A tarefa de formação de uma nova coalizão de governo pode recair tanto em Tzipi Livni do Kadima, atual ministra das relações exteriores que esteve na linha de frente do massacre ao povo palestino iniciado em dezembro, quanto em Benjamin Netanyahu do partido de direita Likud. Tzipi Livni detém 28 assentos dos 120 do Knesset (parlamento). Já o Likud levou 27 assentos, portanto contabilizando apenas uma cadeira a menos de diferença com o Kadima, restabelecendo seu papel no regime israelense após o debilitamento que havia sofrido com a ruptura com o Kadima em 2005. Já o partido de extrema-direita Yisrael Beitenu (Israel Nossa Casa) de Avigdor Lieberman, o “racista da moda” segundo o jornal espanhol El País, ganhou 15 assentos, quatro a mais do que já tinha emergindo como um grande favorecido.
Por fim, o Partido Trabalhista do Ministro de Defesa, Ehud Barack, elegeu apenas 13 deputados, perdendo 6 representantes. Os demais assentos parlamentares se dividem entre os 9 partidos que compõem o regime israelense, como o centro-esquerdista Meretz, e o Hadash, que levanta posições mais ã esquerda – sendo parte da Frente Democrática pela Paz, com partidos árabes e o Partido Comunista Israelense, além de partidos religiosos ortodoxos como o Shas, e outros da extrema direita. O primeiro ministro será o que obtiver uma maioria de 61 assentos. Sendo assim, a única certeza que emerge após os resultados eleitorais terem sido publicados é que há um giro ã direita claro em Israel, e que Avigdor Lieberman e seu partido racista e reacionário Yisrael Beitenu são hoje peças chave para a composição do novo governo, tenha ele a liderança que for. Por outro lado, o Partido Trabalhista sofreu uma clara derrota, apesar de ter apoiado e atuado pela reacionária ofensiva sobre Gaza buscando também restituir sua posição na política do país indo mais ã direita. Neste marco, todos os outros setores mais moderados, ou pacifistas foram golpeados, muito embora mesmo dentre estes o que primou no último período foi o giro ã direita, com o apoio até mesmo pacifista do Meretz ã ofensiva assassina sobre Gaza .
No plano político o resultado eleitoral ainda segue aberto. Tzipi Livni, que falhou na chance que teve em formar uma coalizão de governo no final do ano passado após o afastamento do primeiro-ministro do Kadima, Ehud Olmert por numerosos escândalos de corrupção, agora se proclama vencedora das eleições e já fez movimentos para propor um governo de coalizão com o Likud. Por ora, Benjamin Netanyahu, que também se auto-proclamou vencedor das eleições fez declarações negando-se a reconhecer a vitória de Livni e de atender ao seu chamado por uma coalizão. O que Benjamin Netanyahu almeja é se apoiar nos ultra-direitistas que conseguiram ampliar sua participação para tentar ganhar a maioria e impor-se como primeiro-ministro. Assim, nega a perspectiva de uma reprodução do sistema de revezamento entre o Kadima e o Likud, tal como havia se dado em 1984 quando o Likud, na época tendo ã frente Isaac Shamir, e o Partido Trabalhista, com Shimon Peres. Como ressalta o El País analisando as declarações de Livni “’O povo me elegeu. Sinto grande responsabilidade para exercer o poder que me outorgaram para agir de modo a unificar o país’, declarou a sucessora de Ehud Olmert ã frente do Kadima. Seu argumento, porém, não se sustenta. O fato de ser o grupo com mais assentos não confere, segundo as leis israelenses, o direito a encabeçar o governo. É o presidente quem, após as consultas com todos os líderes com representação parlamentar, que se celebrarão na próxima semana, que indicam aquele que consideram que tem mais probabilidade de exercer o papel de primeiro-ministro. Livni carece, a princípio destes apoios ”. Neste sentido, é provável que o próximo primeiro-ministro seja Benjamin Netanyahu, caso consiga a indicação dos demais direitistas.
Entretanto, a definição do futuro chefe de governo de Israel ainda está aberta, e é possível que assistamos a novas reviravoltas no cenário político israelense. Isso por que a enorme fragmentação e a disputa entre os setores da cúpula das forças políticas que tomou conta do cenário político israelense em tempos recentes, aprofundada após a derrota na ofensiva do Líbano em 2006 e agora parcialmente restabelecido ã custa do massacre da última ofensiva militar israelense sobre o povo palestino em Gaza, ainda não está resolvida.
Giro ã direita antecipa futuros enfrentamentos
O novo governo israelense foi eleito após o que se caracterizou como uma das piores ofensivas sobre o povo palestino, desde a Guerra dos Seis Dias em 1967. Para tentar recompor seu lugar no Oriente Médio após a derrota militar no Líbano em 2006, e aproveitar os últimos dias do governo Bush, a cúpula governamental israelense desferiu uma guerra sem limites contra o povo palestino, assassinando cerca de 1400 pessoas, dentre as quais muitas crianças e mulheres. As próprias agências internacionais do imperialismo, como a ONU, denunciaram bárbaros crimes de guerra perpetrados por Israel, como foi o uso de fósforo branco contra civis e outras armas químicas.
Entretanto, mesmo frente ã crueldade evidente do governo israelense, este contou com o apoio de 80% da população. Isso mostra uma direitização da sociedade israelense, que se aprofundou após os anos de governo dos neoconservadores norte-americanos, que por sua vez polarizou de conjunto a situação do Oriente Médio. Assim, Israel busca assentar posições saindo ã ofensiva contra os palestinos, e também mandar um “aviso” ao Irã e aos demais países cuja população apresenta alguma hostilidade em relação ã sua existência. Ao contrário do que pretendem muitos analistas, o estado sionista segue contando com o apoio – que apesar de menos aberto que o de Bush se mantém – dos EUA de Obama, que se materializou no silêncio cúmplice deste frente ao genocídio em Gaza.
Por sua vez, a autoridade ganha por Yisrael Beitenu e seu líder anti-árabe Lieberman é a maior mostra do processo de decadência do estado de Israel, em que grande parte da cúpula governamental ou expressa aspirações fascistitóides ou encontra-se imersa em numerosos escândalos de corrupção, ou ambos. Como oposição Avigdor Lieberman já havia defendido o uso de armas nucleares contra Gaza. Agora, o slogan racista da campanha do Yisrael Beitenu era “só Lieberman entende árabe”, enquanto exibia uma imagem beligerante e seus seguidores gritavam “morte aos árabes”. Um dos principais pontos de sua plataforma é um “teste de fidelidade” que concederia cidadania israelense apenas aos que estivessem dispostos a apoiar os ditames belicistas do governo israelense, como o serviço militar que dura de 2 a 4 anos. Esta política visa isolar ainda mais a minoria de 20% da população israelense que se colocou contra o massacre em Gaza. Isso explícita toda demagogia que pretendia apresentar o estado sionista como um “berço civilizador”, ou um “pedaço do Ocidente avançado” no Oriente Médio, e demonstra seu claro caráter colonialista. Assim, o cenário que se abre após as eleições israelenses é de um recrudescimento das políticas duras em relação aos palestinos, em detrimento das negociações. Portanto, devemos nos preparar para novos ataques sobre o povo palestino no próximo período.
Soma-se a isso uma deterioração econômica e social que se aprofunda. “Este é um país cujo nível de vida caiu em relação aos países ocidentais e onde a taxa de pobreza e desigualdade cresce constantemente desde 1970. Um país com um sistema universitário que apesar de ser um dos melhores se acha hoje ã beira do abismo(...)”, segundo Dan Bem-David, professor da Universidade de Tel Aviv. Portanto, frente ã crise econômica que golpeia duramente o estado de Israel, imensamente dependente da indústria bélica e da ajuda financeira dos EUA, que por sua vez encontram-se concentrados nos gastos para reduzir os efeitos internos de sua crise econômica, a perspectiva que se abre é de um aprofundamento da política de exploração brutal sobre os árabes israelenses, em primeiro lugar, e dos trabalhadores em geral, aumentando as imensas disparidades sociais do estado de Israel. Isso reforça ainda mais que somente uma saída imposta pelos trabalhadores, explorados e oprimidos do Oriente Médio, e em primeiro lugar do povo palestino, imposta de maneira independente de suas burguesias submissas pode apontar o caminho para acabar com as misérias dos povos oprimidos da região.
|