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Um debate sobre o processo de unificação da Conlutas com parte da Intersindical
por : Val Lisboa

23 Apr 2010 | Apresentamos uma contribuição ao debate necessário em torno do caráter, estratégia e prática política que terá esta nova central e a serviço do que estarão estes dois congressos.

Apresentamos uma contribuição ao debate necessário em torno do caráter, estratégia e prática política que terá esta nova central e a serviço do que estarão estes dois congressos. Antes das questões organizativas iniciamos esta discussão pelo debate político que é o fundamental para poder avançar no classismo e em um programa de independência de classes que arme a vanguarda para apresentar uma alternativa para a classe trabalhadora brasileira a partir da luta de classes.

Mau começo: as teses falam de quase tudo mas esquecem de começar com um balanço honesto do que já foi feito

Todas as teses partem do propósito comum de fundar uma nova central sindical fundindo a Conlutas com a Intersindical, a Pastoral Operária de São Paulo, o MTL e o MAS. Esta central seria, no futuro, classista, democrática, socialista e internacionalista. Contudo, as teses deixam de tratar de uma questão funda-mental para quem, de fato, deseja construir uma organização de luta capaz de enfrentar os desafios impostos pela exploração capitalista, seus governantes e o Estado burguês. Deixam de lado pura e simplesmente um balanço de como essas correntes atuaram principalmente a partir de janeiro de 2009 quando, no Fórum Social Mundial, no Pará, decidiram “unificar-se para fundar uma nova central”. Como se pode começar algo novo sem ajustar as contas com o que já foi feito?

Por certo, na opinião dessas três correntes principais no processo de unificação, os congressos podem ser feitos apenas para homologar a fusão e fundação da nova central, pois todas as demais questões – programa e estratégia – podem ser “resolvidas” tão somente com a repetição de “princípios” como “defesa do socialismo”, “classismo”, “democracia operária”, “internacionalismo”. Para dar consistência a esses princípios fundamentais seria obrigatório debater com todas as letras, e livremente, um balanço do que fizeram essas correntes diante das necessidades reais do último período.

Por exemplo, desde o estouro da crise capitalista mundial, em setembro de 2008, os trabalhadores foram atacados com demissões, cortes de direitos e salários, extensão da jornada de trabalho com horas extras, mais precarização do trabalho e rotatividade no emprego. Os sindicalistas vendidos ã patronal e ao governo, da CUT, Força Sindical, CTB e Cia., responderam entregando o que os patrões queriam, aceitando as demissões e pedindo ao governo Lula dinheiro para as empresas “investirem”. Já escrevemos repetidas vezes sob a luta não dada em diversas bases da Conlutas que sofreram importantes ataques e onde a desculpa era que os trabalhadores não estavam dispostos a lutar, estavam desmoralizados.A Intersindical e a Pastoral Operária também não estiveram ã altura para contribuir com uma prática e um programa sindical combativo, classista e anticapitalista, nem sequer para garantir a unidade de todos os seus sindicatos com os trabalhadores da Embraer e as organizações da Conlutas. Todos estavam “trabalhando para a unificação” mas na luta real cada um estava cuidando dos “seus” problemas”.

A luta contra as demissões e os ataques patronais poderia até ser derrotada, pois não depende unicamente da nossa disposição, programa e combatividade, porém os resultados políticos, programáticos e organizativos alcançados por uma efetiva unidade de todos os setores que se dizem combativos, em torno de um programa comum e concreto para que “os capitalistas paguem pela crise” e não os trabalhadores, teriam sido muito importantes para preparar os próximos combates, e fortaleceriam muito o processo de consolidação de uma nova central sindical classista, combativa e anticapitalista. Não foi assim, e agora, nos congressos, só nos resta extrair a lição de que as derrotas são piores quando são fruto de lutas não efetivadas ou já consideradas incapazes de alcançar vitórias.

Todos falam em classismo e fim do corporativismo mas a prática política e o programa não são coerentes

Nas três teses, esses princípios são repetidos ã exaustão, como se assim pudessem se tornar reais. Primeiramente, seria o caso de perguntar o que se compreende por “classismo”. Pelas teses majoritárias trata-se primeiramente de “vincular as reivindicações imediatas e suas lutas econômicas à luta política geral contra o capitalismo, ã denúncia permanente deste sistema de exploração”, como afirma a tese do PSTU. Ou, então, “transformar cada luta corporativa (...) em uma luta de classe contra o capitalismo”, com “centralidade na ação direta”. Alguém pode estar contra essas formulações gerais? Não!

Contudo, para ser classista uma organização precisa antes de tudo defender no programa e na prática a unidade de toda a classe trabalhadora, fazendo com que toda luta seja efetiva para conquistar essa unidade, não aceitando ou naturalizando a divisão dos trabalhadores entre terceirizados, temporários e efetivos. Por mais que todos digam que são classistas, cabe perguntar por que em seus sindicatos e em nas lutas que dirigem os planos de luta nunca colocam a centralidade de unificar em todo momento os trabalhadores efetivos (representados por esses sindicatos) com temporários e terceirizados, demonstrando na prática que “trabalhador é trabalhador, não importa seu crachá”. Qual classismo pode haver quando os terceirizados sequer podem se filiar e ser representados pelos sindicatos dos efetivos, ou participar com todos os direitos nas comissões de fábrica, conselhos de representantes ou outros organismos sindicais? O que impede aos sindicatos da Conlutas (e da Intersindical) aprovarem em seus estatutos esses direitos aos terceirizados, mostrando, na prática, que não aceitam a intromissão do Estado e das suas leis reacionárias na organização de classe dos trabalhadores?

Outro tema recorrente nas teses é sobre o fim do corporativismo, isto é, um sindicalismo que defenda os interesses de toda a classe trabalhadora e dos pobres urbanos e rurais. Porém, o que temos visto não coaduna com esses discursos. As lutas e greves continuam isoladas por categorias, deixadas ã própria sorte. Os sindicatos da Conlutas, da Intersindical ou os setores da Pastoral Operária não têm servido para dar exemplos para o fim do corporativismo, ao menos fosse apenas entre os que estão no processo de unificação. Por exemplo, desenvolvendo uma campanha de solidariedade ã importante greve dos funcionários da USP do ano passado ou, nas últimas semanas, em apoio ativo ã greve dos professores de São Paulo.

Como se vê, na prática o combate ao corporativismo ainda não se deu sequer entre os sindicatos da Conlutas e da Intersindical. Muito menos em relação ao povo pobre, que na maioria das vezes não conta com qualquer organização combativa para lutar por seus direitos e contra as catástrofes capitalistas. Durante as inundações na Zona Leste e diante do descaso do governo Kassab e Serra, os moradores (a maioria trabalhadores) ficaram sem qualquer apoio dos sindicatos. Nas últimas semanas vivemos outras catástrofes, principalmente a do Rio de Janeiro. Outra vez não vimos da parte da direção da Conlutas e da Intersindical qualquer plano concreto convocando seus sindicatos e organizações a preparar a solidariedade ao povo fluminense em torno de um programa classista que enfrente os interesses dos capitalistas.

Outra expressão da incoerência entre a declaração de classismo, a superação do corporativismo e a prática concreta é que nenhuma tese sequer menciona o processo eleitoral de outubro deste ano. Todas as principais correntes estarão envolvidas nas candidaturas de Zé Maria ou de Plínio de Arruda Sampaio mas a discussão na vanguarda dos trabalhadores reunidas no congresso não poderá se posicionar a respeito. Deste modo, defendemos que o Conclat se pronuncie por uma candidatura de independência de classe, que para nós seria a de Zé Maria (PSTU), e que esta candidatura defenda os pontos programáticos e a efetiva coordenação das lutas dos trabalhadores que for aprovada neste congresso, fazendo avançar a luta dos setores combativos para um verdadeiro classismo, expressando politicamente a organização e as reivindicações da classe trabalhadora sem qualquer conciliação e aliança com a burguesia, seus partidos e o Estado burguês. Diante desse balanço negativo, resta a todos os ativistas e dirigentes da Conlutas e da Intersindical debater pra valer os caminhos e as medidas para verdadeiramente atuarmos de maneira classista e anticorporativa, fazendo com as palavras e os princípios passem a guiar nossa ação prática de modo a mostrar as diferenças que nos dividem dos sindicalistas governistas e patronais, dando exemplos de como devem atuar os sindicatos combativos no sentido de convencer ao menos, por ora, os trabalhadores efetivos desses sindicatos para se sensibilizarem e mobilizarem em defesa das reivindicações dos temporários e terceirizados e do povo pobre, fazendo com que as palavras “classismo” e “anticorporativismo” sejam compreendidas e assumidas como bases sólidas para preparar uma nova central sindical definitivamente classista, combativa e anticapitalista.

 

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