A corrente encabeçada pelo PSTU do Brasil publicou a declaração “Chamamos a rodear de solidariedade os trabalhadores e o povo cubano” (3/04), fundamentada em sua caracterização de que Cuba faz tempo já é plenamente capitalista, onde os trabalhadores sofreriam uma exploração “qualitativamente superior à quela imposta na maioria dos países da América Latina e do mundo” e que seu governo seria uma ditadura comparável ás “de Mubarak no Egito, Pinochet no Chile ou Videla na Argentina”. Para a LIT, “A restauração do capitalismo na Ilha, combinada com a total falta de democracia, teve como resultado a existência de uma ditadura muito similar ás piores e mais sanguinárias ditaduras do mundo. Na realidade, em alguns aspectos é uma ditadura muito pior que aquelas.”
Já discutimos em outros artigos contra a equivocada definição de Cuba como país plenamente capitalista, defendendo a caracterização marxista de que é um Estado operário deformado em processo de decomposição, ou seja, o processo de retorno ao capitalismo, de conversão da casta burocrática em uma nova burguesia e de re-colonização pelo imperialismo ainda não terminou, por isso segue colocada a defesa das conquistas estruturais básicas da revolução, fundadas na nacionalização dos meios de produção e na liquidação da burguesia como classe, que apesar de degradas e minadas dia-a-dia pela burocracia em seu próprio benefício, ainda sobrevivem.
A alternativa de ferro em Cuba é que frente aos planos de restauração capitalista, seja a “via cubana” gradualista da burocracia, seja a via de “mudança de regime” e “abertura econômica e política” que o imperialismo preferiria; a única alternativa estratégica é o programa da revolução política, no sentido trotskista do termo, encaminhada até a queda revolucionária da burocracia e o estabelecimento de um verdadeiro governo dos trabalhadores.
A LIT rompeu com o programa trotskista de revolução política. Como decidiu dar como fato consumado há anos o retorno ã ordem burguesa, o que é um processo inacabado, não pode propor um programa correto para enfrentar o programa real da burocracia governante, expresso na plataforma recém aprovada pelo Congresso do PCC – que aponta não só a ajustes e demissões, como os que já vêm implementando, senão a deslocar a economia de transição para avançar cada vez mais nas concessões ao mercado e ao capital estrangeiro. Dá essa batalha por perdida, no passado, em vez de a considerar como uma tarefa difícil, mas presente, atual.
Mais ainda, os erros grosseiros da LIT estão ligados a uma política democratizante com desastrosas conseqüências. Sua declaração parte de levantar uma política para uma possibilidade futura: “De uma forma ou de outra, mais cedo ou mais tarde, os trabalhadores cubanos vão se rebelar contra essa situação, e quando isso acontecer, uma nova e grande ameaça vai se colocar sobre suas cabeças: a repressão”, mas não propõe nenhum programa de classe nem perspectiva própria pela qual os trabalhadores cubanos possam chegar ao triunfo. Definindo o regime como uma ditadura capitalista, se preparam para um processo de “revolução democrática”, tomando como exemplo tacitamente os primeiros momentos da “primavera árabe” de levantamentos populares contra ditaduras burguesas. Todo o eixo está colocado em solidariedade internacional com o povo cubano que está “suportando uma brutal ditadura, e que está sendo ameaçado de ser massacrado quando começar a se levantar contra os seus exploradores e opressores.”
Adaptação ã democracia burguesa
Entre os múltiplos problemas e confusões que a LIT consegue acumular em poucas linhas, assinalamos dois:
Em primeiro lugar, como se poderia impedir um massacre só apelando ã solidariedade internacional? Não coincidimos com sua caracterização de que estamos frente a um regime fascista ou semi-fascista (pelo contrário sustentamos que em Cuba há um regime burocrático apoiado nas forças armadas e em um partido único stalinista), mas ainda concedendo por um momento que assim fosse, a política que propõe é completamente impotente para fazer-lhe frente. O único método eficaz seria o da classe operária com suas formas de luta. Chamar os operários cubanos a organizar-se nas fábricas, armando os comitês de autodefesa desde os sindicatos e organizações nos bairros, desenvolver a auto-organização democrática das massas (conselhos, soviets) para derrotar a guerra civil lançada pela casta dirigente e derrotá-la mediante uma insurreição conscientemente preparada, para impor um governo das organizações operárias e de massas que encabecem a luta. Mas a LIT não diz nada disso.
Em segundo lugar, achamos que sua linha de “solidariedade” obedece uma lógica de “revolução democrática” para substituir o regime político de “partido único” por uma “democracia”... burguesa, como uma fase necessária ou, ao menos, inevitável do processo. Não é necessário clarificar que os marxistas revolucionário distinguimos as diferenças que existem entre ditadura e democracia em um Estado burguês e que defendemos a conquista de liberdades democráticas para a luta e organização da classe operária e o povo. Mas nem por isso separamos a luta pelas liberdades democráticas da luta pela revolução.
Quando a LIT confunde como se fossem o mesmo o regime burocrático de “partido único” que oprime o povo cubano e as ditaduras pró-imperialistas como as de Mubarak ou Videla que afogaram em sangue toda resistência para proteger a propriedade privada e os lucros capitalistas, pretende fazer plausível que seria melhor conseguir uma democracia burguesa, já que ao menos existiriam mais liberdades, legalidade para os partidos, sindicatos etc. Na verdade, a LIT já escreveu: “Qual é, portanto, a grande tarefa proposta para a classe operária e o povo cubanos? A mesma que, no seu momento, esteve proposta nos outros países da região: derrubar essa ditadura para conquistar as mais amplas liberdades democráticas e para avançar em direção a uma nova revolução socialista” (www.litci.org, Martín Hernández, Revolução e contra-revolução em Cuba, 21/12/2010).
E é por isso que vêm exigindo amplas liberdades democráticas para todas as correntes opositoras, inclusive as burguesas, o que os coloca no pouco invejável lugar de estar objetivamente reivindicando liberdade de ação política também para os representantes dos gusanos e Miami (a burguesia exilada), os grupos ligados ã Igreja, entre outros agrupamentos da direita pró-imperialista, política que rompe com os mais elementares princípios de classe. Pelo contrário, os trotskistas chamamos a lutar por liberdade políticas e de organização para as massas contra o regime dos Castro, inclusive pelo direito ã greve, a criar sindicatos e ã plena liberdade de ação e legalidade para os partidos políticos que defendem as conquistas da revolução.
A LIT a beira do barranco
Lamentavelmente a lógica política da LIT a está levando por um perigoso caminho, localizando-a como ala esquerda do plano imperialista de contra-revolução democrática.
Podemos recordar que frente ao golpe em Honduras, um país semi-colonial oprimido pelo imperialismo norte-americano, levantou “a exigência de ruptura das relações com o governo de fato dos governos de todos os países que ainda não o fizeram. E, especialmente a exigência de boicote econômico, principalmente dos Estados Unidos (...)”. Ao considerar o regime imperante em Cuba como similar ao de um Mubarak ou um Videla, observando só a similitude nos traços repressivos, sem ter em conta a diferente base social, ou seja, o caráter de classe do Estado, porque não dar um passo mais e reivindicar boicote comercial e ruptura de relações diplomáticos com o regime cubano, como fizeram em Honduras?
Uma posição assim seria cair na mais vergonhosa bancarrota política. Acaso não é essa em essência a política que estão aplicando, até onde podem, os governos norte-americanos: bloqueio e isolamento, para dobrar Cuba? Os militantes honestos da LIT deveriam refletir sobre esses problemas de princípios e reclamar a sua direção uma urgente retificação em suas posições sobre Cuba.
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