A crise de dívida que golpeia Grécia, Portugal, Irlanda, Itália e Espanha, já não é só uma crise de dívida. A profunda crise política aberta como subproduto dos planos de ajuste na Espanha, em Portugal e na Grécia torna impensável que os desprestigiados governos possam redobrar os planos de ajuste tal como exigem a UE e o FMI. As propostas de mudanças conservadoras, como o Partido Popular da Espanha ou o social-democrata (PDS) ou demo-cristão (CDS-PP) de Portugal, podem chegar ao governo mais prestigiadas mas só terão a oferecer mais da mesma medicina que pôs em xeque os seus antecessores.
A crise de dívida que golpeia Grécia, Portugal, Irlanda, Itália e Espanha, já não é só uma crise de dívida. A profunda crise política aberta como subproduto dos planos de ajuste na Espanha, em Portugal e na Grécia torna impensável que os desprestigiados governos possam redobrar os planos de ajuste tal como exigem a UE e o FMI. As propostas de mudanças conservadoras, como o Partido Popular da Espanha ou o social-democrata (PDS) ou demo-cristão (CDS-PP) de Portugal, podem chegar ao governo mais prestigiadas mas só terão a oferecer mais da mesma medicina que pôs em xeque os seus antecessores. Na Itália, o debilitado governo direitista de Berlusconi, que acaba que sofrer uma dura derrota nas eleições administrativas nas quais perdeu Milào, Turin e Bolonha, prepara-se para aplicar um duríssimo plano de ajuste (logo após receber uma advertência de Standard & Poors com respeito ã qualificação de sua dívida) em um país que registra o segundo recorde de dívida pública depois da Grécia; que cresceu apenas 0,2% durante a última década, e que está sofrendo fortes demissões por conta do fechamento e da redução das atividades de vários estaleiros estatais. Mas a maior novidade reside em que o panorama econômico-político dos denominados PIIGS, combinado com a instabilidade geral que reina na Europa, se coloca como uma ameaça frente ás “duas velocidades” econômicas que caracterizaram a Eurozona durante o último período.
O euro, Grécia, Portugal e Espanha
No mundo das finanças e da economia, ninguém duvida que a Grécia esteja próxima da cessação de seus pagamentos. O novo ajuste exigido pela UE e pelo FMI (que ficou em suspenso logo após ser rechaçado pela oposição conservadora no parlamento grego) para outorgar a quinta parte do “resgate” aprofundaria esta situação, adiando, no melhor dos casos, a dicotomia da reestruturação da dívida ou o default. Que a dívida grega terá de ser reestruturada tanto nos prazos de pagamento quanto nos juros e no montante total da dívida é um segredo. O grande problema é que dos mais de 300 bilhões de euros endividados pela Grécia, a metade está nas mãos dos bancos e instituições financeiras europeus. Não há dúvida de que as diferenças entre o Eurogrupo , a União Européia e Angela Merkel por um lado, que aceitaram publicamente a necessidade de uma reprogramação nos prazos e uma redução das taxas de juros, e o Banco Central Europeu (que possui 60 bilhões de euros em títulos gregos) e a França por outro, que ainda colocam que as consequências de uma reestruturação seriam “catastróficos”, a todos eles se permite ganhar “tempo”. Nesse valioso “tempo”, a Grécia é obrigada a privatizar suas ações da empresa OTE da qual possui 20% do capital e cujo acionista principal é a alemã Deutsche Telekom, assim como sua participação pública no Banco Postal que ascende a 34%. Em regra geral, neste tipo de operações, o vendedor se vê obrigado a entregar as ações que possui abaixo de seu valor, pelo que não seria rebuscado pensar que neste tempo os bancos alemães poderiam tirar boa vantagem e inclusive conseguindo algum tipo de capitalização preventiva frente a uma eventual quitação. Nesta mesma linha e por pedido especial do parlamento finlandês, o “resgate” concedido a Portugal agrega aos já clássicos planos anteriores a exigência de levar a cabo privatizações e reforçar o capital dos bancos, e o compromisso das autoridades de alentar os bancos privados a manter sua exposição na dívida do país. Estes planos, cada vez mais brutais, que implicam como no caso dos estaleiros navais de Itália milhares de demissões, vão acompanhados de exigências de maiores reduções dos déficits fiscais em economias como a de Portugal, que experimentou uma contração de seu PIB de 0,7% no primeiro trimestre do ano ou como a da Grécia (na qual se convocou uma nova greve geral para o próximo dia 4 de junho), que já entra em seu terceiro ano de recessão. Todas estas medidas não somente aprofundariam a contração da economia, reaquecendo o problema da dívida, senão que serão de muito difícil aplicação num contexto de graves crises políticas. Tanto um default na Grécia como alguma medida de reestruturação da dívida provocariam um efeito dominó que não tardaria em comprometer a Espanha (cujos bancos privados são credores de um terço da dívida de Portugal), um dos elos mais críticos da zona tanto por sua situação política quanto por sua significação econômica para o conjunto da Eurozona e para a estabilidade do euro.
Em direção ao fim das “duas velocidades”?
Durante o primeiro trimestre do ano a chamada “locomotiva alemã” obteve um crescimento de 1,5% do PIB, acompanhada da França, Áustria, Bélgica e Eslováquia, que cresceram 1% e Holanda, que cresceu 0,9%. Por sua vez, os países bálticos, Lituânia e Estônia, registraram altas na atividade de 3,5% e de 2,1%, respectivamente. O crescimento destes países contrasta com a debilidade das economias italiana, que cresceu somente 0,1%, da Espanha, que cresceu 0,3%, e de Portugal, cuja economia se contraiu 0,7% (dados extraídos de El Pais, 14/5). Por sua vez, a Grécia está transitando o terceiro ano de sua crise econômica. Mas trata-se de economias profundamente dependentes entre si. As “duas velocidades” dificilmente podem sustentar-se no marco das duras crises políticas abertas, que não somente afetam as economias mais débeis, senão que repercutem também nos mais fortes, como acaba de ser o caso do partido da chanceler alemã Angela Merkel, a União Democrata Cristã, que sofreu um duro revés na cidade-estado de Bremen, ficando pela primeira vez como terceira força num land, atrás dos social-democratas e dos verdes. Esta combinação de crise político-econômica coloca o risco real de que as crises de dívida se estendam da periferia ao centro.
Um exemplo disso é a Bélgica, ã qual Fitch ameaçou rebaixar a qualificação da dívida. Inclusive fora da zona, a qualificadora Moody’s rebaixará a nota de 14 instituições bancárias na Grã-Bretanha. A convulsiva situação política agrega novos elementos ã crítica situação econômica e aproxima mais a possibilidade de que não possa conter-se como até agora as crises de dívida para resguardar o euro. Um default em cadeia ou inclusive uma reestruturação afetaria com segurança a Espanha, vítima de um desemprego de 20%, um crescimento de apenas 0,3%, e uma grave crise política que poderia inclusive por si mesma acelerar os ritmos. Os bancos espanhóis estão entre os maiores devedores dos bancos alemães e franceses. A crise da Espanha não poderia conter-se com o atual fundo de estabilização do euro e tornaria mais provável uma quebra dos bancos dos países mais fortes da zona, com o qual as duas velocidades se converteriam numa só.
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