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A queda de Palocci acaba com a lua de mel do governo Dilma e expõe a primeira crise do governo
por : Flávia Vale

09 Jun 2011 | Os três primeiros meses do governo Dilma foram coroados por sua primeira grande crise política. A queda de Palocci, ministro da casa civil, o “homem forte” do governo, expressa uma crise mais estrutural de um governo marcado por interesses tão heterogêneos em sua base.

Os três primeiros meses do governo Dilma foram coroados por sua primeira grande crise política. A queda de Palocci, ministro da casa civil, o “homem forte” do governo, expressa uma crise mais estrutural de um governo marcado por interesses tão heterogêneos em sua base. O governo sai com outra cara desta crise, não pela nova figura que irá ocupar o cargo de Palocci, a ministra Gleisi Hoffmann, do PT do Paraná, mas como um governo mais enfraquecido com fraturas expostas em sua própria base.

A crise de Palocci inicialmente explodiu após denúncia de que seus bens haviam multiplicado em seis vezes num período de quatro anos, momento que o ministro prestava “consultoria” (lobby, tráfico de influências) para grandes empresários e período marcado pela preparação da disputa eleitoral para a presidência. Palocci já esteve envolvido no escândalo de corrupção no governo Lula em 2006 o que foi um dos fatores para Lula retroceder de tentar lançá-lo como candidato ã presidência antes da figura e Dilma.

A queda de Palocci se deu pela debilidade estrutural do atual governo em não conseguir hegemonizar uma base de aliados com interesses tão distintos, como um custo pago pela extensão dessa base que reúne dezenas de partidos, de ex-stalinistas a evangélicos e ruralistas. Antes da queda de Palocci o governo já estava sangrando enquanto o governo não decidia defender ou defenestrar. A votação do Código Florestal, onde Dilma tinha somente algumas diferenças (já que no essencial tinha acordo com o código que ajuda a desmatar e fortalece os latifúndios) permitiu abrir uma crise com o PMDB que apoiou o projeto de Aldo Rebelo, do PCdoB, também da base governista e que esteve de mãos dadas na defesa da votação do projeto com a pecuarista Kátia Abreu, do PSD (partido de Kassab, ruptura do PSDB, do estado de Tocantins). A segunda crise se deu como veto de Dilma ao kit anti-homofobia, programa que seria aplicado nas escolas como medida de combate ã homofobia, que abriu mais uma crise com o ministro da educação Fernando Haddad. Por mais tímido que fosse o projeto do kit, a bancada evangélica e a Igreja Católica saíram em combate contra a implementação do kit e Dilma teve que recuar sob ameaças de novos setores aumentarem as denúncias contra Palocci.

Frente a essa crise com uma das principais figuras do governo a procuradoria geral da república garantiu que Palocci fosse inocentado das acusações e esta foi a cartada final de Palocci. A Procuradoria Geral atuou como “advogado” de Palocci, dando um “parecer” de inocência sem qualquer investigação e apuração. Palocci precisava dessa garantia “legal” para aceitar a sua demissão, podendo, mais uma vez, sair do governo sem correr riscos judiciais. E esse foi o feito: Palocci usou as palavras da Procuradoria para dizer que ele optava em deixar o cargo para não atrapalhar a governabilidade de Dilma e para “preservas o diálogo” do governo. Antes da queda de Palocci, Lula e Dilma avaliariam quais as contradições dele continuar no governo. Porém nem sequer a bancada petista saiu em defesa do ministro após o pronunciamento da Procuradoria e setores do PMDB estavam prontos para integrar uma comissão com o pedido de depoimento e esclarecimentos dos vultosos aumentos da renda de Palocci na Câmara dos Deputados. Enquanto isso petistas “progressistas” como Paulo Henrique Amorim, sindicalistas vendidos mas base importante do governo como Paulinho da Força (PDT-SP), e diversos governadores e senadores do PT exigiam a cabeça de Palocci junto ã oposição.

Por trás desta movimentação quem mais saiu beneficiado foi o PMDB, partido que foi colocado em segundo plano nas divisões de cargos no período de transição do governo. Com o desenvolver da crise de Palocci, após a votação do código florestal, Michel Temer, presidente do partido, vice de Dilma, já havia deixado claro que ele, o cacique do maior partido de aluguel do país, não estava mais brincando com Dilma e que seu partido deveria ter outra localização no governo. Assim que antes de sair em defesa de Palocci, Temer disse em entrevista a jornalistas, questionado se ainda era da base governista, que ele não era da base do governo mas que seu partido era “o”governo.

Dentro do PT, na disputa fracional em relação a Palocci, saíram fortalecidos os setores que nunca “engoliram” o papel preponderante de Palocci (Zé Dirceu, principalmente). Desde o mensalào Lula passou a contar com Palocci como seu “braço direito”, e ele sempre foi pensado como o sucessor de Lula e até estava na lista de Lula para candidatar-se antes de Dilma (plano que veio abaixo com as primeiras denúncias contra Palocci em 2006). Com a eleição de Dilma, Palocci passou a ser a “sombra” de Lula no governo, tendo criado problemas desde a comissão de transição – antes da posse – quando foi colocado como “coordenador” dessa comissão que gerou uma série de conflitos com o PMDB que foi colocado em segundo plano no arranjo dos cargos governamentais. Depois da grita do PMDB Lula, Dilma e Cia. tiveram que recuar e aceitar compartilhar a transição com Temer. Desde esse momento as rusgas viraram ressentimentos, e o PMDB de Temer não deixou de aproveitar essa nova situação; porém as frações petistas rifaram Palocci, deixando-o sozinho.

A queda de Palocci atinge diretamente também os planos de Lula de comandar as eleições municipais de 2012 pois um dos candidatos que ele apoiaria, Fernando Haddad, está mal visto pelos problemas no ministério da Educação (com as crises no Enem, Sisu e agora mais recente com o kit anti-homofobia) e Lula não pode mais contar com seu braço direito Palocci. Para as eleições municipais em São Paulo, fundamental para o projeto 2014 do PT, só sobraram os grupos ligados a Marta Suplicy e os ex-mensaleiros.

No maior “fogo amigo” que passou o governo, este teve que sangrar e permitir uma mínima homogeneidade na oposição, que até então não via nenhuma via para amenizar a crise que entraram após três eleições por fora da presidência assim como não poderem contar com uma figura de peso nacional para hegemonizar um perfil da oposição e preparar os rumos de seus partidos para as próximas eleições presidenciais.

O governo Dilma, débil, sai mais enfraquecido uma vez que estará cada vez mais dependente do PMDB e deixou notório que a base governista pode chantagear que conseguirá seus interesses. Nem precisou da oposição para mostrar suas debilidades estratégicas. Todo esse cenário de crises estruturais do governo Dilma podem se agravar ainda mais conforme a dinâmica da crise econômica internacional e o quanto o governo Dilma conseguirá manter sua economia minimamente estável, elemento fundamental para a estabilidade maior do regime.

A ministra que passa a ocupar o cargo de Palocci, Gleisi Hoffmann, passa a atender setores do próprio PT descontentes com a hegemonia do PT paulista no governo porém uma figura sem o peso institucional de Palocci. A ministra em seu primeiro pronunciamento deixou claro que seu compromisso com a Casa Civil é o compromisso como gestora. Assim que muitas figuras da oposição como Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB, deu “boas vindas” ã atual ministra porém já anunciando a debilidade que se mantêm o atual governo, uma vez que Gleisi não tem a “entrada” política que tem Palocci.

Esta foi a mesma argumentação política do deputado Chico Alencar do PSOL que disse “rei deposto rainha posta. Primeiro ministro saindo e ela não é uma primeira ministra que assume”. Porém o PSOL dá cada vez mais mostras de como é partido que faz parte do regime, distante de qualquer interesse genuíno dos trabalhadores e da juventude. Chico Alencar, líder da bancada do PSOL exigiu “clareza nos projetos, transparência e sobretudo espírito republicano, que foi o que falou ao ministro Palocci”. E continuou: “Palocci misturou demais o negócio privado com o interesse público. Se você perde essa fronteira a contradição vai se avolumando. Nenhuma Casa Civil agüenta tanta sombra assim. Falta fotossíntese!” O PSOL prefere tratar a atual crise política como uma parte ruim do governo que caiu e não um governo que tem como uma de suas bases o trabalho semi-escravo e o lucro gigantesco ás grandes empresas. Ele aponta as debilidades da nova ministra sem em nenhum momento dizer que Palocci foi apenas a ponta de um iceberg que esconde sob si a podridão da democracia burguesa. O PSOL continua procurando uma “luz” para a fotossíntese para salvar o regime democrático burguês de suas crises intrínsecas.

Ao contrário das argumentações de Chico Alencar, porém, esquemas de tráfico de influência de Palocci mostram as frágeis bases de governo de Dilma e a podridão da democracia dos ricos. Logo da denúncia do tráfico de influência de Palocci houveram denúncias de grandes esquemas de corrupção na cidade de Campinas, no interior do Estado de São Paulo, região onde se forjou politicamente a figura de Palocci. As empresas envolvidas nestas denúncias, como a Camargo Correia, WTorre, Odebrecht, entre outras, estão envolvidas em obras em todo o país, em governos petistas e tucanos e há décadas estão ligadas ao Estado brasileiro, desde ao menos as grandes obras da ditadura militar. São as caras petistas atuais de um esquema supra-partidário desta corrupta democracia burguesa brasileira que garante os negócios de magnatas contra os interesses do povo. Distintas frações da burguesia e distintos grupos dos principais partidos estão envolvidos.
Esta situação, nada inédita no país, mas que mostra crises mais estruturais do governo Dilma saindo ã tona, mostra mais uma vez como somente a classe trabalhadora desde seus sindicatos, locais de trabalho que pode dar uma saída progressista apurando todos as fraudes e confiscando os bens destes ladrões do dinheiro do povo. É preciso exigir das grandes centrais como a CUT, CTB, Força Sindical que larguem seu silêncio cúmplice e organizem um plano de luta. Os sindicatos anti-governistas e principalmente a CSP-Conlutas precisam liderar este processo.

9 de junio de 2011

 

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