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Entre a brutal repressão de Assad e a ingerência imperialista
por : Claudia Cinatti

22 Mar 2012 | Próximo a se completar um ano do início das mobilizações contra o regime ditatorial de Bashar al-Assad, o exército sírio tem lançado uma brutal ofensiva sobre as cidades opositoras...

Por Claudia Cinatti, PTS


Próximo a se completar um ano do início das mobilizações contra o regime ditatorial de Bashar al-Assad, o exército sírio tem lançado uma brutal ofensiva sobre as cidades opositoras para restabelecer a ordem a sangue e fogo. Enquanto isso as potências imperialistas e as reacionárias monarquias árabes seguem buscando as vias para manipular a situação em favor de seus interesses. A direção pró-imperialista aglutinada no Conselho Nacional Sírio, ainda que dividida e em crise, segue atuando como agente interno desta estratégia reacionária. As massas trabalhadoras e populares sírias não somente sofrem o ataque contra-revolucionária de Al-Assad senão como também a ameaça de intervenção imperialista.

Escalada repressiva

O regime de al-Assad tem lançado uma brutal escalada repressiva para recompor seu domínio e tentar pôr fim ao questionamento de importantes setores da população que com distinta intensidade, vem se manifestando há um ano em várias cidades, sobre tudo de maioria sunita, ainda que sem alcançar os principais centros urbanos do país como as cidades de Damasco e Alepo. Ao não enfrentar um levantamento nacional, a estratégia militar é desarticular um dos focos do conflito.

Desde 01 de março, quando tropas leais ao presidente Bashar al-Assad ingressaram na cidade de Homs depois de manterem um cerco militar de pelo menos um mês, o regime decidiu redobrar sua ofensiva para retomar o controle das cidades que em distintos momentos deste processo foram epicentro das mobilizações contra o regime autoritário do partido Baath e desde onde se haviam concentrado as forças irregulares do Exército Livre Sírio, formado em grande medida por desertores de baixo escalào do exército oficial. A recuperação por parte do regime das cidades de Homs e de Idlib (na fronteira com a Turquia) foi seguida por castigos coletivos, assassinatos de civis e atos de barbárie que o próprio regime reconhece que existiram, ainda que os atribua a "terrorristas" ligados a Al Qaeda. Milhares de pessoas tentam fugir desses ataques brutais e buscam refúgio no Libano ou na Turquia. Inclusive existe denúncia de que o exército colocou minas terrestres ao longo da fronteira com esses países.

Segundo informes dos meios de imprensa, tanto oficiais como opositoras, as tropas estariam se dirigindo para Deraa, uma região empobrecida do sul do país, onde um ano atrás a tortura de um adolescente por escrever palavras de ordem contra o regime inflamou os protestos.

Essa política de Assad de esmagar com a força qualquer suspeita de rebelião mostra que ainda conserva o controle sobre o grosso das forças armadas e o apoio da elite governante alauíta e de grande parte da burguesia comercial, em sua maioria de origem sunita. Sobre essa base interna, a qual se somam outras minorias religiosas, como os cristãos e drusos que temem que se desencadeie uma guerra civil onde estariam em desvantagem frente a maioria sunita que compõe o país, Assad pretende manter o regime por meio de uma mistura de repressão e anúncios de falsas reformas, como a reforma constitucional aprovada em um referendo falacioso ao final de fevereiro enquanto o exército bombardeava a cidade de Homs. No caso de não poder sustentar o poder, Assad espera estar em melhor correlação de forças para negociar uma saída política benéfica para sua família e seus próximos.

As contradições da política imperialista de "mudança de regime"

Como já colocamos em notas anteriores (ver Síria em jornadas decisivas, LVO N°461), diferente de outros ditadores pró-imperialistas questionados ou derrubados pelos processos da primavera árabe, como Mubarak no Egito, Ben Ali na Tunísia, a monarquia de Bahrein e inclusive o prórpio Kadaf na Líbia, o regime sírio tem contradições com os Estados Unidos e é o aliado mais firme com o qual conta o regime iraniano. Por isso, os EUA, a União Européia e as monarquias reacionárias do Golfo, como a de Quatar e da Arábia Saudita, e agora também a Turquia, que passou de aliado a inimigo acirrado de Assad, vêm pressionando através da imposição de sanções econômicas e do financiamento de gurpos opositores, para conseguirem uma "troca de regime" mas sem intervenção militar direta e com a cobertura "humanitária" das Nações Unidas e o aval da Liga Árabe. Para isso contam com a colaboração da direção pró-imperialista opositora a Assad, cuja principal organização, o Conselho Nacional Sírio, pede a gritos a intervenção estrangeira, seja sob a forma da imposição de uma zona de exclusão aérea ou seja pela via do armamento das forças opositoras como o Exército Livre Sírio, e alguns setores mais minoritários que pedem diretamente uma intervenção "como na Líbia".

No entanto, esta política está tendo mais contradições do que o esperado. Diferente de Kadafi, que havia ficado praticamente em um completo isolamento, o regime sírio conta a nível internacional com a sustentação da Rússia, que tem importantes interesses na Síria, começando pelo suculento negócio da venda de armas, e também com o apoio da China, que igual a Rússia não está disposta a validar por meio de uma resolução da ONU a intervenção estrangeira nos assuntos internos de outro estado, para não dar precedentes para que eventualmente possam fazer o mesmo contra ela. Isto fez fracassar em três oportunidades as intenções dos Estados Unidos em aprovar uma resolução no Conselho de Segurança das Nações Unidas que sirva de cobertura para qualquer ação imperialista, igual que fizeram na Líbia.

A debilidade do papel da ONU ficou exposta no fracasso da missão de Kofi Annan que foi com a linha de diálogo entre Assad e a oposição mas não conseguiu nenhum resultado.

Se bem que a intervenção na Líbia foi considerada um êxito para o imperialismo, o governo de Obama não quer ir para outra guerra antes das eleições, levando em conta, além do mais, o escândalo desatado no Afeganistão pelo assassinato de 16 civis perpetrado por um soldado norte-americano. Os planos de uma intervenção militar se complicam pela situação regional já que qualquer agressão poderia ser respondida pelo Irã, desatando um conflito regional que poderia implicar sobre o Estado de Israel. Na frente interna, o Conselho Nacional Sírio não consegue ser um aliado convincente para os Estados Unidos, que não tem certeza de quem são os que verdadeiramente tem peso orgânico em setores da sociedade, além da Irmandade Muçulmana. O governo de Obama teme armar grupos islamitas potencialmente hostis a seus interesses, como já aconteceu no Afeganistão na década de 1980. Além do mais, o Conselho Nacional Sírio parece muito mais dividido que o Conselho Nacional de Transição líbio antes da queda do Kadafi: existem rivalidades entre "exilados" formados no Ocidente e grupos locais, existem posições distintas frente ã intervenção militar imperialista, não está clara sua relação com o Exército Livre Sírio que parece atuar de maneira mais independente, a ponto de que o CNS tentou estabelecer um conselho militar para centralizar o armamento que chega principalmente desde a Turquia e Quatar. Estas tensões já haviam ficado em evidência na reunião dos chamados "amigos da Síria" (o CNS, as potências imperialistas, as monarquias árabes, entre outros) realizada na Tunísia que terminou em um enorme fracasso, e mais recentemente na renúncia de figuras pró-eminentes e a deserção de aproximadamente 80 membros sobre um total de algo próximo a 200. A isto se soma que o CNS não pôde incorporar até agora membros nem da minoria alauíta, nem da minoria curda. Estas exclusões poderiam antecipar futuros enfrentamentos pelo controle, no caso do CNS assumir o poder.

Mas a existência dessas contradições não implica que as potências imperialistas, sobretudo os Estados Unidos, tenham renunciado de sua política hipócrita de apresentarem-se como "amigos do povo sírio" para manipular a situação em favor de seus interesses.

A queda do regime de Assad é uma tarefa dos trabalhadores e das massas populares sírias

Contra o relato oficial que fala de uma conspiração externa para desestabilizar seu regime, do qual vergonhosamente fazem eco Chávez e correntes populistas que consideram o regime de Assad como "anti-imperialista", como antes fizeram com Kadafi, as mobilizações contra o regime de Assad se iniciaram como parte do processo mais geral da "primavera árabe" com motores similares: a revolta contra um regime opressor e totalitário, baseado na ditadura do clà Assad e em um partido único, combinado com o agravamento da situação econômica sobretudo dos setores marginalizados sob a estrutura de poder construída nas últimas décadas. No entanto, a direção do CNS e do Exército Livre Sírio tem utilizado a mobilização como instrumento de pressão a serviço da estrategia reacionária de "mudança de regime" em acordo com as potências imperialistas, para substituir o regime de Assad por outro ainda mais afinado com seus interesses. Enquanto Assad prossegue em sua política de esmagar por meios contra-revolucionários toda a oposição ao seu regime, o CNS busca a intervenção do imperialismo. A única saída progressista para os trabalhadores, os camponeses e os setores oprimidos da Síria virá da luta independente contra o regime de Assad, na perspectiva de um governo operário e popular.

15-03-2012

 

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