Por Juan Chingo
O futuro da relação com a Alemanha, o ascenso da direita xenofóbica, a política reformista da Frente de Esquerda e a campanha da “extrema esquerda”
Qual é a primeira análise das eleições?
O triunfo de Hollande se explica por um enorme cansaço – sobretudo dos setores populares, trabalhadores, empregados, os jovens dos bairros – na luta contra a política que o governo Sarkozy vem desenvolvendo durante os últimos anos, protagonizando grandes batalhas como a luta contra a reforma das aposentadorias de 2010. Esta última incluiu setores da classe operária como os das refinarias e municipais, com mobilizações multitudinárias e inclusive com a entrada em luta dos estudantes que diziam: “não aos planos de ajuste de Sarkozy”. Não obstante a derrota desta luta das aposentadorias, a política de negociação e colaboração de classe das centrais sindicais – em particular da CGT e CFDT – levou a que o anti-sarkozysmo se expressasse fundamentalmente no terreno eleitoral. E isso é o que explica que um político não muito conhecido como Hollande tenha conseguido ganhar a eleição, ainda que com uma margem bem curta. Esta pequena margem é expressão da política de Sarkozy, que tratou de cortejar o eleitorado da extrema-direita, que em boa parte terminou votando nele.
Frente a que cenário se encontra Hollande?
No fundo o plano de Hollande é fazer passar a crise, avançar na austeridade mas mudando de método. Se Sarkozy colocava um método mais bonapartista, passando por cima das organizações sindicais, mais parecido a um “governo da direita forte”; o método de Hollande é o de fazer bater o pé no diálogo e na reconciliação.
Em relação ã Europa é evidente que o candidato preferido de Merkel era Sarkozy e isto significa uma derrota para a Alemanha, que fica mais isolada. Entretanto, as esperanças de que haja uma modificação substancial da política europeia são uma ilusão que pode se transformar num grande desencanto. O que Hollande está defendendo são medidas temerárias de estímulo econômico que são inclusive menores que as que os EUA tomou e, que como se está vendo no próprio EUA, a crise não passou e está voltando o desemprego.
Ou seja, são tíbias medidas de estímulo econômico e algum limite ao setor financeiro, mas no marco de manter o equilíbrio orçamentário e o ajuste fiscal. Estas medidas têm de ser negociadas com a Alemanha, e é muito provável que termine num compromisso para alargar um pouco os tempos da aplicação dos planos de ajuste em troca de reformas estruturais nas leis trabalhistas, como a Alemanha e o Banco Central Europeu exigem. Um pequeno “alívio”, mas que não mudará nada de fundo.
Que perspectiva se abre?
Mais de fundo, a situação na Europa é que a política alemã, a potência imperialista mais forte, que trata de impor ao restante dos países europeus um regime econômico drástico em relação aos planos fiscais, está pondo em discussão o equilíbrio dos estados europeus, e isso gera um grande problema. Pelo temor da França de ficar afastada da Alemanha, e que isso implique um golpe econômico dos mercados, parece difícil que no imediato haja grandes rupturas. Mas, ao calor do aprofundamento da crise e da luta de classes, as opções dos governos podem mudar. Ainda que o eixo “franco-alemão” se mantenha, a política que levou Sarkozy em relação a Merkel, desde o ponto de vista de seus interesses imperialistas, foi de subordinação da França ã Alemanha. Passará Hollande a encabeçar um bloco com os países mediterrâneos como Espanha e Itália, que ponha limites ás ambições hegemônicas da Alemanha? A realidade é que toda a política da burguesia alemã, francesa e imperialista lamentavelmente está levando de novo a Europa a uma situação na qual os estados nacionais voltam com força, da mesma forma que a xenofobia nacional e os discursos nacionalistas reacionários. E isso, para os trabalhadores e para a juventude, não é uma perspectiva em nada progressista.
O crescimento da ultra-direita e do reformista Mélenchon A votação na Frente Nacional, de Marine Le Pen, expressa a crise do bipartidarismo que vem governando a França há anos, com a alternância de partidos de direita e de centro-esquerda, como o PS. E, sobretudo, mostra a crise da direita, do partido conservador e tradicional da burguesia [UMP, pelo qual foi eleito Sarkozy] que, desde o governo e o Estado, vem desenvolvendo uma política contra os imigrantes, que em última instância favoreceu o fortalecimento de Le Pen. Desde o ponto de vista social, o crescimento de FN expressa por um lado “nervosismo” em setores das classes médias e de pequenos comerciantes, que vêm que a situação econômica não melhora e que não viam perspectivas no sarkozysmo; e, por outro lado, expressa a situação de desespero de setores da classe operária, que nas zonas desindustrializadas ficaram ã deriva. Nesse marco, as políticas demagógicas da FN, com denúncias ás finanças e aos ditados de Bruxelas e ao mesmo tempo contra os imigrantes e por medidas de um estado forte e protecionista, ganham uma certa repercussão. Nesse marco há de se perceber os limites do reformismo da Frente de Esquerda de Melenchón, que por não ser uma crítica radical nem aos interesses da França imperialista, nem tampouco ã forma do estado e do regime político, ao bipartidarismo, obteve no primeiro turno muito menos votos que o esperado. Nos últimos dias o discurso de Melenchón, que ao princípio da campanha criticava Hollande, já era uma discurso a favor de Hollande frente ã disputa com Sarkozy. No dia em que ganhou Hollande, Melanchón disse que lhe desejava uma boa presidência e que era um grande dia para Europa. No lugar de preparar os trabalhadores para enfrentar a nova face da austeridade que vai assumir o governo de Hollande, acaba semeando ilusões.
A eleição de Philipe Poutou do NPA
Por sua vez, a campanha de Philipe Poutou do NPA foi reivindicável desde o ponto de vista de que era um candidato operário que em sua fábrica, a Ford, pôde parar parcialmente as demissões e evitar o fechamento. Por outra parte, conseguiu que sua mensagem pudesse ser escutada e terminasse se convertendo em um fato político, com uma denúncia aos políticos profissionais (incluindo Melenchón) e ao mesmo tempo conseguiu demonstrar o desprezo social que há na televisão contra um candidato operário, ao que tratavam de ridicularizar por descriminação de classe. Ora, os limites de sua candidatura são os limites do próprio NPA. Poutou não era a expressão nas eleições de uma camada de operários combativos que estavam entrando na política anti-capitalista. É um antigo companheiro militante que não podia, com alguns eixos corretos de campanha, substituir a política impotente do NPA nos últimos anos, como no conflito das aposentadorias, na ausência de uma política alternativa ã burocracia e na ausência de uma política de estruturar-se na classe operária.
Qual a perspectiva que a CCR coloca para os revolucionários na França?
Hoje o NPA está pagando essas falências ligadas a concepção estratégica de um partido amplo sem uma clara delimitação de classe e com um programa ambíguo, quer dizer, de ter abandonado a herança trotskista para construir um novo partido sem “hipóteses estratégicas”, rompendo a relação indissolúvel entre os meios estratégicos (ditadura do proletariado, governo dos trabalhadores) e o objetivo, o “fim político” (a sociedade sem classes, quer dizer, o comunismo). Resolver este impasse estratégico é a única “decisão vital” que o NPA deve tomar se quer sair de sua crise. Enquanto que os dirigentes do NPA que seguiram a Frente de Esquerda insistem com sua política de fazer um bloco estratégico com variantes do regime burguês como Mélenchon e os reformistas para “enfrentar a FN”, nossa melhor arma contra a extrema-direita é nosso programa anticapitalista e revolucionário que diz alto e forte que há outra alternativa radical ã UMP-PS, a alternativa da revolução socialista. Alternativa que opõe ã xenofobia e ao patriotismo um discurso internacionalista proletário. Que explica aos trabalhadores que o único “Estado forte” que estará a seu favor é o que eles próprios dirigirem democraticamente. A luta por esse programa anticapitalista, que não é o de Mélenchon, vai desde a necessidade de uma política audaz de frente única para a ação com todos os que se oponham a austeridade, mas sem confundir nossas bandeiras. O ascenso da FN, em um cenário de crise aguda como o que vive a Europa e que pode golpear a França mais aberta e catastroficamente faz urgente a discussão sobre o tipo de partido que se necessita para os futuros enfrentamentos. Nossa luta é por construir um partido revolucionário capaz de vencer as traições das direções sindicais, contra o método de ajuste de Hollande, e que se prepare estrategicamente para um endurecimento do regime, caso a decepção com o PS leve a um governo da direita recomposta em torno da FN. Este é o desafio para o apaixonante e dramático período que nos abre.
10-05-2012
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