Por Paula Bach
O premio Nobel de economia e colunista da The New York Times, Paul Krugman prevê a “saída grega do euro, muito possivelmente para o próximo mês”. No caso de cumprir-se tal diagnóstico tanto Krugman como os periódicos Financial Times e Der Spiegel dizem que o pânico se estenda ao resto da Eurozona e que o próximo passo seria uma corrida bancária na Espanha e Itália que poderia levar a eventuais "corralitos" a uma injeção de crédito do Banco Central Europeu (BCE) com posteriores políticas "mais flexíveis” ou, ao contrário, diretamente ao fim do euro.
Recessão: os limites dos resgates financeiros
No final do ano passado, frente ao iminente risco de quebra de algum banco que poderia desencadear uma nova situação ao estilo “Lehman”, o BCE decidiu ampliar 3 anos o fornecimento de liquidez aos bancos a um juros fixo de 1% ao ano. Como dissemos naquele momento “essa injeção massiva de liquidez, esteve longe de se converter em novos créditos que atue como estímulo ã economia da eurozona” conseguindo, só temporariamente, “conter a eclosão [da crise], mas de nenhum modo atuar sobre as tendências recessivas que se instalam com força na Europa” [1]. Apenas alguns meses mais tarde a denominada troika negociava um novo plano de “ajuda” para a Grécia e a reestruturação de sua dívida que como também apontamos “evita a quebra desordenada da Grécia e sua saída do euro a curto prazo, mas não resolve, e sim agrava, brutalmente os problemas do país, deixando incertezas significativas sobre o futuro da União Europeia (EU)” [2]
Se as políticas europeias de resgates financeiros contiveram as tendências a quebra ao estilo “Lehman”, os violentos ajustes de características clássicas neoliberais, aceleraram os elementos recessivos não só nos países mais débeis, mas no conjunto dos membros da Eurozona que cresceu 0% durante o primeiro trimestre do ano. A economia italiana teve contração de 0,8%, registrando 3 trimestres consecutivos de crescimento negativo do PIB. A Espanha contraiu 0,3%, registrando 2 trimestres consecutivos de queda. A Grécia contraiu novamente 6,2%. França registrou um crescimento nulo e a Alemanha, com um fraco crescimento de 0,5%, representa a economia mais vigorosa da zona do euro.
A ironia é que esta situação, predominantemente recessiva, acabaria provocando por um lado fortes crises políticas como a que atualmente se desenvolve na Grécia e, por outro, condições de falta de liquidez bancária como na Espanha, que reviveram, por outra via, as tendência a quebra financeira.
Espanha: recessão e nacionalizações bancárias
As políticas de ajuste fiscal e cortes sociais, implementadas na Espanha durante os últimos anos, soma-se o plano de ajuste e reforma trabalhista (que barateia e facilita as demissões) lançados pelo governo conservador de Rajoy para cumprir com as exigências de Bruxelas e Berlin. Estas medidas aprofundaram a recessão atingindo uma taxa de 25% de desemprego, um total de cinco milhões e meio de desempregados. O desenvolvimento recessivo na Espanha provoca a queda persistente do valor da propriedade o que faz com que grande parte das pessoas que hipotecaram suas casas nos últimos anos devam mais do que está valendo suas casas. É o produto de que sob a política de desalavancar e sanear os balanços bancários e liquidação de seu parque imobiliário, transfere-se o risco bancário aos compradores. Se relacionamos esta situação com os cortes de benefícios sociais e o aumento do desemprego, é compreensível que o elo débil da economia espanhola se encontra em seus bancos fortemente comprometidos no negócio da especulação imobiliária. Bankia, a quarta instituição bancária da Espanha precisou ser nacionalizada a poucos dias, enquanto o governo lançava um pacote de medidas que inclui um grande aumento das provisões aos bancos. Sem dúvida, essas medidas aumentaram a desconfiança no setor bancário que causou as quedas das bolsas de valores e não conseguiram frear a fuga de capitais, questão que levou o ministro da economia a solicitar ao BCE um maior respaldo na compra da dívida espanhola. O BBVA (segundo banco da Espanha) apresenta em seu informe colocou que as tendencias financeiras na Europa são, atualmente, piores que aquelas que seguiram ã quebra de Lehman, em setembro de 2008.
Frente única neokeynesiana
A urgente situação econômica e financeira da Espanha deve ser entendida como parte de um contexto europeu no qual reinam fortes tensões sociais e políticas. À queda de 16 governos na Europa agrega-se os recentes resultados eleitorais [3]. Um complexo contexto político no qual se destacam elementos de polarizações ã direita e ã esquerda, no marco das tendências recessivas reinantes, gera em amplos setores dirigentes da burguesia não só a “suspeita” de que as medidas financeiras implementadas até agora poderiam ser insuficientes, mas também um profundo temor que as políticas de Berlin e Bruxelas resultem que a situação saia do controle. Neste contexto, e para além da urgência da situação financeira e econômica, no qual há que compreender as previsões de Paul Krugman, Nouriel Roubini, do The New York Times, Financial Times e Der Spiegel. Está sendo criada uma frete única neokeynesiana encabeçada pelo próprio Krugman, mas que inclui até personagens como Hollande e o dirigente da coalizão de esquerda reformista Syriza, disposto a evitar um colapso do euro pressionando tanto quanto possível para que o establishment alemão e Bruxelas “abaixem o câmbio”. Isto poderia significar diferentes medidas tais como uma intervenção mais decidida do BCE, não mais emprestando aos bancos e aceitando títulos das dívidas como garantia, e sim comprando diretamente os títulos das dívidas de diferentes Estados, a aceitação de algum tipo de plano de eurobônus para aliviar o peso da dívida, que o BCE autorize um certo nível de inflação que permita ás economias do sul da Europa reestabelecer a competitividade a custa da conhecida “ilusão monetária” keynesiana [4], como a imposição de algum tipo de punção sobre o setor financeiro. Quer dizer, políticas semelhantes ás medidas tíbias adotadas por Obama, nos EUA. Lembremos que se quer uma política reformista qualitativamente mais audaz como a implementada pelo governo Roosevelt nos EUA a partir de 1933 conseguiu que economia norteamericana recuperasse seu nível prévio ã crise de 1929. Somente a preparação para a segunda guerra, com a montagem do aparato militar-industrial parasitando uma demanda garantida pelo Estado assinalou o início da verdadeira recuperação da economia norteamericana.
Contudo, a Grécia sairá mesmo da eurozona? Distintos analistas sustentam que o mercado vem se preparando para tal situação e que as medidas implementadas pelo BCE e pelo último “resgate” e reconstrução da dívida grega haviam delineado um panorama de relativa contenção pelo qual não necessariamente a saída da Grécia implicaria a desintegração da eurozona. Ainda que não se possa descartar essa hipótese, é preciso levarmos em conta que a agudização da situação na Espanha e também na Itália minam os alcances da dita contenção. Será que Merkel, hoje debilitada, deverá implementar algum tipo de flexibilização da sua política? Não podemos saber, o que é seguro é que, como bem coloca Krugman em seu último livro, a situação atual se assemelha a maneira a qual John Maynard Keynes descreveu a década de ’30: “estado crônico de atividade inferior ao normal durante um período de tempo considerável, sem tendência marcada para recuperação ou aprofundamento imediato” [5]. Se esse estado crônico afeta principalmente a Europa, também afeta a débil economia norteamericana e ameaça a, já não tão pujante, economia chinesa. Não há saídas tranquilizadoras para a pior crise da história depois dos anos ’30, na qual começam a despontar elementos de polarização política e na qual qualquer estratégia desenhada pela burguesia vai estar orientada a descarregar a crise de maneira mais ou menos evidente sobre as costas dos trabalhadores, preparando novas e piores catástrofes.
Notas
[1] Questões Estratégicas, Paula Bach. La verdade Obrera, n° 460.
[2] Postergam a bancarrota por medo que se afunde o euro, Juan Chingo. La Verdad Obrera, n° 464.
[3] Ver O triunfo do Partido Socialista, Juan Chingo e Eleições na Grécia: um rechaço aos partidos da austeridade, Alejandra Ríos. A estes resultados deve-se agregar a recente derrota de Angela Merkel e sua coalizão de governo, a CDU, na Renania do Norte-Westfalia nas mãos da Social-democracia, que foi considerado como um plebiscito nacional.
[4] Uma redução geral de salário encoberta pelo mecanismo inflacionário. Os aumentos salariais sempre estão abaixo do nível de inflação assim, o aumento real dos salários decresce, mas como numericamente aumenta, cria a ilusão de que está aumentando e isso estimula o consumo.
[5] ¡Acabad ya con esta crisis!, Paul Krugman, 2012, Editorial Crítica, Barcelona, España.
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