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México: segue aberta a crise
por : Martín Juárez

02 Dec 2006 |

Num contexto no qual segue em pé a luta de Oaxaca e o principal dirigente opositor López Obrador se apresentou como “presidente legítimo” num ato de protesto, no dia 1/12 assumirá a presidência Felipe Calderón, imposto pela fraude de julho de 2006, frente a um Congresso praticamente ocupado pela polícia presidencial e sitiado pela Polícia Federal Preventiva.

Recentemente o governo de Vicente Fox anunciou um novo ataque contra os trabalhadores e os setores populares: um aumento no preço do leite Liconsa (produto subsidiado de baixo custo) e dos combustíveis. Esta impopular medida, pactuada entre Calderón e Fox pretende - além de tentar evitar os custos destas ao futuro governo -, mostrar o compromisso do PAN como fiel garantidor dos planos do imperialismo. É por isto que Fox sustenta (com o apoio de Calderón) a todo custo o repudiado governo de Ulisses Ruiz em Oaxaca, para evitar que uma eventual queda deste seja vista pelas massas como um triunfo, e se mostrar como um garantidor das instituições pró-imperialistas.

Os “novos” ministros anunciados por Calderón para seu gabinete, ex-priístas e vários servidores públicos do atual governo deixam claro este compromisso, como disse a própria Confederação Patronal do México (Coparmex), estas nomeações “marcam uma linha de continuidade no manejo da economia” (La Jornada, 22/11), que sustentará uma política neoliberal que aponta para conseguir uma maior entrada das multinacionais no setor energético, a redobrar o ataque sobre o sistema de pensões e aposentadorias, as condições trabalhistas e conquistas sindicais, segurança social e a educação, etc.

Estas medidas e o caráter abertamente pró imperialista e entreguista do novo governo podem aprofundar sua impopularidade e ilegitimidade ainda antes de assumir. Os milhares que se mobilizaram no Zócalo (praça principal) do Distrito Federal no dia 20/11, para assistir ã “posse de protesto” de Andrés Manuel López Obrador (AMLO) como “presidente legítimo”, demonstram que continua o profundo descontentamento com o PAN e as instituições do regime que legitimaram a fraude do dia 2 de julho. Apesar de que López Obrador e o PRD evitaram que as massivas mobilizações anti-fraude confluíssem com as ações dos trabalhadores e o povo oaxaqueño, o descontentamento continua. Ao mesmo tempo permanece a heróica luta em Oaxaca, exigindo a renúncia de URO e a saída da PFP e no DF mantém-se o acampamento dos combativos e resistentes companheiros oaxaqueños.

Junto a isto, nas últimas semanas setores de trabalhadores iniciaram novas ações de luta: como os trabalhadores açucareiros, que paralisaram 58 engenhos em todo o país, ou os trabalhadores do Colégio de Bachilleres, que estão em greve há mais de 3 semanas.

Uma profunda crise do regime

Existe uma profunda divisão e polarização social que se aprofundou ao calor do ataque e da ofensiva impulsionada pelo foxismo e as instituições do “regime da alternância”: por um lado, milhões de trabalhadores, camponeses e setores empobrecidos da classe média e da juventude que sofrem o desemprego e a carestia de vida, e por outro, uma minoria de capitalistas, latifundiários e setores acomodados das classes médias que gozam dos privilégios resultantes da ofensiva sobre as massas populares. Se nos anos prévios isto podia ser controlado pelas instituições “democráticas”, a crescente luta de setores de trabalhadores (como em Oaxaca) e as massivas mobilizações antifraude, mostram que o descontentamento operário e popular pode se traduzir em grandes ações de luta.

Para a classe dominante, o perigo é que a ascensão do novo governo se dê num contexto marcado por novas ações e mobilizações, que se combinem com a luta heróica de Oaxaca. É por isso que o governo está tentando debilitar e desativar esta luta, mediante provocações permanentes, além do papel dos setores conciliadores da própria direção da APPO.

Num contexto como este, Calderón assumiria como um governante débil, só sustentado pelo apoio incondicional da patronal e das multinacionais norte-americanas e européias (como a Telefônica da Espanha); procuraria se apoiar também nos pactos com o PRI no Congresso, que é a primeira força no que se refere aos governos estatais, ainda que conta com pouco prestígio e credibilidade entre as massas, como expressou por exemplo o repúdio generalizado ao governo priísta de URO. Ainda que com estes pactos conseguissem certa fortaleza e estabilidade no interior das instituições (por exemplo para votar reformas estruturais), se manteria e acrescentaria a brecha com relação ao descontentamento existente entre os trabalhadores e o povo. Isto seria um cenário de pesadelo para o imperialismo por se dar em seu “quintal”, que poderia ter efeitos e repercussões entre os milhões de trabalhadores latinos, apesar do reacionário muro de Bush. Isto poderia impactar nos EUA pelo importante peso dos trabalhadores mexicanos (como se viu durante as mobilizações de abril e de maio), uma mostra desta potencialidade pode se ver no recente triunfo de uma greve liderada por operários mexicanos numa das principais empacotadoras de carne dos EUA.

No México mantém-se uma situação convulsiva da luta de classes, e possivelmente estejamos diante do início de um processo de caráter revolucionário, do qual a comuna de Oaxaca é a maior antecipação e que, para se desenvolver, requererá que entrem em cena os grandes batalhões da classe operária mexicana.

AMLO e o PRD não são alternativa

López Obrador realizou sua cerimônia de “posse de protesto” presidencial frente a milhares de pessoas, na qual apresentou um programa que combina o chamado ã defesa do “patrimônio e a soberania nacional”, com propostas de controle aos monopólios, e chamados ã “democratização” mediante um “novo marco institucional”. Sem dúvida, a ascensão de AMLO como “presidente legítimo” expressa a existência de uma profunda crise do regime, no qual o principal referente da oposição desconhece o governo do PAN, que ao mesmo tempo, para impulsionar sua política acrescenta o confronto com a oposição no Congresso. Isto se combina com as declarações e reuniões convocadas pelo dirigente do PRD contra a repressão em Oaxaca.

Na realidade, AMLO impulsionará este programa através de seus parlamentares. Desta forma ele e o PRD procurarão aparecer como a principal força política opositora ás medidas antipopulares do novo governo. Isto está a provocar reacomodações e posicionamentos no PRD.

A política de AMLO não representa uma alternativa para os trabalhadores, camponeses e indígenas do México nem procura desenvolver sua luta para a derrubada revolucionária destas instituições reacionárias. AMLO frente ao perigo de que a luta antifraude se radicalizasse, atuou para desarticular a mobilização, se mostrando incapaz de encabeçar uma luta conseqüente pela elementar demanda de “Abaixo a Fraude”.

Como colocamos a partir da LTS, isto foi assim porque AMLO e o PRD, apesar de seus discursos de “ao diabo com as instituições”, são parte das mesmas (administrando os negócios da burguesia no DF e outros estados) e partidários de manter, com algumas reformas, o mesmo regime de dominação da burguesia que garante os negócios dos grandes monopólios. Esta política procura cooptar tudo o que atue de maneira independente ou por fora das instituições, como é o caso da vanguarda combativa oaxaquenha.

Para aproveitar a crise do regime em favor dos explorados e oprimidos, impor suas demandas e reivindicações e evitar novas armadilhas que procurem recompor as decadentes instituições, é necessário que -longe de confiar na reformas que propõe AMLO- impulsionemos a mobilização dos trabalhadores e do povo, com independência do regime e um programa próprio para que peguem a crise os capitalistas e os latifundiários. Esse é o caminho que ensina Oaxaca e sua comuna, no qual há que generalizar e estender para todo o México: há que confiar só nas forças dos explorados e oprimidos.

Para entender melhor:

 Andrés Manuel Lopez Obrador (AMLO) é dirigente do Partido da Revolução Democrática (PRD) e tem buscado se localizar como alternativa ao PAN e ao PRI, se alimentando do sentimento de repúdio de setores das massas para com a política daqueles partidos.

 Felipe Calderón foi o candidato declarado vencedor nas eleições, e pertence ao Partido de Ação Nacional (PAN), de direita.

 Vicente Fox é membro do PAN e atual presidente do México.

 Regime de Alternância: assim é conhecido o acordo entre os três principais partidos - PRI, PAN e PRD - para alternar-se no poder, depois do desgaste do priato, do levante zapatista e da crise econômica conhecida como "Efeito Tequila", que afetou o México em 1994.

 

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