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Frente ao encontro do presidente egípcio e Dilma Rousseff
por : Simone Ishibashi

13 May 2013 | O presidente egípcio Mohammed Mursi, membro da Irmandade Muçulmana, esteve no Brasil entre os dias 9 e 10 de maio, tendo se encontrado com Dilma Roussef, e realizado reuniões com a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (...)

O presidente egípcio Mohammed Mursi, membro da Irmandade Muçulmana, esteve no Brasil entre os dias 9 e 10 de maio, tendo se encontrado com Dilma Roussef, e realizado reuniões com a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). É a primeira vez que o presidente que assumiu o poder após a queda do ditador Mubarak pelas massas visita algum país da América Latina. A visita de Mursi ao Brasil é a última etapa das viagens do presidente egípcio aos integrantes do Brics - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Mursi veio ao país com uma comitiva composta por 22 empresários egípcios, numa clara tentativa de ampliar as “parcerias econômicas” com o Brasil, vendendo o quão rentável pode ser para a burguesia e o governo brasileiro investir no Egito. Estima-se que o investimento brasileiro no Egito movimente hoje cerca de US$ 3 bilhões. As grandes empreiteiras brasileiras já declararam ver naquele país uma ótima oportunidade de ampliar ainda mais seus lucros, a exemplo do que já se faz, não apenas em países como o Iraque, mas também na própria América do Sul, como por exemplo na Bolívia, onde as construtoras e outros monopólios como a Petrobrás arrancam os povos originários de suas terras e destroem reservas ambientais sem hesitação.

Ademais dos interesses econômicos claramente declarados, uma boa carga de demagogia permeou a estadia de Mursi no país, com este declarando "queremos aprender e aproveitar a experiência brasileira”, para em seguida declarar que “a revolução que começou em fevereiro de 2011 visa dar liberdade, democracia e justiça social ã população”. Dilma Rousseff não ficou atrás, quando após comparar a primavera árabe com as Diretas Já afirmou que “acompanhamos com emoção e sentimento de solidariedade o processo de transformação desencadeado na Praça Tahrir. (...) Vivemos no Brasil processo similar de redemocratização a partir dos anos 1980”, afirmou. Continuou dizendo que, “os ventos da redemocratização vão ser o precursores de projetos econômicos, renovado tanto do ponto de vista social quanto do ponto de vista político quanto no que se refere ã afirmação da soberania no Egito” [1]. Ambos encheram a boca para se alçar como porta-vozes de processos de mobilização de massas sobre os quais atuaram, cada qual ã sua maneira, como elementos de desvios da potencialidade revolucionária ali posta. Ambos falam de democracia, liberdade e justiça social enquanto sua atuação concreta aponta para outro sentido: para garantir liberdade e democracia apenas para suas burguesias locais, em detrimento das demandas mais sentidas pela classe trabalhadora e os povos de seus países.

Dilma e Mursi: a verdade por trás de suas comemorações democráticas

Se a ainda relativamente razoável situação econômica e a alta popularidade impedem por ora que seja óbvia a percepção de Dilma como a chefe de um governo burguês e repressivo que continua avançando contra setores dos mais explorados da classe trabalhadora, como se prova com os operários das usinas de Santo Antônio, Belo Monte e Jirau que sentiram na pele a repressão da Força Nacional, enquanto o governo para garantir os interesses das grandes construtoras brasileiras que o presidente egipício quer importar a seu país, o mesmo não pode ser dito de Mohamed Mursi.

Desde que assumiu o governo em 30 de abril de 2012 em uma eleição bastante conturbada com apenas 3% de votos de vantagem sobre seu competidor Ahmed Shafiq, Mohammed Mursi foi alvo de contínuas mobilizações populares, e manteve intactos diversos elementos do regime anterior. Um exemplo é o próprio papel das Forças Armadas, que continuam sendo um sustentador importante deste governo débil. Ademais, produto das tensões entre as frações dos distintos setores da burguesia egípcia, formou-se uma oposição aglutinada na Frente de Salvação Nacional, que é composta como uma coalizão de forças liberais, nacionalistas e ex-aliados de Mubarak, que também é integrada por organizações como o Movimento 6 de Abril, que atuou no processo revolucionário de 2011, e que recorrentemente organiza ações contra o governo. A heterogeneidade destas forças dificulta que o profundo processo aberto com a queda de Mubarak, tome um curso claramente revolucionário, colocando ã frente os setores avançados da classe trabalhadora como os que se mobilizaram em Mahalla e os jovens da Praça Tahrir.

Mas mesmo isso não impede que as manifestações tomem as ruas contra Mursi. Sua última derrota política significativa veio justamente das importantes mobilizações que obrigaram o presidente da Irmandade Muçulmana a retroceder de ampliar seus poderes na proposta de Constituição elaborada em novembro de 2012. Na ocasião se deram vários enfrentamentos entre manifestantes, que declaravam que não haviam se mobilizado para trocar um ditador por outro, com a polícia, enquanto que a sede do partido de Mursi chegou a ser queimada em cidades como Ismailiya e Port Said, com a declaração de estado de emergência após a morte de dezenas de pessoas. Esta situação também se ligava aos protestos após a condenação ã morte de 21 pessoas da cidade por ligação com o tumulto no estádio de futebol no ano passado, quando 74 pessoas morreram e 254 ficaram feridas nos enfrentamentos entre torcedores do clube local, Al Masry, e do Al Ahly, do Cairo, o mais popular do país, que resultou em um dos mais fortes atos contra o governo de Mursi.

Os protestos seguem no Egito simplesmente porque as demandas que colocaram em marcha a queda de Mubarak não foram atendidas. O país continua pela política de Mursi subserviente ao imperialismo, sobretudo norte-americano, e atuando de acordo com os interesses daquele. Tanto é assim que fechará um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para receber um empréstimo de US$ 4,8 bilhões, previsto para este mês, renovando dessa forma suas relações de vassalagem. Enquanto isso, o desemprego oficial segue em 12,7%, prevendo-se aumento ao longo deste ano. A “democracia egípcia” que Dilma Rousseff saudou frente a Mursi está baseada em uma constituição recém elaborada que dentre outras questões proclamou o islà como religião de Estado, mantendo este elemento que já existia durante a era Mubarak, e declarou os princípios da lei islà¢mica como a fonte de legislação. O que para Dilma realmente não deve ter nenhuma importância na medida em que ela própria fere abertamente o princípio de separação entre o Estado e a religião, abrindo caminho para a ascensão do pastor Marco Feliciano ã Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Além disso, Mursi deixou o orçamento de defesa ainda mantido pelos Estados Unidos, e manteve as Forças Armadas como uma instituição chave na dominação da economia, conservando também os odiados tribunais militares para julgar os civis, que processaram mais de 12 mil ativistas desde o final da ditadura de Mubarak. Evidentemente que não houve nenhum comentário sobre nada disso vindo do governo chefiado pelo PT, que já arregaça as mangas para garantir os lucros neste botim.

Os acordos pelo alto não podem resolver as demandas dos povos

Como já dissemos em diversas ocasiões frente ás tentativas de formação de blocos entre os governos burgueses dos países que se convencionou chamar “em desenvolvimento”, como a ALBA, Mercosul, e etc, não podem resolver as demandas estruturais dos povos e das classes trabalhadoras destes países. A tentativa de Mohamed Mursi de integrar os BRICs ademais de firmar acordos entre os grandes conglomerados dos países que integram a sigla, que jamais poderia resolver os problemas mais profundos que levaram a classe trabalhadora, a juventude e as massas egípcias ás ruas, é uma tentativa extremamente demagógica e débil de tentar mascarar seu intenso servilismo em relação aos Estados Unidos, que continua como mínimo igual ao da era Mubarak.

A burguesia brasileira não se importa com o povo egípcio e buscará extrair o maior lucro possível. Se tiver que devastar áreas do país, drenar recursos, e golpear a população como faz na Bolívia, o fará. A burguesia brasileira, bem como o governo Dilma, não são aliados dos trabalhadores e das massas egípcias. Os únicos setores de nosso país que podem atuar como verdadeiros aliados da primavera árabe e do levante egípcio são os trabalhadores e a juventude, que devem apoiar uma política de apoio internacionalista ativo. Isso significa colocar claramente que nenhuma resolução pode vir de acordos costurados pelos governos, pelo alto, na esfera em que quem comanda é a burguesia. Significa também reafirmar que aqui, do outro lado do Atlà¢ntico, a luta dos trabalhadores e do povo egípcio encontra um apoio decidido. E que estamos pela queda revolucionária do regime de Mursi, com os trabalhadores adiante, atuando como porta-vozes de todos os setores explorados e oprimidos, independentemente de sua burguesia local que, junto com o governo da Irmandade Muçulmana, realiza uma turnê internacional para vender seu país, para que se avance na instauração de um verdadeiro governo operário e camponês.

 

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