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A potencialidade de uma perspectiva revolucionária no pós-junho
por : Iuri Tonelo , Val Lisboa

11 Nov 2013 | No último dia 2 de novembro ocorreu em São Paulo um encontro de trabalhadores e estudantes que reuniu mais de 800 pessoas dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pará, Paraná, Amapá, Distrito Federal e Paraíba para refletir sobre as lições de junho desde uma perspectiva (...)

No último dia 2 de novembro ocorreu em São Paulo um encontro de trabalhadores e estudantes que reuniu mais de 800 pessoas dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pará, Paraná, Amapá, Distrito Federal e Paraíba para refletir sobre as lições de junho desde uma perspectiva revolucionária.

Há poucos meses atrás, Dilma e seus aliados mantinham uma fortaleza importante, disseminando ideologias de um suposto “Brasil: país do futuro” que escondia a precarização e a exploração diária, em cada local de trabalho, em cada fábrica, em cada canteiro de obra do país. Hoje vemos esse castelo esvair no ar, e esse fato se comprova nas mobilizações de junho até nas da atualidade, mas também no anseio apaixonado de cada trabalhadora e trabalhador e cada estudante, como os presentes no Encontro os quais se inflamavam para cantar ao público que a grande conclusão de junho é dizer basta desse Brasil da exploração, da opressão e da violência policial, que o momento é de sonhar em transformar essas condições de cima a baixo, de vislumbrar uma alternativa revolucionária.

Daqui decorre o seguinte: o encontro do dia 2, impulsionado pela LER-QI, expressa uma mudança na subjetividade dos trabalhadores e da juventude no pós-junho, e é desse ponto que queremos partir nesse texto.

A situação nacional brasileira: o elemento objetivo

Em primeiro lugar, é necessário reafirmar que a situação nacional brasileira entrou num período transitório: se não vemos hoje no Brasil uma ação independente e contundente da classe operária - que pudesse gerar uma situação pré-revolucionária - podemos dizer que o gradualismo e a passividade lulista que marcavam a etapa anterior encontram-se completamente debilitados.

As jornadas de junho significaram um “forte golpe” em qualquer controle sobre a juventude, criaram novo ânimo no movimento operário e debilitaram enormemente os governos. Isso se demonstrou poderosamente nas jornadas de junho, com milhões nas ruas pela luta contra o aumento da tarifa do transporte público (com forte peso na reivindicação da estatização), mas também nas mobilizações posteriores: nas greves de correios e bancários de semanas em jogo de braço contra a patronal, na greve de professores do Rio de Janeiro - com atos e elementos de radicalização contra a política dos governos de Eduardo Paes e Sérgio Cabral -, na greve nacional de petroleiros, com os trabalhadores enfrentando a “maior privatização da história” que foi a desavergonhada entrega do governo Dilma de nosso petróleo a multinacionais imperialistas e em paralisações e greves nas fábricas brasileiras.

Essa ofensiva das mobilizações não tocou apenas o governo, mas também elementos do regime: uma recente pesquisa do 7° Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública diz que 70% da população não confia na polícia, sendo os dados referentes ao primeiro semestre, mostrando que o aparato de repressão do Estado encontra-se desgastado frente ã população – não por acaso o assassinato de Amarildo se tornou um fenômeno nacional.

Se mesmo em uma situação de relativa estabilidade econômica pode-se abrir essa grande crise política, o governo começa a encontrar um cenário econômico cada vez mais complexo: não é um detalhe que no mesmo momento em que o governo entrega nosso petróleo ás multinacionais, o “símbolo” do “Brasil-potência” do passado, a OGX petróleo de Eike Batista, caminha para a falência. Um sinal importante do que se pode esperar de um Brasil mais em “consonância” com a situação internacional.

Se é verdade que por um lado as mobilizações que reuniram milhões pelas ruas de todo o país refluíram no momento e que Dilma recuperou parte de sua queda brusca de popularidade em junho, assim como variantes como Eduardo Campos e Marina Silva seguem com aparente legitimidade frente ã população, por outro segue a politização em amplas camadas da população. Todos esses elementos instigam um descontentamento enorme na juventude e nos trabalhadores, o que vem abrindo espaço para que os encontros da esquerda tenham mais peso, mas em particular para uma perspectiva revolucionária, que canalize esse ódio ã repressão, ã exploração e opressão em uma alternativa real.

Algumas lições de junho: o aspecto subjetivo

Mas não se tratou apenas dos elementos objetivos: em realidade trata-se também de refletir a intervenção política em junho. O início das mobilizações marcou um enorme rechaço da população contra o regime político de conjunto, que se expressava aparentemente no antipartidarismo nas manifestações, mas que marcava de fundo um repúdio ã casta política e aos partidos dominantes. A primeira tarefa da esquerda era entender esse “espírito de época”, distinguir os elementos regressivos dos progressivos e abrir campo para o diálogo com a juventude e os trabalhadores.

A partir disso, tirar algumas lições: as jornadas expressavam um dos fenômenos sociais mais profundos desde o Fora Collor, e no que tange ao conteúdo social (começou como luta pelo transporte público – e nesse sentido questionava os interesses da burguesia) superava aquele fenômeno; nesse sentido, era possível e necessário um programa operário e popular que pudesse reverter todo o retrocesso do período de ofensiva neoliberal, de privatização e precarização de direitos elementares (transporte, saúde, educação) e avançar em consignas transitórias que colocassem em xeque o regime. No entanto, para impor tal programa era decisiva a entrada em cena da classe operária, a qual tem sido barrada pela burocracia sindical, que impede as organizações de massas de mobilizar a força social e política da enorme massa trabalhadora para dar um xeque-mate no governo Dilma, governos estaduais e na casta política.

Nesse sentido que a esquerda – PSOL e PSTU, principalmente –, por mais que se colocasse no campo “antigovernista”, chegou em junho completamente desarmada de uma estratégia de combate classista e anticapitalista, sem haver preparado suas organizações (CSP-Conlutas, Intersindical, movimento estudantil e popular) para cumprir um papel de alternativa de direção ã burocracia sindical e estudantil (CUT, UNE, Força Sindical, CTB), e também ã direção do MST, desmascarando o atrelamento dessas direções aos negócios capitalistas (Copa do Mundo, privatizações dos serviços públicos, do petróleo e recursos naturais, precarização do trabalho etc.). Junho não encontrou uma direção ã altura capaz de dar um rumo de combate contra a raiz dos males sociais contestados, e infelizmente não abriu nenhum debate profundo sobre a necessidade urgente de reagrupamento das centrais e agrupações antigovernistas em base a um sério balanço do processo, colocando de pé um polo antiburocrático e classista para fazer frente ã burocracia sindical e aos aliados do governo.

Essa incapacidade política se expressa estratégica e programaticamente no que tange a delimitação da esquerda com o fenômeno Black Bloc. As desastradas afirmações do PSOL e do PSTU frente a esse fenômeno, com posições políticas públicas muitas vezes sectárias que faziam coro com uma campanha nacional de criminalização dos mascarados (que atinge no fundo os movimentos sociais) foi decisiva para o enorme rechaço que se aprofundou na juventude e em setores combativos dos trabalhadores a essas organizações.

Ou seja, a combinação de paciência para dialogar com os setores que despertam (fruto de junho) ã vida política junto com a audácia para se ligar aos elementos mais combativos da realidade (nas greves, nos atos de rua, nos enfrentamentos ã repressão policial) é fundamental para a organização necessária de centenas e milhares desses jovens e trabalhadores que buscam uma alternativa a partir de junho.

A necessidade de uma alternativa revolucionária

Ou seja, as condições da situação brasileira colocam toda uma vanguarda – dezenas de milhares de jovens, trabalhadores e ativistas sociais – que surgiu em junho diante da necessidade de uma verdadeira alternativa. A partir do esfacelamento do petismo como mediação, o que essa vanguarda ampliada vê é, por um lado, os partidos com forte tendência “reformista” (PSOL, PCB), e colado neles o PSTU, com suas impotentes atuações nas mobilizações de junho, e por outro lado, pequenas organizações sectárias que não conseguem ser uma alternativa real e nem ganhar nenhuma dinâmica frente a toda a mudança da situação.

Dessa forma, abre-se um enorme espaço para uma alternativa revolucionária diante da situação que se inicia em nosso país. Contudo, não se trata de uma perspectiva autorreferenciada de crescimento de “outra pequena corrente”, erro recorrente da esquerda brasileira: a grande tarefa que se coloca é abrirmos uma discussão sobre a necessidade de construir um verdadeiro instrumento dos trabalhadores, um partido operário revolucionário no Brasil, um partido que expresse a independência política da classe operária diante de todas as frações burguesas, anticapitalista e anti-imperialista, um partido de combate, da luta de classes contra a classe capitalista e o Estado burguês (todas as suas instituições), um partido dotado de programa e estratégia para vencer, derrubar o capitalismo e instaurar uma república operária e socialista, uma democracia de massas nos moldes dos primeiros anos da Revolução Russa dirigida pelos sovietes da época de Lenin e Trotsky. Um partido enraizado na imensa classe operária brasileira, que lute contra a burocracia sindical para expulsá-la dos sindicatos e organizações de massas, retomando essas organizações para a luta anticapitalista e antiburguesa. Essa é nossa aposta e o encontro do dia 2 é um pequeno, mas importante passo nesse sentido.

 

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