Os atos contra a Copa do Mundo ocorridos no dia 25 de janeiro tiveram uma repercussão relativamente muito superior ao que de fato seria de esperar pelo tamanho dos mesmos (o maior, em São Paulo, contou em seu auge com 3 mil pessoas). Par além das declarações de preocupação da FIFA e das reuniões entre Dilma e seus principais ministros para armar estratégias preventivas frente ã possibilidade de que grandes manifestações de massa venham a colocar em crise o megaevento, esse se transformou em um dos principais temas de colunistas e analistas políticos da grande imprensa. A própria iniciativa do governo de impulsionar um movimento #vaitercopa para se contrapor ao movimento #nãovaitercopa demonstra a preocupação das elites dominantes, com o PT mais uma vez acionando seus “formadores de opinião” para desqualificar os protestos buscando coloca-los como parte do jogo eleitoral da oposição burguesa para desgastar a candidatura de Dilma frente ás eleições que ocorrerão no segundo semestre. No mesmo sentido, a Rede Globo, preocupada com sua audiência, hipocritamente orienta seus jornalistas a fazerem uma cobertura “equilibrada” da Copa, que não só faça apologia ao evento, mas também expresse as críticas e descontentamentos ligados a ele, demonstrando também o potencial que os movimentos contra a Copa têm de ganhar o apoio de setores mais amplos da população.
É por isso que o governo federal tem preparado um forte plano de propaganda dos benefícios da Copa e não podemos descartar a possibilidade de que inclusive venha a dar algumas concessões para minimizar esse perigo. Entretanto, não só a desagregação das condições econômicas do país limita essas possíveis concessões como esse plano se articulará com um forte aparato repressivo, haja vista a mobilização preparatória de grandes contingentes da Força de Segurança Nacional.
Como pode a Copa ser ameaçada justo no “país do futebol”?
A essa altura, os governos imperialistas, os grandes monopólios capitalistas que lucram horrores com o campeonato, assim como seus agentes em organismos como a FIFA, provavelmente estão arrependidos de terem escolhido o Brasil como sede dos jogos de 2014. Quando foi feita essa escolha, a imagem do Brasil no mundo era a do cristo redentor alçando voo como um foguete, simbolizando a localização internacional que o país adquiria como “estrela” dos BRICS. Hoje, frente ã acentuada dinâmica de desagregação da economia nacional, combinada com a nova relação de forças favorável ã intervenção do movimento de massas que se abriu com as jornadas de junho do ano passado, o Brasil está conhecido internacionalmente com um dos “cinco frágeis”, terminologia utilizada para ressaltar os cinco países emergentes que no próximo período podem se colocar como a “bola da vez” na crise econômica mundial, já que justamente por seu peso político e econômico têm o poder de gerar processos em cadeia que atinjam outros países.
Antes, a cegueira da sede de lucro dos monopólios imperialistas não lhes permitiu ver as enormes contradições que se acumulavam em meio ao ciclo de crescimento econômico excepcional motorizou a economia internacional antes da quebra do Lehman Brothers. A própria Copa do Mundo na África do Sul ocorreu quando os países emergentes ainda vivenciavam um forte ciclo de crescimento econômico mesmo depois de aberta a crise econômica mundial. Agora, as contradições que se acumularam durante todo o período anterior veem ã tona, colocando em evidência as crises típicas de um país historicamente subordinado ao capital imperialista, por isso mesmo monstruosamente marcado por enormes desigualdades sociais e graves problemas estruturais.
É assim que daqui até junho todas as crises típicas de um país semi-colonizado pelo capital imperialista vão estar sob os holofotes da imprensa imperialista; da mesma forma que todas as injustiças ligadas ao megaevento alimentarão o descontentamento das massas com as desigualdades que vêm sendo questionadas desde junho. Desde o perigo de apagões até a ameaça de racionamento de água, todas as crises próprias da precária infraestrutura do país ganharão dimensões internacionais. Imaginem o “barril de pólvora” que não seria se o governo, para garantir o conforto dos 5 milhões de turistas-espectadores, provocar apagões e racionamentos nas favelas e periferias, que já sofreram violências de todo tipo com as remoções e vêm bilhões e bilhões serem destinados para o deleite de uma pequena minoria enquanto a maioria esmagadora da população segue sofrendo com as enchentes e as filas nos hospitais.
A heroica greve dos rodoviários de Porto Alegre, que contra a direção burocrática do seu sindicato bancam uma greve que para a cidade por mais de 13 dias, retomando demandas históricas como a redução da jornada de trabalho e estabelecendo um diálogo com a população com a demanda da gratuidade do transporte é uma demonstração cabal de que as jornadas de junho abriram uma nova etapa da luta de classes no país. Os 37 ônibus incendiados nos bairros periféricos de São Paulo mostram que a população mais pobre do país está disposta a rebelar-se contra a violência policial, as enchentes e a precariedade dos transportes. As manifestações contra o aumento da passagem de ônibus decretado pelo prefeito do Rio Eduardo Paes evidencia como as elites dominantes vão querer voltar ã carga com novos ataques e o povo está disposto a resistir. Os usuários do metrô que se rebelaram no pane que durou mais de 5 horas em São Paulo no dia 04/02, ao cantarem “não vai ter Copa!”, mostraram como o estendido descontentamento com a precariedade dos transportes se liga espontaneamente com as injustiças do megaevento. A indignação frente ã cruel tentativa de assassinato do jovem Fabrício por parte da polícia na manifestação de 25/01 em São Paulo mostra como a truculência repressiva pode voltar a ser novamente a faísca que incendeie o descontentamento popular.
Esse “caldo de cultura”, ligado ã já esperada brutalidade da repressão policial, é o que tem feito as elites dominantes terem tanto medo de que um movimento que começa sendo de vanguarda possa dar lugar a grandes manifestações de massa como em junho do ano passado
Coloquemos a estatização dos transportes com gestão dos trabalhadores e controle dos usuários no centro das demandas do movimento
Nós da LER-QI nos colocamos como uma ala revolucionária do movimento conhecido pela consigna #nãovaitercopa pois consideramos que essa demanda em si mesma é incapaz para atingir os objetivos que se propõe, já que não dialoga com os setores mais atrasados das massas que não tem consciência de como a Copa está a serviço dos interesses de lucro do Grande capital imperialista ás custas dos interesses das massas exploradas e oprimidas do país, e por isso lutamos contra a política das direções anarquistas e autonomistas que ignoram esse problema, ao mesmo tempo em que batalhamos para que este movimento se articule com palavras de ordem que relacionem o megaevento com os problemas mais sentidos das massas e proponha saídas de fundo para as demandas que emergiram nas jornadas de Junho.
As correntes da esquerda como o PSOL e o PSTU, ao mesmo tempo em que vêm participando dos atos contra a Copa, têm defendido como política uma Copa menos elitizada combinada com demandas de maiores direitos sociais, mas sem definir claramente um programa que dê uma saída de fundo ás demandas mais sentidas da população. Esse é uma política que se prepara para adaptar-se ao petismo e ã burocracia sindical assim como esses partidos fizeram em junho do ano passado.
Para sermos consequentes com a principal demanda que emergiu das jornadas de junho e que volta a emergir na greve dos rodoviários de Porto Alegre, na luta contra o aumento de Paes no Rio ou nos 37 ônibus incendiados nas periferias de São Paulo e nas panes do metrô dessa cidade, devemos colocar no centro das demandas do movimento a batalha pela estatização dos transportes com gestão dos trabalhadores e controle dos usuários. Esse é o único caminho para que a população possa de fato decidir as formas de gratuidade que preferir e não seguir dando rios de dinheiro ás máfias das empresas de ônibus.
O 2° grande ato contra a Copa está convocado para realizar-se no dia 22 de fevereiro e terá como tema principal a luta pela educação. Aqui também, para sermos consequentes com a demanda de “Educação padrão FIFA” que emergiu das jornadas de junho, devemos defender a estatização das universidades privadas e de todo o sistema de ensino com gestão dos trabalhadores e estudantes e controle da população, além de impor o fim do vestibular em todas as universidades. Devemos defender que o financiamento do transporte e da educação públicos dignos e de qualidade devem ser garantidos com o não pagamento da dívida pública e com impostos progressivos aos capitalistas. Esse programa deveria ser levado com toda a força já nas chamadas calouradas que se iniciam nas próximas semanas em várias universidades do país.
Para tirar as lições necessárias de junho e garantir que o movimento forje uma direção democrática que unifique os mais amplos setores e seja enraizada na base devemos batalhar por assembleias nos locais de trabalho e de estudo que debatam os rumos do movimento elejam representantes revogáveis para compor um comitê de luta contra as injustiças da Copa baseado na auto-organização de trabalhadores e estudantes.
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