Na última quarta-feira, 07 de maio, cerca de 150 pessoas participaram do lançamento da compilação de escritos de Leon Trotski sobre a Revolução Espanhola no auditório da Geografia da USP. A mesa contou com a participação de Antonio Quiozini pelas Edições Iskra e Elisabeth Yang pelo Centro de Estudios, Investigaciones y Publicaciones León Trotsky da Argentina.
Antonio abriu o debate agradecendo a colaboração do CEIP e da Museo Casa León Trotsky do México e ressaltou a importância histórica do processo revolucionário espanhol: “O próprio título desta edição já é um pequeno combate ideológico, pois desde a tese acadêmica mais ‘refinada’ até os livros didáticos, se fala de Guerra Civil Espanhola, mas nunca de Revolução Espanhola... uma clara manobra ideológica que tenta apagar os grandes “feitos” da classe trabalhadora e das massas oprimidas espanholas, tentando resumir o conflito à luta entre um campo fascista e outro ‘democrático’”.
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A partir daí, abordou as grandes conquistas do heróico proletariado espanhol, quando esse iniciou a luta contra o general Franco, em julho de 1936: “Estamos frente uma revolução em que os operários quebraram ao meio o Estado capitalista, dissolvendo a polícia e o restante das forças repressivas, instaurando o povo em armas em mais da metade da Espanha; criaram seus próprios organismos de poder (comitês, milícias operárias) e organizaram a maior experiência de auto-gestão e coletivização econômica da Europa Ocidental. Uma revolução que se chocou frontalmente com os poderes e privilégios da Igreja (a maior proprietária de terra do país) e que não por acaso, uma revolução que teve um protagonismo das mulheres trabalhadoras, já que eram as que mais sofriam com a opressão do clero mais poderoso e reacionário da Europa”.
Em combate a visão predominante nos meios intelectuais, que enxergam a década de 1930 como “reacionária em toda linha”, ressaltou: “Os reflexos internacionais da Revolução Espanhola foram também poderosos: despertou a atenção apaixonada dos trabalhadores de todo mundo. Os combates do proletariado espanhol foram o principal golpe contra o nazi-fascismo e sua vitória teria sido um luminoso farol para o proletariado alemão e italiano. Não ã toa Hitler e Mussolini apoiavam Franco antes mesmo do golpe. Umas das revoluções operárias mais importantes do século XX, em que o proletariado espanhol, como dizia Trotski, ‘por seu peso específico na economia do país, por seu nível cultural e político, se encon-trava, desde o começo da revolução, muito ã frente do proletariado russo no início de 1917’. Uma revolução que poderia ter mudado a história do século XX, a grande oportunidade de deter a marcha do fascismo e da Segunda Guerra Mundial, abrindo novamente o cenário para a revolução socialista mundial como em 1917”.
O proletariado espanhol, porém, fez tudo isso contra a vontade de suas principais direções, que reconstruíram pedaço por pedaço do Estado capitalista destroçado. O Partido Socialista, Partido Comunista, CNT anarquista e o próprio POUM atuaram na contramão dos interesses dos trabalhadores, paralisando sua iniciativa e atacando suas conquistas ao dissolver os comitês, desarmar as milícias e reprimir as coletivizações, levando não só a derrota na revolução mas também da guerra civil contra Franco. Elisabeth Yang iniciou sua fala resgatando um pouco da história do CEIP que surgiu década de 1990, no auge do neoliberalismo e da ofensiva ideológica contra o marxismo, ressaltando a importância de trazer para as novas gerações a rica experiência acumulada do passado.
Abordou no início da sua fala os efeitos da Revolução Espanhola para a URSS: “Após o final da Primeira Guerra Mundial e da vaga revolucionária aberta pela Revolução de 1917, que se estende até 1923, se inicia um período que Trotski chama de “equilíbrio capitalista” e que só vai terminar com o início da crise econômica de 1929. O surgimento do stalinismo, fruto do isolamento da URSS, estava diretamente ligado a este fenômeno e a eclosão da Revolução Espanhola em 1930 era a grande oportunidade de extirpar com essa casta burocrática. A Espanha, portanto, aparece como um grande problema para o stalinismo, pois nos primeiros anos da revolução os operários russos já faziam coletas de apoio ã Espanha por cima da própria burocracia e uma vitória dos operários espanhóis golpearia profundamente seu prestígio e seus acordos com a burguesia imperialista”.
Elisabeth elencou as políticas e iniciativas de Trotski para conformar um partido revolucionário a partir da Oposição de Esquerda espanhola e demonstrou como Trotski não teve uma política sectária com Andrés Nin:
“Trotski propôs duas táticas: a primeira, de unidade das fileiras comunistas e a segunda de entrismo no Partido Socialista, para que a Oposição pudesse confluir com a valorosa juventude desse partido, que carregava retratos de Lênin e Trotski nas manifestações e reivindicava a necessidade de construir uma nova Internacional. Nin rejeitou as duas propostas, qualificando a ultima como oportunista”. E continuou: “A política ‘principista’ de Nin levaria pouco tempo depois ã fusão oportunista da Oposição com o grupo catalào de Maurín para a formação do POUM. Poucos meses depois esse partido assinava o programa burguês da Frente Popular e após as jornadas revolucionárias de junho de 1936, entrava diretamente em um governo de aliança com a burguesia na Catalunha”.
A historiografia oficial fala que o “campo republicano” perdeu por falta de armas. “Franco tinha apoio de Hitler e Mussolini, enquanto a República estava isolada”. Vimos, porém, que a derrota não foi militar, mas política. Uma política que tinha nome e sobrenome: frente popular. Subordinou os interesses do proletariado ã burguesia e enterrou a revolução.
Faltou um partido revolucionário, que pudesse mobilizar a vanguarda operária contra as direções conciliadoras e consolidar as conquistas revolucionárias, como fez o Partido Bolchevique em 1917. Esperamos que esta edição contribua para desconstruir uma série de “mitos” históricos, e o principal, abrir um debate no seio da vanguarda de trabalhadores e de jovens que se levantam em nosso país nesse momento sobre a necessidade de construir um partido revolucionário a nível nacional e internacional: ferramenta que faltou ao proletariado espanhol, tarefa candente para vencermos os patrões, seu Estado e seus agentes dentro no movimento operário.
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