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Após 53 anos, Estados Unidos recomeça relações diplomáticas com Cuba
por : Diego Dalai

18 Dec 2014 | Em um discurso nacional, o presidente norte-americano Barack Obama anunciou pessoalmente o fim da política que Washington manteve em relação a Cuba durante os últimos 50 anos, baseada na intenção de desestabilizar o regime castrista por meio do embargo econômico e isolamento diplomático, entre outras formas de hostilidades. Os motivos desta “nova era” (...)
Após 53 anos, Estados Unidos recomeça relações diplomáticas com Cuba

Em um discurso nacional, o presidente norte-americano Barack Obama anunciou pessoalmente o fim da política que Washington manteve em relação a Cuba durante os últimos 50 anos, baseada na intenção de desestabilizar o regime castrista por meio do embargo econômico e isolamento diplomático, entre outras formas de hostilidades. Os motivos desta “nova era” nas relações bilaterais.

Hoje anuncio o fim de uma política em relação ã Cuba que é obsoleta e que fracassou durante décadas (...). É tempo de suspender as âncoras do passado porque é necessário alcançar um futuro melhor para nossos interesses nacionais, para as pessoas que vivem nos Estados Unidos e para o povo cubano”, disse Obama. Também anunciou que tirariam Cuba da lista de países “promotores do terrorismo”, um obstáculo da era Bush que impede qualquer avanço nas relações políticas ou econômicas, e a abertura de uma embaixada na ilha (até hoje só existe um “escritório de interesses”). Assim, como soa, se trata de um novo posicionamento estratégico da Casa Branca que tenta capitalizar politicamente a abertura econômica promovida por Raul Castro, e não ficar fora do suculento negócio que implica para muitas empresas norte-americanas.

O discurso foi ovacionado por toda imprensa internacional e por todos os governos capitalistas dentro e fora do continente e coincidiu com o discurso do seu homologo cubano que reafirmou mais uma vez “nossa disposição a manter com o governo dos Estados Unidos um diálogo respeitoso” e confirmou que “concordamos com o restabelecimento das relações diplomáticas”.

Momentos antes do histórico anúncio de Obama, tinha acontecido o fato mais significativo do processo de “relaxamento” das relações que já tem quase um ano desde que Raul Castro e seu par norte-americano deram-se as mãos durante o funeral do líder negro Nelson Mandela: o governo cubano liberou o norte-americano Alan Gross, que estava preso na ilha por espionagem há 5 anos. A Casa Branca fez o mesmo com três cubanos que permaneciam detidos do famoso "grupo dos cinco", presos em 1998. Isto aconteceu junto com outros importantes gestos prévios de distensão, como o convite a Cuba para a próxima Cúpula das Américas, que acontece em Abril de 2015 e da qual esteve sempre excluída por mandato dos Estados Unidos.

Como relata a imprensa internacional, estamos vendo um giro histórico na relação bilateral desde que, devido a Revolução de 1959, os Estados Unidos romperam relações diplomáticas e impuseram ã ilha um dos mais longos bloqueios econômicos da história moderna.

Com exceção de um curto período de relativa distensão durante o governo de Carter (1977-1981), a relação sempre foi ríspida e cheia de ameaças e sanções, com anos de especial tensão como nos anos ’60 e ’70 quando Cuba era um dos principais cenários da Guerra Fria, ou durante os anos ’90 quando os Estados Unidos aprovaram a lei Helms-Burton, que reforçou criminalmente o bloqueio econômico no meio de uma queda da economia local por causa do fim do bloco soviético.

Os interesses de Obama e de Castro

Desde que Barack Obama assumiu em 2009, com uma campanha eleitoral que prometia retomar a relação com Cuba, não se havia produzido mudanças significativas além da revisão de algumas das medidas mais conflitivas da era Bush, como aliviar o bloqueio sobre medicamentos e alimentos, ou flexibilizar os requisitos de viagens e envio de dinheiro para a ilha. Pelo contrário, a administração democrata seguia exigindo “mudanças reais” tanto no plano econômico (reformas de mercado) como no político (“democratização” do regime).

Por que agora, depois de mais de 50 anos se retomam as relações diplomáticas (e em perspectiva econômicas)? Os motivos da “nova era” que se abre respondem a interesses muito concretos de ambas partes. Obama, na última parte do seu mandato e tendo voltado a colocar o país, contra todas as suas promessas, na guerra no Oriente Médio, quer recuperar a iniciativa e a liderança política. Inclusive está aceitando de fato a estratégia da burocracia castrista que consiste em uma “via chinesa” de restauração capitalista mantendo o regime de partido único e a condução do Estado pela burocracia governante. Ao mesmo tempo, dá lugar as crescentes pressões de diversos grupos empresários que já têm ã mão importantes negócios para fazer na ilha, sobretudo em relação a exportação de alimentos mas também em investimentos diretos nas mais distintas áreas. Também pesou bastante o fato de que o outrora decisivo “lobby anti-cubano” com base em Miami hoje se encontra muito debilitado. Segundo as pesquisas, mais de 50% da comunidade cubana desta cidade é contrária a que se mantenha o bloqueio.

Por sua vez, Raul Castro vem impulsionando há anos uma série de reformas estruturais na economia orientadas a atrair capitais estrangeiros, desligar o Estado da maior parte das empresas e ramos econômicos fundamentais (com exceção somente da saúde, educação e segurança), despedir mais de 1 milhão de trabalhadores e reduzir fortemente o gasto social como expressa o aumento em cinco anos da idade para aposentadoria.

Esta aposta em sair do estancamento econômico lançando ajustes sobre os trabalhadores, e promovendo o trabalho por conta própria, que se triplicou em apenas 2 anos, serviu somente para evitar uma catástrofe. A política de promover o investimento externo outorgando grandes facilidades e benefícios a empresas e transnacionais, cujo grande marco é a recentemente aprovada Lei de Investimentos Estrangeiros e o mega projeto de reconversão do porto El Mariel, ainda não deu os resultados esperados. Os investimentos se mantêm a um nível baixo apesar do enorme apoio político que os governos capitalistas de todo o mundo tem dado as reformas, incluindo o perdão de grande parte da sua dívida externa.

Para piorar, seu maior sócio econômico, a Venezuela, que desde 2002 vem financiando 50% do consumo de petróleo da ilha e contrata dezenas de milhares de médicos e docentes cubanos, atravessa uma profunda crise econômica de mãos dadas ã abrupta queda do preço do petróleo nos últimos meses. Isso põe em sério perigo esta ajuda fundamental sem a qual a economia cubana viria abaixo. Mesmo que ainda não se haja materializado, o risco é real e de fato o governo de Maduro necessitando de divisas, se desprendeu recentemente da dívida externa da República Dominicana, um dos sócios da Petrocaribe, a aliança caribenha que Chávez fundou em 2005 e da qual Cuba é peça chave. São estas “nuvens de tempestade”, que não prometem desvanecer, que apressam Castro a conseguir novos sócios e investidores.

Por isso em seu discurso, insistiu em que os Estados Unidos derrube o bloqueio, e até respondeu as desculpas que Obama dá para seguir mantendo-o, sob o pretexto de que necessita aprovação do Congresso.

Um acordo para consumar a restauração capitalista

Os grandes meios de comunicação e políticos capitalistas de todo o mundo ovacionaram o histórico acordo entre os governos de ambos países. Exigimos a imediata anulação do bloqueio criminoso imperialista contra Cuba e reivindicamos o direito da mesma a negociar soberanamente. Mas o que todos escondem, começando pela burocracia castrista que busca se reciclar como nova classe capitalista, é que este acordo, agilizado e abençoado pela Igreja Católica, é a porta de entrada para a consumação da restauração capitalista que vem preparando “sem pressa, porém sem pausa” o governo de Raul com o aval explícito de Fidel desde seu retiro político.

Escondem deliberadamente as consequências desastrosas que vai ter para a maioria trabalhadora, a entrada massiva do capital imperialista. Muito além de que possa gerar em um primeiro momento uma breve e relativa melhora nas condições de vida de alguns setores, os capitais irão espoliar ao país e explorar a qualificada (e muito barata, se medida em dólares) mão de obra local. Escondem que os grandes burocratas no governo que dirigem as principais empresas do país e controlam o comercio exterior, se associam ao capital transnacional. Estes mesmos capitais que em toda a América Latina sistematicamente jogam nossos povos na miséria, saqueiam nossos recursos naturais e espoliam com impagáveis e fraudulentas dívidas externas.

Nada progressista virá da mão dos capitalistas, da burocracia castrista ou da Igreja Católica para o heroico povo cubano, que protagonizou a primeira revolução socialista do continente, e resistiu durante décadas as piores condições produto da opressão imperialista e da planificação burocrática da direção castrista.

Cuba só pode se beneficiar de uma nova revolução que expulse a burocracia e instaure um verdadeiro governo dos trabalhadores e do povo.

 

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