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Lições da greve dos operários da Volks

23/01/2015

Lições da greve dos operários da Volks

"A força dos operários da Volks conseguiu reverter as 800 demissões na planta de São Bernardo do Campo, o que significa não somente uma vitória mas um grito de resistência que certamente chegará em amplos setores da classe operária industrial do nosso país frente aos ataques que já estão vindo. Ao mesmo tempo, esta força operária somente poderá se desenvolver até o final se os trabalhadores, fazendo experiência com suas direções sindicais, puderem concluir as contradições presentes neste mesmo acordo e os limites que a própria direção do Sindicato impõe para impedir o surgimento de uma nova vanguarda operária que tome o destino de suas vidas em suas próprias mãos. Neste balanço buscaremos analisar a partir da situação nacional o resultado da greve da Volks e suas lições para contribuir na luta dos operários industriais do ABC e de todo o país".

Os 10 dias de greve dos operários da Volkswagen contra a tentativa de demissão de 800 trabalhadores têm uma enorme importância não só para o proletariado brasileiro, mas também para a classe trabalhadora latino-americana e internacional. O que se colocou em jogo nessa greve foi como os trabalhadores de concentrações industriais de grande magnitude vão responder ás tentativas da patronal de descarregar sobre suas costas o ônus da crise econômica mundial, que nos últimos anos vem se instalando de forma cada vez mais acentuada na América do Sul.

Durante o ano passado todo houve diversas movimentações nas montadoras, onde em acordo com o sindicato da categoria, governo e patronal aprovaram diversos planos para responder a queda nas vendas de veículos em relação aos anos anteriores, reduzindo a produção em cerca de 15,3% em relação ao ano anterior. Foram negociadas, redução da semana para 4 dias com geração de banco de horas, férias coletivas, lay-off (suspenção de contrato), além do PDV (Programa de Demissão Voluntária). Somente na Mercedes Benz, também em São Bernardo, durante o ano passado foram cerca de 1.000 demissões. Se nas montadoras a situação parece difícil, no setor de autopeças a conjuntura é muito mais grave. Somente no setor de autopeças plásticas foram cerca de 14 mil desligamentos somente durante o ano de 2014. Só na região do grande ABC, em toda cadeia automotiva houve redução de cerca de 20.550 postos de trabalho.

Frente a crise, as indústrias de automóveis pretendem fazer adequações na produção para manter as altas taxas de lucro que obtiveram nos últimos anos, assim vão tentar implementar ajustes para aumentar a exploração dos trabalhadores. A greve dos operários da Volks foi a primeira demonstração de forças de um dos setores mais concentrados do proletariado latino-americano.

O pacto lulista na berlinda e a disposição de resistência dos trabalhadores

O ano mal se iniciou e Dilma que afirmou que não teriam ajustes “nem que a vaca tussa” anunciou medidas provisórias de ataques aos direitos dos trabalhadores, restringindo e aumentando os requisitos para o seguro desemprego, licença saúde, pensão por morte e outros direitos do trabalhador.

O sindicato, nos últimos anos atua totalmente ligado ao governo federal. Junto com Lula, Dilma e as patronais, firmaram um pacto de que todo ano os salários teriam 2 ou 3% de reajuste acima da inflação. No pacto, uma das cláusulas mais importantes estava ligada a isenção de impostos para as empresas, empréstimos do BNDES e redução do IPI para as montadoras, numa lógica de conciliação onde o principal estava no conceito de que “quando os patrões estão bem os trabalhadores também estão bem”. O problema é que esse pacto chegou ao limite e o governo não vai mais fazer sua parte.

Com o início da crise econômica mundial, a parte desse pacto que diz respeito ã indústria só pode se sustentar porque o governo passou a destinar enormes montantes de dinheiro público para as empresas através subsídios fiscais. Segundo o Estadão, de 2009 a 2014 as montadoras enviaram R$ 49,9 bilhões ao exterior; no mesmo período, o montante total de isenção fiscal que o governo destinou ã indústria automobilística foi de R$ 16,1 bilhões.

Em consonância com o término desses subsídios marcado para terminar em 31 de dezembro de 2014, no final desse ano a patronal da Volkswagen, em acordo com a burocracia petista que dirige o sindicato dos metalúrgicos do ABC, tentou acabar com os reajustes salariais acima da inflação propondo um novo acordo que substituía o montante que deveria ser reajustado conforme a inflação por abonos salariais no mesmo valor. Com essa medida, a patronal busca recompor em 100% a política neoliberal dos anos 90, em que os reajustes salariais foram substituídos por abonos de todo tipo (como por exemplo as chamadas PLR - Participações nos Lucros e Resultados). O resultado dessa política é a degradação do poder econômico e dos direitos dos trabalhadores, já que os abonos não são incorporados ao salário e nem tampouco a direitos como FGTS, férias e 13°, reduzindo em grande medida os custos da empresa.

A nova política de trocar reajuste por abono veio ligada a um novo Plano de Demissões Voluntárias com o objetivo de eliminar 2.100 postos de trabalho, que a patronal alega estarem excedentes em função da diminuição das vendas e da produção em 2014. Ou seja, a empresa precisava demitir, mas também usou as 800 demissões para chantegear os trabalhadores e fazer com que aceitassem o acordo que propunha.

Em assembleia realizada no dia 2 de dezembro, onde o sindicato defendeu a nova proposta da patronal, os operários da Volks rechaçaram essa política. Esse rechaço significou um giro ã esquerda na relação de forças interna da fábrica, mostrando claramente a disposição de resistência dos trabalhadores.

A vitória da luta contra as demissões não pode esconder os ataques contidos no acordo

Pará além do triunfo que foi a anulação das demissões, a principal mudança nesse acordo de fim de greve em relação ao que havia sido proposto no final de 2014, é que ele se estende até 2019, mantendo os salários congelados até 2017, e somente a partir desse ano, os trabalhadores terão aumento de 1% mais o INPC (Índice Nacional de Preço ao Consumidor), os trabalhadores receberão um abono anual sem incorporação no salário em 2015 e 2016, assim a Volks não precisará arcar com nenhum encargo trabalhista a mais sobre o salário, abono em troca de salário é um ataque que não existia até então.

Além disso, o novo acordo determina que a Volks só cumprirá sua parte caso a produção não seja inferior ã 250 mil automóveis por ano. Ou seja, a suposta “estabilidade” no emprego tão propagada pela direção do sindicato está condicionada a não haver uma crise econômica mais aguda no país, caso contrario serão centenas ou milhares de famílias na rua.

A direção do sindicato fez uma troca com a patronal, para conquistar o reajuste real a partir de 2017, permitiu a inclusão no acordo de fim de greve mais um ataque que não constava no acordo de dezembro: a suspenção de contratos de terceirizados para a realocação de efetivos. Ou seja, a demissão de terceirizados em troca da demissão de efetivos.

Além desses elementos novos no acordo de fim de greve, o mesmo reafirma medidas contrárias aos trabalhadores que já existiam nos acordos anteriores e que a burocracia sindical busca naturalizar. Por um lado, numa situação em que o aumento do custo de vida tem sido muito mais que 1% acima da inflação medida pelo INPC, os trabalhadores ficam com uma corda no pescoço para lutar por uma justa recomposição dos salários, por outro lado, os trabalhadores seguirão sofrendo pressões psicológicas de todo tipo para aderir aos PDVs de uma forma falsamente voluntária.

Essa “readequação” no corpo efetivo da fábrica com demissões massivas não é uma novidade na Volks e nas montadoras do ABC, há vinte anos atrás a planta de São Bernardo da Volks tinha 26 mil trabalhadores, hoje são 13 mil e de acordo com a empresa e referendado pelo sindicato são mais 2 mil trabalhadores excedentes.

Porque o PDV e o Lay Off favorecem somente a empresa?

O Lay Off é a suspensão do contrato de trabalho, com redução de salário por um tempo pré determinado, de no máximo de 5 meses. A suspensão do contrato serve para não demitir oficialmente, mas a empresa fica livre de recolher FGTS e o trabalhador fica sem direito a férias, 13° salário e PLR durante o período de vigência. Esse período também não entra na contagem para a aposentadoria. Além disso, a empresa paga uma parte do salário e o governo, a partir do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), paga um complemento. Quando esse período acaba e o trabalhador é finalmente demitido, ele não tem mais direito ao seguro desemprego, já que o governo entende que o trabalhador já usufruiu do benefício. Com os novos ajustes do governo, esse trabalhador só terá direito ao seguro desemprego novamente 18 meses depois que tiver a carteira assinada em outro emprego.

O PDV, que é vendido pela patronal e pelo sindicato como uma enorme vantagem ao trabalhador, esconde uma enorme pressão psicológica que a empresa faz sobre o trabalhador para que ele peça a demissão. Isso acontece em base a muito assedio aos trabalhadores, selecionados pela supervisão para aderir ao programa. Na Mercedes a salinha do PDV é conhecida e temida por vários trabalhadores, onde é dito ao trabalhador que é melhor aderir ao programa do que ser demitido sem o pacote. No ano passado o próprio sindicato que defende o PDV teve que fazer ato dentro da Mercedes contra o assedio da chefia para os trabalhadores aceitarem o programa.

Nas autopeças essas demissões pela via do PDV e Lay Off tem efeito cascata. Cada emprego perdido nas montadoras significa de 3 a 4 outros empregos na cadeia produtiva automotiva. Por isso ocorreu um numero tão alto de demissões na indústria no ano passado como comentamos acima.

Conciliação versus combate

Desde o início a burocracia construiu uma greve sob medida para substituir as demissões por mais PDVs e outras formas de flexibilização do poder econômico e dos direitos dos trabalhadores, como já havia feito na assembleia de 2 de dezembro. Além disso, o Sindicato dos Metalúrgicos tem atuado para dividir cada vez mais os trabalhadores por fábrica negociando cada demanda em separado, como propõe com ACE (Acordo Coletivo Espacial), a partir de uma discussão que em cada fábrica existe uma realidade. Assim, os trabalhadores seguirão pagando pela crise!

Para as lutas triunfarem e irem além de demandas mínimas, os trabalhadores têm que tomar as lutas em suas mãos e estabelecer uma verdadeira democracia operária, que parta de questionar o burocratismo do sindicato para estabelecer assembleias onde todos falem e expressem suas posições, com delegados votados em cada setor da produção, estabelecendo novas comissões internas independentes do governo e do patrão. Greves como a da Volks precisam ter um comando de delegados de base eleitos por áreas da fábrica, que mobilizem os milhares de trabalhadores diariamente para as ações e assumam para si a execução das medidas votadas em assembleia sendo os interlocutores das negociações com a patronal. Para de fato dobrar a vontade da patronal, a direção do sindicato dos metalúrgicos do ABC deveria ter convocado uma grande jornada nacional de ações em solidariedade aos demitidos, e unificado a greve contra as 800 demissões na Volks com a greve contra as 244 demissões na Mercedes. Nada disso foi feito. Não se apostou na mobilização independente dos trabalhadores e seus aliados explorados e oprimidos para reverter as demissões e impor ã patronal uma nova situação em que ela arcará com os custos da crise que gerou. Pelo contrário, a direção do sindicato buscou alimentar a passividade dos trabalhadores na greve enquanto buscava negociar novas formas de subsídio com o governo estadual e adequações no novo acordo proposto em dezembro com a patronal.

O programa para enfrentar a crise tem que avançar para o questionamento profundo aos lucros acumulados pelos mega empresários. Se empresa propõe PDV, a resposta dos trabalhadores deve ser abertura dos livros de contabilidade e redução da jornada sem redução de salario, com o custo bancado pelo acumulo de lucros, garantindo que todo o trabalho seja distribuído pelas mãos disponíveis e que nenhum trabalhador perca o emprego.

A patronal descarrega sua crise contando com a divisão de nossas fileiras: para manter os efetivos vai demitir os terceirizados! Não podemos aceitar essa divisão que fará com que nossos companheiros terceirizados que exercem funções fundamentais paguem primeiro pela crise dos empresários! A unidade entre efetivos e terceirizados é fundamental para podermos vencer contra a patronal!

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