Cúpula da FAO
Lucram com a fome de milhões
20/06/2008
A fome assola dezenas de países enquanto a inflação destrói os salários. Nesse marco, se realizou a Cúpula da FAO em Roma entre 03 e 05 de junho. Se deles depende, o pior está por vir. A única saída está nas mãos da classe operária e das massas pobres.
A FAO (Food and Agriculture Organization) é uma organização da ONU dedicada ã agricultura e ã alimentação para “Ajudar a construir um mundo sem fome”. Sua Cúpula em Roma reuniu dezenas de presidentes, chefes de Estado e ministros, junto a funcionários de primeira linha de organizações tão benéficas como o Banco Mundial. Também esteve presente o Papa Ratzinger. O edifício onde se realizaram as sessões, esteve blindado por milhares de policiais, que aportaram ao evento a cota repressiva correspondente. Também foram figuras destacadas como Cristina Kirchener e Lula da Silva.
Foi convocada frente ã tremenda crise alimentícia e os estouros da fome em dezenas de países em todo o mundo, desatada pela enorme inflação que afeta as chamadas comoditties que são fundamentalmente os combustíveis, matérias primas e alimentos. No caso dos primeiros, em apenas 3 anos o barril de petróleo disparou de 44 para 130 dólares (mais de 200%). O impacto deste produto pilar da economia mundial, tem sido enorme ao encarecer a produção e os fretes. No mesmo período, os alimentos aumentaram de conjunto 83%. Entre eles, os produtos que são a base alimentícia de centenas de milhões de habitantes em todo o mundo, são os que mais aumentaram: o arroz, milho e trigo aumentaram em 180% no mesmo período. Segundo a própria FAO, mais de 37 países estão em risco de instabilidade social pela escassez de alimentos, com mais de 800 milhões de pessoas sofrendo este flagelo.
As verdadeiras causas da fome
Esta é a manifestação concreta da saúde ruim da economia mundial: uma forte pressão inflacionária gerada fundamentalmente pela mudança de importantes massas de capital especulativo aos mercados a futuros (se compram stocks de forma antecipada) de comodities que funcionam como uma bolha elevando os preços de grãos e combustíveis, e os lucros dos capitalistas.
Tanto é assim que hoje os setores imperialistas do agro e dos alimentos, estão ganhando mais do que nunca, enquanto a fome e a inflação assolam o mundo. Em relação ã crise alimentícia, os lucros de Monsanto aumentaram 100%. Os da Cargill 86%, e assim se poderia seguir. A isto há que somar a forte pressão que está gerando a produção dos agro-combustíveis. Ainda que o “progressista” Lula se empenhou em negá-lo, é um fato que o aumento exponencial de sua produção, converteu-se em outro motor do aumento dos preços dos alimentos. Hoje, em muitos é mais rentável destinar milho para produzir etanol, que a alimentar ã população. Em 2007, EUA desviou 54 milhões de toneladas para produzir o combustível “verde”. Este ano, essa cifra vai aumentar para 76 e o que vem superará os 100 milhões. O aumento da tortilla no México, base alimentícia de dezenas de milhões nesse país, esteve diretamente vinculado a esta situação.
A resposta da FAO
Frente a alarmante realidade da fome, na Cúpula foram várias as “denúncias” e “críticas” ao terrível flagelo que caiu sobre milhões, assim como os “pedidos de ajuda”. Mas quando vamos ás soluções que estes senhores e senhoras têm tomado para resolver a crise, todos seus discursos não “alimentam” mais que o cinismo e a hipocrisia de sua parte, e a nossa raiva.
Entre as resoluções estão “Aumentar a produção de alimentos” e “eliminar as travas do comércio internacional”. Ambas as coisas não farão senão aumentar o problema da fome, somar um grande impacto ecológico pela extensão da fronteira agrícola sobre bosques e selvas, e aumentar ainda mais os lucros dos grandes monopólios do agro. Ainda que o aumento da demanda chinesa e de outros países tem sido muito grande, não é certo que a atual situação se deva a uma “crise de oferta”, a uma impossibilidade de satisfazer a demanda alimentícia. Nos últimos 30 anos a produção mundial triplicou enquanto a população só dobrou. Hoje se produz em nível global 17% mais de calorias que naquele então, apesar do aumento populacional. O problema é que cada vez se necessita mais dinheiro para adquiri-los e os pobres se vêm obrigados a consumir menos.
Isto também é conseqüência da crescente concentração monopólica. Hoje em dia, 5 gigantes mundiais do “agrobusiness” concentram 80% do mercado de alimentos e recebem multimilionários subsídios estatais ianques e europeus. Assim, se tende a arruinar as produções locais de grãos de pequenos produtores nos países da América Latina ou África, que se vêm obrigados a aceitar os termos e condições daqueles conglomerados sedentos de maiores lucros.
Neste marco, o discurso de Ban ki-Moon de que “há que elevar a produção global uns 50% para 2050” se volta uma desculpa para impulsionar a “modernização” da exploração agrária de centenas de milhares no mundo, que não significa outra coisa que transformar a esses pequenos produtores em reféns dos grandes monopólios que controlam as sementes, agro químicos e métodos produtivos (por demais contaminantes) e que lhes imporão preços e condições. Isto apesar de que em alguns lugares e setores estejam se beneficiando conjunturalmente dos altos preços como ocorre na Argentina. No mesmo sentido vão os chamados a liberar as restrições ao “comercio internacional”. Trata-se de que países produtores de alimentos passem a depender dos monopólios, como já ocorreu durante a ofensiva neoliberal dos anos 90 no Haiti ou Ruanda.
A única saída está nas mãos da classe trabalhadora
Finalmente, o documento saído da Cúpula não constituiu um compromisso para nada, já que como vimos não estão interessados em resolver o problema, senão em aproveitar a crise para aumentar os lucros capitalistas. Ademais, se fecharam as diferenças entre os países imperialistas junto com Brasil, que não aceitaram nenhuma responsabilidade da fervente produção de agro-combustíveis na crise alimentícia, e alguns outros países produtores de alimentos. Tanto EUA como a União Européia se negaram a qualquer menção na declaração final aos multimilionários subsídios que outorgam a seus produtores e que impedem que as produções dos países pobres sejam competitivas. Por sua parte, a Argentina não podia aceitar uma declaração que incluísse as “restrições” ao comércio, o que podia interpretar-se como contraria ã política local de retenções ás exportações.
Só a classe operária junto aos camponeses pobres e os milhões de operários rurais, podem dar uma saída progressiva ã crise. Nos centros imperialistas como EUA e Europa, há que expropriar aos grandes monopólios do agrobusiness. Nos países de alimentos como Argentina, expropriar aos latifundiários e repartir a terra entre os pequenos camponeses pobres que lá trabalham, e arrebatar o negócio da comercialização ás multinacionais imperialistas estabelecendo o monopólio do comércio exterior. Só sobre essa base, atacando os interesses dos capitalistas nacionais e estrangeiros, se pode planificar a produção e distribuição dos alimentos e colocá-las ao serviço das grandes massas em todo o mundo.
Traduzido por: Miriam Rouco