Brasil
Os direitos democráticos, o Estado capitalista e a luta por um governo operário e popular
23/04/2013
Por Francisco Pontes, Leandro Ventura
Nos últimos meses, diversas mobilizações por todo o país se desenvolvem pela renúncia de Marco Feliciano (PSC-SP). Feliciano ocupa esse cargo atualmente pela divisão de poderes na base aliada do governo Dilma. Além de milhares nas ruas, o debate atinge uma ampla camada da população em seus locais de trabalho, estudo, redes sociais e igrejas. Questões como o direito ao aborto e o machismo, o racismo e as cotas universitárias, a homofobia e os direitos LGBTTIs, tomam as rodas de conversa do dia-a-dia.
Por um estado laico sem a influência de qualquer Igreja
Não vivemos em um Estado laico de fato. Feliciano é a expressão de uma bancada evangélica, aliada fundamental de Dilma, que busca manter os interesses de grandes empresários da religião que lucram muitíssimo com suas grandes Igrejas, concessões de TV e rádios, e buscam com seu peso retirar ou impedir que se conquiste mínimos direitos democráticos, incitando a divisão dos trabalhadores com conservadorismo e preconceito.
A discussão em questão se trata da necessidade elementar de um estado laico. E por isso, esse debate que se inicia na luta contra Feliciano não pode ficar restrito a ele. É preciso denunciar o que parte da grande mídia, o governo e o PT escondem: a Igreja mais favorecida pelo Estado brasileiro, que lucra milhões em nosso país historicamente com isenções de impostos, doação de terrenos desde os tempos da escravidão, e que mantém seus crucifixos ilegalmente no Congresso Nacional e demais instituições dos poderes estatais, em milhares de escolas e hospitais, é a Igreja Católica e o Vaticano. É histórica a relação da Igreja Católica com o Estado e os regimes, incluindo as ditaduras cívico-militares (Estado Novo e o Golpe de 1964).
Respeitamos a religiosidade de cada pessoa. Defendemos a tradição revolucionária exposta por Lenin em “Socialismo e Religião”: “exigimos que a religião torne-se um assunto privado em relação ao Estado [...]. O Estado não deve manter conluio com a religião, e as entidades religiosas não devem ligar-se ao poder estatal. Cada um deve ser absolutamente livre para professar qualquer religião ou para não reconhecer nenhuma, isto é, para ser ateu, como todo socialista geralmente é. São absolutamente inadmissíveis quaisquer diferenças entre os cidadãos quanto a seus direitos conforme suas crenças religiosas. Deve ser totalmente eliminada até mesmo qualquer referência ã religião dos cidadãos em documentos oficiais. Não deve haver qualquer subvenção a uma igreja estatal nem qualquer subvenção financeira do Estado as sociedades eclesiásticas e religiosas, que devem tornar-se associações de cidadãos absolutamente livres e independentes das autoridades.”
O Estado deve ser laico, separado das igrejas e religiões. Os que desejem ter suas religiões e escolas religiosas que o façam ás próprias custas. No Brasil, todos os governos, incluindo Lula e Dilma, fizeram alianças com a Igreja católica e os evangélicos, concedendo favores de todo tipo, incluindo concessões de rádios e TVs, com o objetivo de fazer coligações eleitorais. Desde o primeiro mandato Lula incorporou como vice o empresário José Alencar e seu partido que era reduto da Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo e Marcelo Crivella.
As instituições religiosas dominantes são autoritárias por natureza, pois buscam impor “sua moral” e “costumes” a todos os cidadãos. E não apenas pelas “palavras”, mas também por métodos de perseguição e ataques físicos, as instituições cristãs – católicos, evangélicos, pentecostais etc. – perseguem as religiões que não comungam com suas ideias, como temos visto até hoje nos ataques aos terreiros de candomblé e umbanda.
As cúpulas religiosas são grandes inimigos de direitos elementares como o direito ã educação sexual, ao uso de contraceptivos, contribuindo com sua hipocrisia para que milhares de jovens contraiam DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis) e milhares de mulheres acabem morrendo por realizar abortos clandestinos. Diante das reacionárias atitudes da cúpula católica e evangélica contra os direitos democráticos das mulheres, negros e demais oprimidos, Lula, Dilma e a “nata” petista se calam. Para conquistar qualquer mínima demanda democrática das mulheres, e dos LGBTTIs precisaremos primeiro derrubar o veto das igrejas, unificando todos os movimentos democráticos também para combater as instituições do Estado e os partidos da ordem (PT e seus aliados, assim como a oposição de direita do PSDB, DEM, PPS etc.).
A oligarquia segue viva com o Senado
As milhões de assinaturas organizadas contra Renan são uma clara demonstração do desgaste dessa instituição falida e arcaica chamada Senado. Renan Calheiros(PMDB), aliado de Dilma, é um grande exemplo da impunidade dos políticos corruptos desse país e por isso tamanho rechaço. A luta contra ele e Feliciano mostram a politização que vem se desenvolvendo em nossa juventude nos últimos anos, que não segue mais calada frente a tanta podridão dessa democracia dos ricos. Depois do mensalào e tantos escândalos, em um país em que os políticos possuem os salários mais altos do mundo, todos os partidos da ordem, com clareza do desgaste de nosso regime político, vêm debatendo uma reforma política com insignificantes mudanças para maquiar os “três poderes”, mantendo bem protegidos os interesses dos grandes grupos econômicos em Brasília, assembléias estaduais, câmaras municipais e órgãos da justiça.
Em nossa opinião, não é possível um Senado “limpo”, “coerente” ou “ético” como propõe o senador Randolfe e o PSOL. Trata-se de uma instituição que serve para a manutenção de poderes entre as distintas oligarquias, que representa os interesses dos grandes capitalistas e latifundiários de cada estado e região. O Senado é uma instituição destinada a barrar qualquer proposta progressista contrária aos interesses dos grandes capitalistas e latifundiários nacionais e estrangeiros que por ventura passe pela corrupta e antipopular Câmara dos Deputados, que apesar de seu caráter burguês e antidemocrático ainda pode sofrer pressões políticas.
Por uma câmara única, que um deputado ganhe igual a um professor!
Vivemos ainda em um Estado com resquícios da monarquia, com um Senado voltado a oligarcas, com grandes privilégios da Igreja, com uma polícia oriunda da ditadura. Para se enfrentar com tudo isso, com uma bancada de 273 empresários entre o Congresso e Senado, é preciso garantir o mínimo direito democrático para que os trabalhadores, os sem-terra, os sindicatos possam ter seus próprios partidos, sem as atuais barreiras anti-democráticas que não permitem a criação de novos partidos operários e populares.
É por isso que defendemos o fim do Senado, e a constituição de uma Câmara Única, com deputados votados proporcionalmente em todo o país de acordo com a proporção populacional, com mandatos revogáveis (os parlamentares se protegem como uma máfia e não cassam seus “pares”). Mas também vivemos em um país cujo Congresso é formado por 594 deputados e senadores que custam ao país R$ 8,5 bilhões (2013). Enquanto os governantes dizem não haver recursos para educação pública, saúde, transporte, moradia, saneamento básico e cultura, o mesmo que o orçamento de Belo Horizonte (MG), uma cidade 2,4 milhões de habitantes . De outro lado, os professores da rede pública entram em luta nesse momento por todo o país já que os distintos partidos da ordem, do PSDB ao PT, desrespeitam as leis e não cumprem a lei do piso (R$ 1451) para uma jornada de 40 horas semanais, e muito menos a Constituição, que prevê o salário mínimo do Dieese (R$ 2.450) para todo trabalhador.
Basta de salários astronômicos: que um deputado receba o mesmo que um professor da rede pública, e seu mandato seja de fato revogável, garantindo assim que nossa representação não se dê a cada 4 anos, com supostos representantes que não temos controle e que governam para os interesses dos grandes empresários, latifundiários e rentistas.
É preciso dar um basta a Feliciano e Renan, aliados de Dilma e do PT,que são apenas “alguns” da casta de políticos profissionais que vivem ás custas do trabalho e suor das massas, representando os interesses capitalistas e não a “vontade popular”. Porém, como socialistas revolucionários sabemos que não basta “trocar” esses parasitas. É fundamental defender os direitos de todos os oprimidos e lutar pelas reivindicações democráticas radicais: eleição por sufrágio universal e diretamente proporcional, salário de parlamentares igual ao de um professor, revogabilidade dos mandatos de parlamentares, juízes e funcionários do Estado, dissolução do Senado e instituição de uma Câmara Única que concentre os poderes executivos e legislativos, com a abolição do executivo – presidência – que concentra na mão de apenas uma figura poderes incontroláveis, assim como a eleição e revogabilidade de juízes, tribunais de júri popular para todos os crimes etc. Mas a luta por esse programa só pode ser travada consequentemente pela ação independente da classe operária através dos métodos da luta de classes, colocando-se como um sujeito político independente da burguesia.