Argentina - E a Petrobrás é modelo do que?
Sobre a “expropriação” argentina do Petróleo
29/04/2012
Por Leandro Ventura
Como entender a nacionalização da REPSOL-YPF na Argentina e que fazer no Brasil para que os povos na América Latina efetivamente controlem suas riquezas naturais?
A “nacionalização” dos ativos da REPSOL na Argentina tanto da REPSOL-YPF como da YPF-Gás gerou bastante debate na mídia e nos meios eletrônicos no Brasil. Não é para menos. Esta medida do governo argentino de Cristina Fernandez de Kirchner despertou intensa batalha verbal e diplomática entre este país e o imperialismo espanhol, e não estão descartadas diversas medidas de retaliação seguindo as declarações espanholas, de setores do establishment norte-americano como o Washington Post (que pediu a expulsão da Argentina do G-20) e de governos latino-americanos capachos dos imperialismos como México, Colômbia e Chile que se opuseram ã medida argentina. Estas medidas despertam um debate que por hora é mais rico nos altos círculos da burguesia e Estado brasileiro do que no movimento operário e em setores das massas, mas é de viva importância tanto conjuntural como estrategicamente para os trabalhadores.
As medidas argentinas remetem a questionar quanto dos recursos naturais cada país efetivamente controla – incluindo o Brasil – se há uma estratégia burguesa para emergir e minimamente atender a necessidades básicas da população e se estas opções burguesas passariam pelo respeito absoluto ás regras do mercado mundial como faz o Brasil ou se passaria por outros caminhos. Se os negócios do Estado brasileiro e de diversos monopólios nativos, incluindo a Petrobrás estariam seguros no vizinho austral, e ainda este debate também abre uma série de interrogações sobre que impactos e respingos teria no Mercosul e na próprio posicionamento estratégico que a burguesia brasileira procura ter no mundo, a partir de sua posição de principal ator continental.
Contra a espoliação imperialista dos recursos naturais de todos povos irmãos e todos povos oprimidos
A primeira certeza que é preciso ter nesta questão é posicionar-se firme e fortemente contra o imperialismo espanhol e todos outros imperialismos que fazem apelos cínicos e hipócritas de “respeito ás leis internacionais”. Os mesmos imperialismos espanhóis e norte-americanos que invadiram, mataram e saquearam o Iraque sem nenhuma aprovação “das leis internacionais” querem agora pagar de bons-moços e respeitadores das leis internacionais. Apesar de tudo quanto é lei internacional de descolonização estes mesmos imperialismos mantém enclaves coloniais como Guantánamo em Cuba, Porto Rico e Guam pelos EUA e Ceuta e Melilla, em Marrocos, pelo Estado Espanhol. Ficam indignados que o preço a ser pago pela expropriação não seja os mais de US$ 10 bilhões que pede a Repsol, mas um valor que uma corte argentina determine. Quando não é o que seu apetite voraz determina, as leis locais e internacionais, suas cortes, não importam.
Respeitam as leis tão e somente enquanto sejam interessantes a seus interesses de saqueadores. É exatamente isto que está em jogo. A medida do governo argentino frente ao imperialismo espanhol – mesmo efetuando uma indenização – ataca justamente seu direito de espoliar, a seu prazer, os recursos do subsolo argentino.
O mesmo governo argentino que permite que bancos internacionais saqueiem riquezas do povo argentino, que sejam realizadas os concomitantes saque e destruição ambiental em mega-projetos de mineração sob controle de empresas imperialistas, denuncia como era altamente predatória a atividade desta empresa espanhola. Esta empresa não investia o suficiente para buscar novas reservas e assim sugava petróleo esgotando os recursos do país e sem investir em refino tornava a Argentina dependente de remeter ano a ano mais recursos ao exterior para comprar derivados de petróleo necessários para abastecer sua população.
Os objetivos e limites da medida de CFK
A medida do governo Argentino contra esta empresa não devemos tomar como uma medida de um nacionalismo verdadeiro e dista quilômetros de uma efetiva nacionalização como a realizada por Cárdenas no México nos anos 30 que foi base de uma completa transformação da base industrial e de toda a economia nacional. É uma medida defensiva frente a espoliação que esta empresa realizava e também está motivada por crises políticas internas. Como diz o camarada Fernando Rosso, de nossa organização irmã, o Partido dos Trabalhadores Socialistas da Argentina:
“Os motivos deste giro não há que busca-los em alguma pretensão “nacionalista” ou de “soberania”. O impulso do governo se deve, por um lado ao grave déficit energético depois de décadas de saque e, por outro, a perda crescente de hegemonia política, somada ã crise de sucessão frente a impossibilidade de reeleição de Cristina.” (Discurso e Realidade do “giro” do governo, publicado em La Verdad Obrera, n.471, disponível em www.pts.org.ar)
Na medida em que expropria uma empresa imperialista e é uma medida defensiva frente ao saque adicional de recursos que o déficit energético do país produzia (tendo que importar derivados e, portanto, retirando divisas da Argentina, da ordem de mais de US$ 10 bilhões). Lutamos contra o saque imperialista e todos seus aliados locais defensores da “lei internacional” de espoliação dos povos. Porém não esquecemos os limites desta medida e como liga-se fortemente ao que o PTS descreve como um “bonapartismo fiscal” dos governos K. Agora em crise, em uma busca desesperada por recursos contra esta imensa evasão de divisas produzida pelo saque imperialista e garantida em todos os últimos anos dos governo Kirchner que avalizaram as petroleiras.
Esta medida de “nacionalização” goza de ampla simpatia popular, mas dista muito de uma efetiva transformação da base energética de nosso país vizinho e deixa intactos vários outros interesses tão ou mais espoliadores que a REPSOL. Como o artigo supracitado demonstra, serão expropriados somente os 51% pertencentes ã REPSOL na YPF deixando intactos os valores da família argentina amiga dos Kirchener, os Eskenazi (com 25%) e também os 17% que estão negociados nas bolsas e são controlados, sobretudo, por fundos de investimento ianques.
O próprio controle desta empresa que o governo argentino assumirá, além de continuar garantido parte substancial do botim aos capitalistas americanos e aos Eskenazi (bem ao sabor da Petrobrás que Cristina declara como modelo para a YPF, como desenvolveremos no final deste artigo) não afeta a parte do leão da produção de hidrocarbonetos no país vizinho. A YPF mesmo sendo líder do mercado representa somente 34% da produção. A partir destes 34% não se garante a soberania energética. Mesmo supondo, o que não é lícito supor, que estes 34% sejam organizados em outra base, sobram 66% organizados para a espoliação e concomitante déficit energético.
Sua “nacionalização” e a nossa
Ao ficarmos dentro do discurso imperialista ou do governo Cristina perde-se de vista a floresta detrás das árvores. Fica-se só com a REPSOL e perde-se todo o caos capitalista, do ponto de vista da soberania nacional, exploração do trabalho e meio-ambiente, que são todas as empresas petroleiras. Com medidas distintas, tanto os defensores da REPSOL como o governo argentino, ambos respeitam a propriedade privada. Ninguém coloca em questão se deveria ser feito um pagamento por esta expropriação. O debate é quão gorda será a mesma e quem determinará seu valor. No entanto, porque deveria ser realizado semelhante pagamento se a empresa distribuiu dividendos de US$ 14 bilhões de 1999 a 2011, valor superior ao que desembolsou na privatização?
A tímida nacionalização de Cristina coloca problemas, não os resolve. Para transformar uma empresa organizada para o saque em uma empresa que esteja a serviço dos interesses do povo argentino, começando por parar a drenagem de recursos aos imperialismos através do déficit energético é preciso investimentos e gestão. E aí justamente reside como estas medidas não podem ser tomadas pela burguesia em “situações normais”. Que investimentos realiza e que gestão ela faz, dista dos interesses dos trabalhadores petroleiros e do uso destes recursos a serviço da população.
O valor dos investimentos mostra a timidez da medida de Cristina. O próprio governo exigia da REPSOL-YPF investimentos da ordem de US$ 15 bilhões, de onde o governo argentino, que tem dificuldades desde 2001 em conseguir recursos externos –agravados pela “nacionalização” recente – poderia conseguir isto?
A primeira resposta dada foi buscar parceiros saqueadores – ministros argentinos tem se reunido com a Petrobrás, a francesa Total (que ficou com parte do leão do botim da Líbia após apoio de seu governo para derrubar Kadafi), a americana ExxonMobile e a chinesa Sinopec. Fora isto também tem se reunido com bancos.
Supondo o sucesso desta operação com parceiros saqueadores, virá este dinheiro sem condicionantes, sem ter que buscar uma rápida remuneração do capital? E esta remuneração não seria a partir de reproduzir o padrão de saque, onde se investe muito mais na exploração e extração de petróleo e gás natural (upstream no jargão petroleiro) do que no refino (downstream)? As taxas de retorno do capital de um e outro são muito distintos. O capital imobilizado em uma refinaria é centenas ou milhares de vezes superior a um cavalo de pau para extrair petróleo em terra ou mesmo de uma plataforma marítima para águas ultraprofundas (as mais caras plataformas da Petrobrás dificilmente custam US$ 1 bilhão, é difícil uma pequena – importante frisar, pequena – refinaria custar menos de o dobro ou triplo deste valor). E para piorar do ponto de vista do capital o mercado de derivados em vários países, como a Argentina e o Brasil, tem o agravante de ter preços controlados fazendo que a gasolina e o diesel não possam variar no posto de gasolina ao sabor da cotação internacional do petróleo do qual são produzidos (afetando a taxa de lucro no refino uma vez que o produto final tem preço tabelado, mas a matéria-prima não).
Dentro das regras do jogo da exploração capitalista não há saída neste impasse de falta de capital para realizar estes investimentos tanto em descobrir e desenvolver novas reservas caríssimas como as do “shale oil” de Neuquén (rocha que pode ser processada para produzir um óleo similar ao petróleo que é similar ao xisto betuminoso que a Petrobrás explora muito marginalmente no Paraná) e em novas refinarias.
Outros limites serão postos pela gestão da empresa pelo governo e seus gerentes. Não são só as falhas destes gestores na Aerolíneas Argentinas ou nos crimes contra os trabalhadores de sua gestão dos trens (que culminaram no massacre da estação “Once” com dezenas de mortos) que denunciam sua ineficácia. A sua gestão é contra os trabalhadores e para os acionistas. A composição acionária onde o governo gere para remunerar os acionistas (entre eles o governo) impõe uma irracionalidade capitalista na gestão, dos investimentos a exploração dos trabalhadores. O “modelo Petrobrás” que o governo Kirchner reivindica expõe isto em toda sua concretude como mostraremos ao final. Com empresas estatais, mixtas, ou sem as mesmas, o governo capitalista segue sendo governo capitalista. Ele gere os recursos e existe não para atender os trabalhadores e o povo, mas para garantir a continuidade da exploração capitalista, seja ela com mais ou menos saque imperialista dos recursos naturais.
Os limites estão postos não só pela falta de capital como pela irracionalidade de discursar em soberania nacional a partir do controle de somente 34% da produção ou pela gestão pelo governo da empresa. A partir do monopólio de 100% da produção e processamento de hidrocarbonetos a questão ainda estará posta, mas é possível maior racionalidade em sua solução. Os recursos estão disponíveis, mas não segundo as regras do jogo capitalista, ao contrário de sangrar as aposentadorias dos trabalhadores argentinos ou de esvaziar as reservas do Banco Central para realizar estes investimentos estes recursos existem nos lucros dos bancos, da exploração de minérios e na renda da produção de soja.
Por estes motivos ecoamos o programa levantado pelos companheiros do PTS na Argentina: “exigimos uma verdadeira expropriação de 100% de todas as empresas de hidrocarbonetos. O governo agora denuncia os lucros milionários da REPSOL mas o desinvestimento e o saque também é do restante das empresas que operam em nosso país. Que se abram os livros de todas empresas para demonstrar ã população seus lucros e sua política de esvaziamento e saque. Os recursos para o investimento necessário e para o auto-abastecimento energético (geolicamente esta demonstrado que no território nacional existem os recursos petroleiros e de gás), estão na renda da soja que os latifundiários levam, nas mineradoras, nos bancos que também terminaram o ano com um recorde (em 2011) de 11 bilhões de pesos de lucros, nas empresas privatizadas que são responsáveis pelo desinvestimento e que provocam os crimes sociais que sofre a maioria operária e popular da população. Nosso programa levanta a expropriação e controle operário de todas as empresas, a criação de um banco estatal único, controlado pelos trabalhadores e o monopólio do comércio exterior. Premissas mínimas para terminar com o saque e a anarquia capitalista e começar a elaborar um plano de acordo com as necessidades das grandes maiorias. O apoio que esta medida do governo desperta na população expressa uma justa aspiração de defesa dos interesses nacionais frente ao saque dos monopólios imperialistas. Nós diferenciamos estas aspirações do oportunismo pragmático da camarilha governante e sobre a base do debate que esta medida abre, colocamos o programa de luta, remarcando que somente pode ser levado até o fim com uma mudança deste regime social e por um governo da classe trabalhadora e do povo.” (artigo supracitado, tradução nossa)
A qual interesse estratégico atende as poucas palavras do governo Dilma?
O governo Brasileiro na figura da presidente Dilma e do ministro da Energia Lobão limitaram-se a declarações de poucas linhas sobre a controversa “nacionalização” argentina. Falaram como se trata de uma decisão soberana e que o Brasil defende o direito a mesma.
A grande mídia brasileira criticou a medida argentina como um desrespeito as regras do jogo, da propriedade privada, uma “recaída no populismo peronista”, etc, mas não criticou o quase silêncio do Itamaraty diante do elevar de tom da Espanha e outros imperialismos. O Brasil teria, com suas poucas palavras, mostrado como é equidistante tanto dos “populismos” como dos imperialismos, que seria parceiros de uns e outros, realizando comércio com ambos e que ao mesmo tempo não faria o mesmo em território nacional. O Brasil não poderia se indispor com seu parceiro do Mercosul, e nem se indispor com a União Europeia e a Espanha, não poderia mostrar aos investidores que desrespeitaria contratos.
A forma como emerge a política externa brasileira e interesses que unificam distintos setores das classes dominantes é pragmatismo erguido a imensas alturas que, uma pragmática.
Esta pragmática, no entanto, é uma forma de uma política e não uma política em si mesma como querem fazer parecer comentaristas do tipo Miriam Leitão. Esta comentarista da Rede Globo e seus consortes querem traçar desde o Barão do Rio Branco uma política a partir de sua forma e não esta forma em interrelação com seus conteúdos.
A forma como se expressa historicamente a política externa brasileira que mesmo em governos de direita como Jânio condecoraram um Che Guevara não são mais que uma forma de política definidas. Influentes estrategistas e diplomatas dos governos Lula e Dilma, Samuel Pinheiro e Celso Amorim têm publicado diversos livros e artigos nos últimos anos que ajudam a mostrar o porque desta forma e conteúdo pragmáticos.
A Argentina é dos principais parceiros comerciais, e em certo sentido, estratégicos do Brasil em seu posicionamento estratégico burguês predominante, de emergência como um ator global a partir do exercício do soft power (poder de persuasão, em oposição ao hard power – militar, em certo jargão diplomático e militar). E um soft power que vende seus interesses particulares como parte dos interesses próprios dos parceiros, que a emergência do Brasil potência também seria um interesse para a América do Sul, e por esta via para todo e qualquer país do planeta, inclusive os imperialismos. Trata-se de uma prática de uma estratégia e não uma estratégia propriamente. A estratégia, usando esta denominação militar, seria a condução de operações isoladas para um fim, é difícil em um estado que não é uma semi-colônia como outra qualquer nem um país plenamente independente falar em sua condução de táticas para um fim, de tecer uma estratégia própria, ter fins próprios. Esta semi-estratégia, dada sua persistência, traçada ao menos desde algum momento dos anos 90, vem ganhando traços de estratégia, mas com isto não se pode perder de vista dois elementos fundamentais dos limites da mesma como uma estratégia. Ela é dependente de situações da economia e geopolítica mundial, e como há também setores no Brasil, que não conseguem impor sua hegemonia no momento, ou mesmo o imperialismo não faz questão disto no momento, que não se opõe a buscar mais espaço de manobra, mas que buscam uma localização bem mais pró-americana mais parecida com a Colômbia ou Chile. Para estes setores o papel do governo brasileiro em garantir a repressão do povo haitiano para interesses dos imperialismos, buscar acalmar a luta de classes em todo o continente não seria suficiente1 .
A política externa que tem predominado, vendida como nacionalista, é na verdade uma de busca de uma política pro-imperialista combinada a busca de alguns interesses particulares. Esta é a política que tem dominado a política externa brasileira. Ela não termina de ser uma estratégia. Ela fica presa em algum lugar de uma política própria e sua articulação com interesses hegemônicos mundiais (como argumenta Samuel Pinheiro em Desafios Brasileiros na era dos gigantes, Contraponto 2005). É uma semi-estratégia que busca espaço para monopólios brasileiros (“global players”) como também para os negócios imperialistas a partir de seus interesses próprios e associados a partir das multinacionais instaladas no Brasil.
Celso Amorim, o líder desta política externa no governo Lula, em seu livro recente, Conversas com jovens diplomatas (Benvirá 2011), não poupa elogios a sua própria política de como foi vendendo o Brasil como parceiros de todos (inclusive os imperialistas) mas que teria como ponto de foco principal, supostamente, os países do “sul global”. Seu livro é um compêndio de palestras no Itamaraty onde mostra as dificuldades e ao mesmo tempo necessidade da pragmática neste exercício de uma quase estratégia que seria articulada do seguinte modo: “voltamos a fazer do Mercosul e da América do Sul uma prioridade efetiva. Redirecionamos o foco de nossa diplomacia, buscando explorar novos horizontes, sem abandonar parcerias tradicionais [leia-se EUA e outros imperialismos]- ao contrário, reforçamos essas parcerias. Entre esses novos horizontes, quero destacar, entre outros, a África onde não fomos buscar apenas novos parceiros comerciais – fomos buscar a nós mesmos, nossas próprias origens, frequentemente esquecidas. Também desenvolvemos ralações novas com os países do Oriente Médio, com a Índia, com a China. Formamos o IBAS e o BRICS. Talvez o mais importante de tudo é que praticamos uma política externa altiva e ativa”. (op cit 536).
Esta posição brasileira é falaciosamente a favor dos povos. Este argumento político “sul-sul” encobre a posição absolutamente desigual que o Brasil tece com estes povos. O comércio exterior brasileiro é pautado em grande parte pela exportação de commodities, e é muito deficitário em produtos manufaturados. Com a América do Sul, América Latina em geral, Oriente Médio e outros países do “sul” (fora China e alguns países petroleiros como a Nigéria) o Brasil tem imensos superávits pautados, sobretudo, em produtos manufaturados, favorecendo as multinacionais brasileiras e, antes de mais nada, as multinacionais imperialistas que utilizam o Brasil como plataforma para repartição desta parte do botim do comércio mundial2 .
As estatísticas do ministério do desenvolvimento e comércio exterior não dão margens para outras interpretações: dos 29,796 bilhões de dólares de superávit comercial do Brasil com o mundo em 2011, 5,803 bilhões foram com a Argentina. Sozinho este intercâmbio representa quase 20% do total do superávit brasileiro. O Mercosul como um todo garantiu um superávit de 8,477 bilhões, ou 28,4% do total. Venezuela, Colômbia, Chile e Peru contam por outros 9,004 bilhões, totalizando neste acumulado 58% do superávit brasileiro com o mundo. O mesmo acontece com royalties, lucros e juros, enquanto o Brasil tem uma relação deficitária com o mundo, tem remessas anuais de lucros vindas da América Latina para o Brasil. Estas remessas não chegam a alterar a caracterização do país que tem capitais sangrados anualmente rumo aos imperialismos, mas dão contornos específicos para a dominação imperialista tanto neste quanto naqueles. Ou seja, ás custas da Argentina, Mercosul e outros países da América Latina, o Brasil financia sua dependência dos EUA, Alemanha, Japão e outros países imperialistas com os quais mantém expressivos déficits comerciais e remete suas riquezas como pagamento dos capitais investidos.
Para além deste acobertamento de uma relação desfavorável aos povos irmãos, e a favor não dos interesses do povo brasileiro, mas dos empresários nativos e estrangeiros aqui instalados, os problemas que estes diplomatas se enfrentam não são novos. Presos a posições de classe que impedem de questionar os interesses internos e externos na dependência são expressões vivas de como buscar crescer pelas beiradas, da pragmática como a política burguesa possível. Uma vez que o inominável é a emergência do proletariado brasileiro como sujeito político próprio que coloque os infinitos recursos naturais e a bastante razoável base industrial deste país-continente não a serviço de negócios das elites nativas e seus sócios/dominadores estrangeiros mas da transformação radical e racional da sociedade no Brasil e base de apoio para efetiva libertação dos povos latino-americanos como parte da revolução socialista mundial.
É vendo os limites da pragmática burguesa que também os trabalhadores precisam aprender a trilhar seu próprio caminho independente e revolucionário. Ele passa por esta crítica da política externa como continuidade de uma política interna– de classe no país – como pela crítica ao maior exemplo de seu desenvolvimento dito nacionalista mas asbsolutamente associado e dependente do capital estrangeiro, a Petrobrás. Ao contrário de Cristina Kirchner, não vemos nesta empresa um caminho para a soberania dos povos latino-americanos, mas para a perpetuação por vias distintas do saque imperialista direto (tipo REPSOL) para a mesma dependência, saque e exploração com distintas formas e associações.
A Petrobrás e o “modelo brasileiro”... de associação com o imperialismo, de anarquia ambiental, exploração e espoliação
Argumento 1 - Propriedade
É inegável que a existência da Petrobrás e de um sistema de exploração e produção de derivados de petróleo onde predomina uma empresa estatal mista (uma S.A. como o governo argentino quer fazer da “nova” YPF) significa margens de manobra muito distintas em relação aos imperialismos. Uma coisa é a burguesia brasileira ser presa de saqueadores. Outra bastante distinta é ser parceira. Esta parceria permite algumas medidas limitadas de “desenvolvimentismo” que se somam ao sinal geral de anarquia do ponto de vista do meio ambiente, trabalho e recursos naturais do país. Fruto do tamanho desta empresa, da propaganda interessada do governo brasileiro, da burocracia sindical e intelectuais, muitos trabalhadores no Brasil e no mundo tem uma visão completamente equivocada do que é esta empresa, como opera, quais suas contradições. É preciso colocar todos pingos nos “is” possíveis.
Não há no Brasil por lei nenhum monopólio dos hidrocarbonetos. Havia até 1995, após a derrota da heroica greve dos petroleiros FHC pode impor o fim deste. A Petrobrás extrai 91,67% do petróleo e gás do país (extraindo 2,467 milhões de barris de óleo equivalente por dia no mais de 2,6 milhão extraídos no país). No entanto sua fatia de “propriedade” é menor é de 90,94% (uma diferença de cerca de 100 mil barris por dia). O que explica esta diferença é que cada campo de petróleo e gás no país é leiloado e diferentes empresas se associam para obtê-lo em determinadas proporções. Há empresas que não operam nada, como a REPSOL, e levam diariamente seu botim.
A SHELL, BP, CHEVRON, outras empresas imperialistas, Eike Batista e sua OGX e outros burgueses nacionais sangram o país em cerca de 300 mil barris por dia ou US$ 22,5 milhões por dia! considerando um preço médio apurado pela ANP em 2011 de US$ 75 (uma vez que o petróleo brasileiro mais pesado é mais barato que a referência mundial), esta sangria é da ordem de US$ 22,5 milhões por dia3 !
Sem reverter os mais de 30% do pré-sal já leiloados previamente sob os governos FHC e Lula a medida tomada no final de 2010 por Lula de alterar o regime de exploração daquelas promissoras áreas (petróleo mais leve que a média nacional e reservas da ordem de 20-70 bilhões de barris, colocando o país na lista das dez maiores reservas do planeta) seguem a mesma premissa de parceria com a espoliação por imperialistas e bilionários locais só alterando a participação do governo brasileiro.
Segundo o sistema de partilha (o novo do pré-sal) e não o de concessão (leilào simples onde ganha quem pagar mais e só precisa pagar royaltires), cria-se uma nova estatal a Petrosal. Neste sistema ganhará o leilào de partilha a empresa que ofertar ã Petrosal a maior quantidade de óleo que ela deterá, digamos 60%, os 40% restantes serão divididos entre a empresa vencedora e a Petrobrás que será necessariamente a operadora desta exploração e seguirão existindo os royalties.
Neste modelo, evidentemente o governo ficará com uma fatia maior da renda do petróleo e por este motivo diversos operadores de petróleo e diversos comentaristas dos grandes meios de comunicação do país se opuseram a esta lei. Protestaram porque ao invés de deterem diretamente 65% da produção como no modelo de concessões (considerando 10% de royalties e 25% de participações especiais) neste modelo novo ficarão com “só” 17% (pois 60% irá para a Petrosal, terá 15% de royalties e ainda terá que dividir sua parte com a Petrobrás).
Bem, o “só” 17% de reservas da ordem de 50 bilhões de barris a um preço de US$ 90 (o petróleo do presal tem preços mais próximos aos que funcionam como valor de referência no mercado mundial, todo petróleo expressa seu valor dizendo eu valo X Brent, Y West Texas Intermediate) de US$ 765 bilhões!
Até aqui parece que o imperialismo e os bilionários nacionais como Eike Batista lucram só com sua parte do botim do que a natureza levou milhões de ano para produzir. Mas não é assim que as coisas se passam. A própria Petrobrás opera para gerar lucros a seus acionistas privados. E estes lucros são da ordem de grandeza como poucas empresas no planeta produzem. Em 2011 alcançaram US$ 19,58 bilhões (R$ 33,3 bilhões). A Petrobrás tem suas ações ordinárias (que dão direito a voto) controladas pelo governo na proporção de 63,1% (entre ações da União, BNDES, BNDESPar, Fundo Soberano, Fundo Social). No entanto, este controle é feito para remunerar o capital social (o de posse efetiva e que dá direito aos dividendos). Neste segundo o governo detém 47,7%.
Quem é dono dos restantes 52,3%? 24,4% são controlados por diversos fundos e empresas imperialistas sendo negociados em Wall Street, outros 9,4% são controlados por estrangeiros não especificados em seus balanços públicos, e os restantes 18,5% estão diluídos entre ações no Brasil, na Argentina, Fundos de pensão das estatais como Previ, Petros, diversos burgueses nacionais e ainda uma parcela que é de posse de trabalhadores brasileiros que usaram seu fundo de garantia comprado ações da Petrobras quando seu capital foi aberto nos anos 90.
Os representantes destes capitalistas imperialistas e nacionais destes 52,3% na assembleia de acionistas da Petrobrás mostra a que nível chega a fusão e associação de destacados bilionários nacionais com o imperialismo (que é sem sombra de dúvidas o maior acionista). O governo têm 5 representantes, os trabalhadores efetivos – não terceirizados – elegem diretamente um, e os “privados” são representados pelos Srs. Jorge Gerdau e Josué Christiano Gomes da Silva. Gerdau é o barão do aço, detentor de numerosos interesses na siderurgia desde sua empresa homônima a participações em diversas outras e foi no governo Lula um articulador de Lula com empresários brasileiros e estrangeiros. É presidente do “Fórum de Gestão Pública” do governo Dilma. Alguém de trânsito ilimitado.
O mais surpreendente é quem é o sr.Josué da Silva. Este distinto burguês coloca o poderoso Gerdau no chinelo. Ele é o herdeiro de ninguém menos que José Alencar da Silva, dono do monopólio têxtil Coteminas com ramificações em tudo que é setor da economia e vice-presidente da República no governo Lula. No mais alto escalào da propriedade e governo estão associados os interesses “públicos” e “privados”, “nacionais” e imperialistas. Este é capital social é retrato do que é esta empresa, este governo, e a quem serve.
Mas ainda aí não esgotamos como a Petrobrás opera para a espoliação dos recursos nacionais. Os 47,7% do governo são gastos como? Estão a serviço dos interesses dos trabalhadores e do povo? Bem, o governo gasta mais de 45% de seu orçamento em serviços da dívida interna e externa, tendo portanto como destino final mais ou menos os mesmos bolsos que detém ações na empresa símbolo do país.
Terminadas as operações fundamentais, de propriedade, de como a empresa do “desenvolvimento nacional” e do desenvolvimento dos “povos” opera associada e para o imperialismo, suas operações cotidianas escancaram o mesmo.
Argumento 2 – Funcionamento nacional e no exterior
A Petrobrás tem chamado a atenção com seu audacioso plano de negócios que prevê investimentos da ordem de US$ 225 bilhões até 2015. Mas como se distribuem estes investimentos e o que eles objetivam na estrutura produtiva do país e suas relações exteriores?
63% destes 225 bilhões estão concentrados na exploração de petróleo e gás e sua distribuição quase direta (no caso do gás). Dentre eles a investimentos da ordem de US$ 11 bilhões no exterior, concentrados em mais de 90% na exploração e no Golfo do México americano e na Costa Oeste da África (Nigéria, Benin, Angola).
Nestes países há relatos das piores condições de trabalho (trabalho escravo, maior concentração de mortes na indústria do petróleo) e ambientais no planeta (o sensível ecossistema do delta do rio Niger está morrendo graças aos derramamentos de petróleo e as intermináveis fornalhas cuspidoras de CO2, compostos sulfurosos e vários outros gases tóxicos, sem nenhuma regulação, que são os flares queimando diariamente em milhares de poços marítimos e terrestres). E de quebra oferecem alguns dos melhores e mais lucrativos petróleos do planeta (junto a parceiras imperialistas a Petrobrás extrai diariamente mais de 100 mil barris dos campos de Agbami e Akpo na Nigéria4 .
A concentração dos investimentos na exploração tem lógica. Uma lógica capitalista. E no exterior a Petrobrás opera com cara mais abertamente de empresa capitalista típica. Ou seja, espoliadora, preocupada em arrancar as riquezas dos países e pronto. Por isto Lobão não respondeu positivamente a demanda do governo argentino em aumentar o investimento da Petrobrás naquele país. A Argentina quer investimentos para diminuir seu déficit energético, quer mais refino, a Petrobrás quer mais lucros. Porque investir em refino na Argentina se há “maravilhosos” campos na Nigéria com remunerações ímpares, comparáveis somente a campos sauditas?
A Petrobrás está investindo também em refinarias – No Brasil – é claro, mas de longe não é na mesma proporção que investe na exploração. Se a Petrobrás alcançar no Brasil suas metas de produção de 2015, fruto deste programa de investimentos produzirá cerca 3,93 milhões de barris de petróleo e óleo equivalente (conversão do gás natural na mesma medida). Porém expandirá, no melhor dos mundos onde os investimentos no COMPERJ (Itaboraí – RJ), e na Refinaria Abreu e Lima (Suape – PE), se realizem nos prazos e alguma expansão das refinarias existentes, para processar dos atuais 1,8 milhão de barris para algo menos de 3,0 milhões. Este excedente de um milhão de barris será exportado cru. Praticamente inexiste refino de petróleo que não da propriedade da Petrobrás, somente 1,52% do refino ocorre nas 4 refinarias de não propriedade da Petrobrás, e não há nenhum plano de nenhum imperialista ou bilionário local de criar uma refinaria pois não se trata do negócio mais lucrativo do petróleo e é difícil concorrer em mercado tão monopolizado.
Esta exportação de petróleo cru da Petrobrás, e mais ainda das outras empresas, de óbvio menor valor agregado que a exportação de derivados, pressiona ã primarização da economia e “doença holandesa”. Com o aumento do refino o Brasil deixará de ter déficit nas contas de hidrocarbonetos, mas a tendência geral de primarização permanecerá. E não há “incentivos ã indústria nacional” que mudem este cenário. Sob o governo Lula foram criadas regras para produção nacional de navios e plataformas que exigem percentuais mínimos da produção no país (da ordem de 60 a 75% dos itens de um navio, plataforma). Este incentivo gera empregos e renda no país. Mas não muda a estrutura produtiva crescentemente dependente de produtos primários (commodities) e suas indústrias associadas (processamento de soja, carnes, refino de petróleo, estaleiros). A indústria de bens de capital (máquinas) e outras mais intensivas em capital seguem sendo de propriedade imperialista e por mais que sejam gerados superávits comerciais estarão estes a serviço de financiar esta dependência.
Este é o sinal geral do que os planos de negócio da Petrobrás objetivam. Sem deixar de lado, é claro, como em cada passo deste plano algum capitalista nacional ou imperialista é beneficiado. Os estaleiros são de propriedade de grandes monopólios nacionais como Andrade Gutierrez, Odebrecht, Vale em associação a diversas empresas imperialistas. Na petroquímica a Petrobrás contribuiu em inúmeras operações de compra e venda de ativos para concentrar – absolutamente – toda a produção de petroquímicos em um só “global player”, a Braskem. Controlada pela influente família Odebrecht e onde a Petrobrás (e seus acionistas) detém 40%.
Quem lucra com o avanço destas operações? Os amigos dos reis da finança, os amigos do comitê de negócios da classe capitalista que é a definição marxista do Estado (e neste caso isto ocorre não só em geral mas com nome e sobrenome com os Lula da Silva se associando aos Alencar da Silva, os Gerdau, os Odebrecht, e seus sócios imperialistas diretamente). Quem perde? Os trabalhadores, o meio-ambiente, não só em geral pelo país e as relações que tecem com povos oprimidos no restante do planeta, mas diretamente no processo de produção com sua exploração e anarquia moedora de gente e biomas.
Argumento 3 – Anarquia com as forças produtivas: queima de recursos naturais
A indústria dependente da queima de combustíveis fósseis será relegada ao museu da história junto a exploração capitalista pela ação dos trabalhadores, que controlando as forças produtivas de toda humanidade poderão abrir um novo capítulo em sua história sem degradação ambiental e com prosperidade para todos, a partir de planos racionais em escala local, regional e mundial a partir de sua auto-organização.
Este processo não será automático, a dependência dos combustíveis fósseis não está só em sua queima para produção de energia e aquecimento, nem para o uso irracional de veículos a combustão – que poderia ser minimizada usando mais transporte público – mas também na dependência de uma interminável gama de produtos que é feita a partir de petróleo, de insumos para remédios, a plásticos, asfalto, entre outros.
No entanto, antes da tomada do poder e planos racionais em escala nacional, regional e mundial há muito anarquia a ser derrotada. Uma parte imensa da produção diária de derivados de petróleo é queimada. A ANP (Agência Nacional do Petróleo) mantém estatísticas a respeito. Em seu anuário estatístico afirma que 29% do gás natural foi queimado ou perdido no país. Ou seja, fruto da própria irracionalidade capitalista – pois há tecnologia disponível – 30% do que se produz vai aos flares (tochas), vai ã atmosfera deste produto finito, e com consequências ambientais como o efeito estufa e outros. Porque é queimado parte deste “ouro gasoso”? Porque é mais lucrativo assim do que imobilizar algum capital para captá-lo, trata-lo, transportá-lo do que simplesmente queimá-lo. O controle dos trabalhadores do conjunto da indústria do petróleo, permite, ainda sem superar a dependência dos combustíveis fósseis, níveis muito inferiores de queima de combustíveis fósseis associados a produção de mais mercadorias, de mais energia para os habitantes. Por exemplo se este gás fosse usado para geração de eletricidade seriam necessárias termelétricas a base de carvão como Eike está construindo no Ceará, ou mesmo Belo Monte e outras hidrelétricas que destroem quilômetros e quilômetros de vida humana e natural?
É preciso derrotar a anarquia que a indústria do petróleo impõe no funcionamento e utilização do próprio petróleo e gás natural. Com o controle destes recursos fortes investimentos em tecnologia, educação, logística, poderiam abrir caminho a novas tecnologias e outro metabolismo da humanidade com a natureza, não para retornar a idade da pedra, mas para gerar mais recursos sem degradação do ambiente e do ser humano e assim abrir também outro caminho para a realização dos indivíduos.
No Brasil, uma imensa parte desta tarefa passa e começa pelo controle e gestão pelos próprios trabalhadores da Petrobrás de seus recursos que significam mais de 90% da extração e mais de 98% do refino de todo o país.
Argumento 4 – Anarquia com as forças produtivas: exploração e irracionalidade com o trabalho humano
Imensos contingentes de seres humanos são colocados na produção dia a dia por este ciclope, um gigante voraz por comer seres humanos e que só olha em uma direção: o lucro. São 60 mil trabalhadores próprios e cerca de 280 mil terceirizados, e ainda uma quantidade maior de trabalhadores com relações indiretas e esporádicos – como nas obras. E este imenso contingente significa, de salários a direitos e a participação nos lucros, somente 3 a 4% de seu faturamento segundo números que aparecem volta e meia em boletins sindicais da Federação Única dos Petroleiros (FUP), federação que tal como a direção da empresa é dirigida pelo PT.
O trabalho é organizado para gerar lucro e não para gerar riquezas ao país e sua população. Por isto estes níveis de diferença entre a porcentagem do faturamento que são salários e o que é embolsado para gerar novos investimentos e para pagar dividendos. Parte deste trabalho é simplesmente anárquico. A Petrobrás mantém um funcionamento imposto desde os anos 90 por FHC, cada unidade tem uma comunicação, um RH, um setor de saúde, meio ambiente, segurança industrial, etc, próprio, uma multiplicidade de funções que só consomem recursos ao contrário de coloca-los para gerar mais segurança nas operações, desenvolvimentos tecnológicos, logísticos, de produção, etc. Mas esta anarquia que tem claros motivos capitalistas para existir. Competição entre as unidades e ter fatias completas, prontas para privatização assim que possível.
Competição é a marca fundamental do que este ciclope busca fazer com os trabalhadores, partindo de sua divisão entre efetivos e terceirizados, coloca os primeiros para regular e autorizar os serviços dos segundos e pela própria divisão do trabalho adotar uma posição de chefe e proprietário vis a vis os terceirizados. Ou seja, somando-se a diferenças nos riscos a que submetidos todos os dias (a quase totalidade das mortes em trabalho são de terceirizados), as diferenças em salário, jornadas de trabalho (nas plataformas, por exemplo, os efetivos fazem turnos de 12 horas por dia por 14 dias consecutivos que ficam embarcados, permanecendo 21 desembarcados, os terceirizados fazem a mesma jornada diária mas em ciclos de 14 dias por 14 dias), e outros direitos, a empresa coloca setor de trabalhador para competir um com o outro e categorias de trabalhadores uma com a outra. Tudo isto para dificultar sua união e possiblidade de utilizar estes imensos recursos a serviço da população.
Um programa para que os recursos naturais sejam controlados pelos trabalhadores, a serviço dos trabalhadores e do povo
A recente “nacionalização” argentina abre, como colocamos, estes imensos problemas para debate. Como controlar, e para quem, estes recursos. Parte da resposta acreditamos que está colocada na própria análise de a quem serve estes recursos.
Não será da mão de saqueadores imperialistas como uma REPSOL, Chevron, Total que estes recursos servirão para alguma coisa que não a anarquia capitalista. Também não é da mão de governos capitalistas, associados até suas entranhas – como um vice-presidente José Alencar e seu filho como representante dos capitalistas estrangeiros na Petrobrás – que serão organizados estes recursos para a plena e efetiva soberania nacional. Este desafio está colocado nas mãos dos trabalhadores em geral e dos petroleiros em primeiro lugar.
Não há nada mais nefasto neste caminho que a postura chauvinista adotada pelos dirigentes sindicais do Estado Espanhol que se ladearam com “seus” amos locais contra os interesses do povo argentino. Como declaram nossos camaradas do Clase contra Clase do Estado Espanhol em sua declaração: “A este coro reacionário se somou desta vez a mesma burocracia sindical, por meio dos porta vozes da Federação Química da CCOO e a seção sindical da Repsol da UGT. Seu alinhamento com a patronal imperialista espanhola é uma mostra mais de que lado estão estes burocratas vendidos. Defendem os interesses dos mesmos patrões que mantém milhares de trabalhadores precarizados nas refinarias espanholas, são parte das cenas com Zapatero e Rajoy para ditar os ajustes e que em 2003 foram responsáveis pela morte de 9 trabalhadores no dramático “acidente” de Puertollano. Sem espaço para dúvidas que estes “estômagos agadecidos” são os agentes da patronal imperialista nas fileiras do movimento operário.”5
A solidariedade entre os trabalhadores dos povos oprimidos pelo imperialismo e os trabalhadores explorados pelo mesmo imperialismo em “sua” casa passa, por um lado, pela luta dos trabalhadores contra “seu próprio” imperialismo, e por outro, que os trabalhadores de país coloniais e semi-coloniais a partir desta posição, vejam seus inimigos na burguesia imperialista e não nos trabalhadores destes países. Os trabalhadores no Estado Espanhol ou na Argentina só tem a ganhar com a derrota da REPSOL, seguindo na declaração do Clase contra Clase:
“Esta luta será o melhor apoio ativo a luta dos trabalhadores destes países, para conseguirem verdadeiras nacionalizações sem indenização alguma e sob controle e gestão dos trabalhadores. A única alternativa que poderá por todos seus recursos econômicos a serviço da classe operária e do povo. Ao mesmo tempo os avanços de nossos irmão dos países semicoloniais para minar as bases do imperialismo espanhol será por sua vez uma alavanca na nossa luta para acabar com o Regime de 78 e o capitalismo espanhol, que não tem nada de bom a oferecer aos trabalhadores, a juventude e os setores populares daqui.” Destes posicionamentos é preciso posicionar-se frente ã Petrobrás que apesar de controlada pelo Estado brasileiro, é controlada para garantir lucros a seus acionistas, sobretudo imperialistas, e opera como qualquer imperialista espoliadora em outros países, associada a empresas imperialismos, e focando seus investimentos em como extrair o máximo dos recursos dos países. Por este motivo, não vemos que a defesa dos recursos naturais brasileiros a serviço do povo brasileiro passa pela defesa da Petrobrás no exterior. Muito pelo contrário o enfraquecimento de suas posições de espoliação na Argentina, Nigéria, Bolívia enfraquece seus acionistas imperialistas e fortalece a luta pelo controle integral de todos recursos do petróleo no Brasil. Defendemos a expropriação sem indenização de todas propriedades da Petrobrás em outros países como parte de fortalecer a luta dos trabalhadores no Brasil pelo controle e gestão de todos recursos do petróleo bem como para fortalecer a solidariedade entre os trabalhadores dos distintos países.
Não é de interesse dos trabalhadores do Brasil que algum proletário seja explorado. Um trabalhador argentino, boliviano, angolano, nigeriano, precisa ter certeza que se trata de dois Brasis: um que controlado pelo governo, está associado ao capital imperialista e é parte do saque semicolonial de diversas nações e outro Brasil, dos trabalhadores que luta pela irmandade de todos povos a partir da derrota de sua burguesia e seus amos e sócios imperialistas no Brasil e em toda América Latina.
A expropriação em si dos ativos da Petrobrás ajudaria a luta pelo monopólio dos recursos do petróleo no Brasil, mas não resolve nem coloca estes recursos efetivamente a serviço dos trabalhadores como o exemplo da Petrobrás demonstra. É preciso lutar pelo controle e gestão operária da produção nestes países como no Brasil. A existência de um membro eleito pelos trabalhadores no conselho de administração da Petrobras deve ser utilizado como um ponto a favor disto. Este trabalhador eleito, que representa 1/8 dos votos neste conselho deveria estabelecer uma propaganda sistemática da anarquia que a produção controlada pelo governo e capital geram, como só os trabalhadores junto a técnicos comprometidos com os interesses do povo podem realizar.
A realização deste programa exige uma mobilização independente da classe trabalhadora. Para esta acontecer é necessário derrotar e superar a burocracia sindical da FUP ligada ã CUT e CTB. Uma burocracia marcada por privilegiados que estão a décadas sem trabalhar e recendo aumentos todos os anos pelos gerentes e diretores que compensam seus serviços prestados. Estes próprios gerentes e diretores são muitos deles dirigentes da FUP nos anos 90. E a FUP de hoje não trata estes gestores do capital, estes carrascos de terceirizados, organizadores da espoliação, de inimigos dos trabalhadores. Pelo contrário se orgulham nas assembleias do que tal “amigo” dos trabalhadores diz, que dicas dá sobre não fazer greves, etc. A burocracia pela via da gestão direta da empresa, pela via do fundo de pensão PETROS e seus imensos recursos, desenvolve uma unidade de interesses com a burguesia nacional e imperialista. Esta burocracia precisa ser varrida para abrir caminho aos trabalhadores.
Para realização deste objetivo é preciso colocar como primeira hierarquia a luta pelo controle operário – o que significa superar o quase abstencionismo de diversos sindicatos de oposição a FUP, inclusive os dirigidos pelo PSTU, que colocaram muito menos peso em eleger um trabalhador classista para este conselho do que dão a uma eleição sindical, e mais que nada não submeteram sua posição tática de participar desta eleição da posição estratégica de controle operário da produção – questão ausente em seus panfletos. É preciso ligar as lutas parciais no Brasil, como a luta contra os leilões do petróleo, como as que todos sindicatos petroleiros no Brasil concordam, inclusive os da FUP, a questão fundamental do controle operário da produção para garantir que estes recursos estejam a serviço dos trabalhadores.
A luta pelo controle operário da produção, para trazer uma maior racionalidade aos usos de todos recursos, naturais, humanos, é uma medida transicional possível no capitalismo mas que exige uma organização independente do proletariado e coloca a necessidade da tomada do poder. Esta medida passa obrigatoriamente pela superação da profunda divisão dos trabalhadores em efetivos e terceirizados, por sua incorporação sem concurso com iguais salários e direitos. Este problema já está colocado na Petrobrás e estará colocado na nova YPF argentina que tem, tal como qualquer empresa capitalista normal no petróleo milhares de terceirizados. É preciso desde as empresas petroleiras no Brasil, Argentina, Estado Espanhol, e fora delas formar fortes núcleos revolucionários que sejam portadores deste programa e que, junto a milhares de outros trabalhadores e técnicos contribuam para soberania dos países semicoloniais e, mais que isto, sejam dados passos na luta dos trabalhadores para superar a anarquia capitalista e trazer uma racionalidade ã produção e ao metabolismo da humanidade com a natureza, a partir do controle destes recursos como parte da luta pela revolução proletária em cada país e seu transcrecimento regional e mundial.
Notas
1 - Para se aprofundar nestas caracterizações do Brasil como uma “país semi-colonial com características especiais” e suas implicações contra o discurso dominante do Brasil como um país que avança ver numerosos artigos que a LER-QI tem escrito, em especial o artigo “Brasil: Entre o gradualismo reformista e as contradições estruturais do país” de Daniel Matos na última Estratégia Internacional Brasil, disponível neste site.
2- Para mais ver “Os interesses brasileiros e acordos com os EUA na maior inserção em Honduras e na América Latina e Caribe” de Leandro Ventura, disponível em http://www.ler-qi.org/spip.php?article2130.
3 - Este fato sequer é tocado pelos royalties (que não chegam a 10%) e pelas participações especiais (que não chegam a 25%). Mesmo considerando seus valores máximos em uma soma de 35% e ainda que os custos com força de trabalho fossem tão altos como os da Petrobrás (o que não é o caso pois praticam salários inferiores e não tem gastos com o mais custoso refino) da ordem de 3% do faturamento, estas empresas ainda faturariam a bagatela de US$ 13,950 milhões por dia, ou 5,092 bilhões de dólares ao ano. Para maiores detalhes sobre o sistema de royalties e participações especiais e custos de produção, lucros ver: “O Petróleo é nosso?”, deste mesmo autor, disponível em: http://www.ler-qi.org/spip.php?article1326
4 Estes petróleos que tem grau API de 45 e mais de 50 respectivamente – onde o maior número é mais caro, pois produzem mais produtos leves como gasolina e petroquímicos. Para que seja mensurada a qualidade destes campos, o petróleo de referência dos EUA o West Texas Intermeditate têm grau API de 39,6 e o de referência mundial Brent têm grau API de 38 (o maior campo brasileiro, Marlim, tem grau API de 18,5). Destes números também se vê como, diferente de Celso Amorim, temos que ver nas visitas de Lula ã costa Oeste da África não só a busca de “raízes históricas” mas a busca da espoliação imperialista que a Petrobrás se associa para realizar.
5 “Tirem as mãos imperialistas da REPSOL da Argentina e da América Latina”, disponível em www.ler-qi.org