Demagogia lulista
Um governo ’responsável’ para garantir os lucros patronais
02/12/2006 Palavra Operária N° 26
O segundo mandato de Lula foi definido por ele como o período de "desenvolvimento, distribuição de renda e educação de qualidade", pois o país já estaria "arrumado" e em condições de crescer 5% já em 2007. Para isso Lula exige medidas da equipe econômica para "destravar" a economia, encontrar recursos para investir e reformas que dêem mais liberdade ao governo para manejar o orçamento público a favor dos interesses dos capitalistas nacionais e estrangeiros.
A intelectualidade de centro-esquerda pró-Lula, gasta tintas para gerar um clima de confiança de que neste segundo mandato o espetáculo do crescimento surgirá, afinal, e será bom para todos (explorados e exploradores). A revista Carta Maior, em 22/11, afirma que no primeiro mandato "o presidente Lula comandou o país mais como um mediador de conflitos do que como um orientador de rumos", atuando "como um árbitro das disputas internas do governo, que não foram poucas" e "agora, o desafio é entrar para o pequeno grupo de presidentes que deixaram um legado histórico", fazendo um segundo mandato "mais ousado que o primeiro", porém com "responsabilidade" (garantindo os interesses dos capitalistas nacionais e estrangeiros).
O governo não pode abrir mão dos acordos estruturais que mantém com os monopólios capitalistas e as instituições capitalistas e imperialistas. Lula não pestanejou em reafirmar os compromissos com os capitalistas: superávit primário de 4,25%, metas de inflação (4,5% ao ano) e câmbio flutuante. A "responsabilidade" de Lula é com a classe dominante. No orçamento de 2007 o governo reserva para alguns milhares de capitalistas que especulam com os títulos da dívida R$ 166 bilhões (11% do PIB); aos 50 milhões de trabalhadores que vivem de aposentadoria, benefícios por doença ou morte, assistência social, estão reservados apenas R$ 180 bilhões (INSS); para a educação 3,4% e para a saúde 3%. E os patrões ainda exigem cortar gastos, porque para eles esses "gastos sociais" são os "inimigos do crescimento", escondendo que os lucros fabulosos e a expropriação dos capitalistas sobre a renda nacional produzida pela massa trabalhadora são a fonte da pobreza, desemprego, precarização do emprego, baixos salários e endividamento do país.
Não pode haver, no capitalismo decadente, crescimento para todos
O plano econômico que Lula costura não poderá trazer ao mesmo tempo crescimento econômico, desenvolvimento nacional e distribuição de renda, pois já foi o tempo em que as condições estruturais do capitalismo mundial permitiam esse tipo de "desenvolvimentismo". Cada vez mais as economias nacionais estão presas ã economia mundial e ás determinações dos monopólios empresariais que determinam preço, volume de produção e taxa de lucro. Lula sabe o que é um governo responsável para os capitalistas nacionais e estrangeiros. Na comemoração dos 50 anos da Mercedes-Benz no Brasil, há poucos dias, curvou-se ã "direção mundial da Daimler Chrysler" implorando para que "invistam no Brasil" e confiem "no governo brasileiro" porque "investir no Brasil é garantia de lucro".
Para bancar o crescimento econômico os capitalistas pretendem se apossar dos recursos orçamentários e dos lucros das estatais para bancar os investimentos. Para isso o plano capitalista que Lula negocia tentará impor o corte de direitos trabalhistas, aumentando a precarização, arrocho salarial, rebaixamento das aposentadorias e benefícios previdenciários, etc. O que os intelectuais centro-esquerdistas escondem, para enganar a maioria da população e manter seu apoio ao governo, a imprensa burguesa se vê obrigada a falar abertamente: "Lula é o político brasileiro com mais condições de realizar uma modernização capitalista para valer" porque é "tem cacife político [apoio popular] para dizer a setores de sua base social que é preciso reformar a Previdência mais uma vez, reformular parte da legislação trabalhista e cortar gastos em todas as áreas, inclusive na social" [Kennedy Alencar, Folha Online, 26/11].
Que desenvolvimento nacional que nada, os capitalistas querem reformas, dinheiro público e liberdade para buscar mais lucros
Para a economia crescer a 5% os investimentos deveriam passar de 20,7% a 25% do PIB (riqueza nacional), uns R$ 70 bilhões a mais. Diante da queda dos investimentos estrangeiros, que neste ano deverá ser de US$ 18 bilhões (R$ 39 bilhões), tanto o governo como a patronal precisam encontrar esses capitais no próprio país.
Mesmo com crescimento baixo em torno de 2,7% nos últimos anos, bancos, indústrias, comércios e serviços cresceram e alcançaram lucros consideráveis. Mas esses capitais os capitalistas não pretendem dispor para investimento no Brasil. Estão de olho no dinheiro do orçamento nacional, dos fundos de pensão e previdência, FGTS, lucros das estatais etc. O economista-chefe da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, deixa claro que "para chegar a 25% precisa de uma contrapartida mínima do setor público", ou seja, o governo deve garantir os recursos para investimento [Revista Carta Maior, 20/11].
A patronal e seus apoiadores na imprensa exigem a reforma da previdência, diminuição das aposentadorias, congelamento dos salários dos funcionários públicos, cortes nos gastos com saúde e educação, reformas das leis trabalhistas para gastar menos com salários e direitos para os trabalhadores. Esse dinheiro "economizado" iria para investimentos. Além disso, exigem diminuição de impostos para que sobre mais recursos nos cofres capitalistas. Os investimentos seriam lastreados com esse dinheiro barato, que não paga juros nem taxas, como nos empréstimos bancários, enquanto os capitalistas continuariam com seus capitais disponíveis para aplicar onde melhor lucrasse.
É o que nos informa o site Invertia: as empresas brasileiras investiram, de janeiro a outubro deste ano, US$ 22,8 bilhões, duas vezes e meia mais que o recorde anterior em 2004 (US$ 9,47 bilhões). Os investimentos que chegam ao país já estão US$ 9,5 bilhões menores em relação ao que saiu.
A CSN, que foi privatizada e entregue aos capitalistas "nacionais", busca criar um dos cinco maiores grupos do setor siderúrgico do mundo, com 24 milhões de toneladas de produção anual de aço e para isso negocia a compra da Corus (grupo anglo-holandês), investindo no exterior US$ 9,5 bilhões (R$ 21 bilhões). Depois de investir bilhões de dólares no exterior, o Grupo Gerdau acabou de deter 83,27% da Siderperu, siderúrgica peruana, investindo US$ 40,5 milhões (R$ 89 milhões). Ironicamente, o capitalista-mor deste grupo, Jorge Gerdau, pode vir a ser ministro ou conselheiro no governo Lula, para tratar, é claro, de soluções para o crescimento e o desenvolvimento nacional. Os capitalistas, sejam "especuladores" ou "investidores produtivos", obedecem ã mesma regra: buscam aplicar onde obtiver lucros maiores e não há patriotismo que mude isso.
Governo Lula entregará o país, como querem os capitalistas
A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), no dia 27/11, apresentou ao governo um plano de investimentos de R$ 206 bilhões a serem realizados nos próximos quatro anos para alavancar o crescimento do país. O governo poderia investir de uma vez só tudo o que a Fiesp propõe, desde que tivesse responsabilidade com o país e o povo e não com a minoria exploradora de capitalistas. Esses mesmos capitalistas falam em investimentos enquanto devem ao Estado quase o dobro deste valor e dão o calote. A dívida ativa dos empresários com o governo alcança R$ 380 bilhões. Mas quando o ministro Mantega, "amigavelmente" propôs que a patronal pagasse apenas R$ 47 bilhões (12,5% do total) para serem investidos na economia o presidente da CNI prontamente disse "sou contra".
O governo presenteia com mais recursos os empresários caloteiros. O ministro Mantega (da Fazenda) acaba de destinar R$ 15 bilhões do FGTS, a fundo perdido, ou seja, sem precisar ressarcir, e a patronal está de olho neste fundo que conserva R$ 170 bilhões disponíveis. As empresas que construírem galpões ou edifícios para suas instalações ou comprarem máquinas terão devolvidos o imposto pago e ganham prazo maior para taxas e contribuições (INSS, PIS e Cofins). Mais R$ 12 bilhões que vão diretamente para os cofres dos capitalistas.
Outra fórmula de Lula é saquear os cofres das estatais, principalmente a Eletrobrás e a Petrobrás. Afinal estas grandes empresas geram lucros fabulosos e, na lógica privatista de Lula e da patronal, são empresas estatais, mas seus recursos devem ser privados, dos capitalistas, e não públicos, do povo. O governo Lula apresenta a idéia de utilizar o caixa da Eletrobrás para bancar investimentos na geração de energia, evitando um apagão nos próximos anos. Como os capitalistas não investem o suficiente para garantir projetos de infra-estrutura o governo Lula embaralha a idéia de utilizar o caixa da Eletrobrás para garantir os investimentos na geração de energia.
A Eletrobrás passaria a ser uma espécie de "Petrobras do setor elétrico", como diz o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Traduzindo: como a Petrobras investirá em 2006 R$ 39 bilhões e a Eletrobrás R$ 5,6 bilhões, o governo pretende multiplicar por sete a capacidade de investimento da estatal do setor elétrico. Como esta estatal não tem a mesma liberdade que a Petrobras para captar recursos externos, o governo pretende privatizar "criativamente" a empresa, vendendo uma parcela dos atuais 52% das ações da Eletrobras que o governo controla. Assim, o governo Lula conseguiria arrecadar os R$ 16 bilhões que falta no projeto de investir R$ 42 bilhões em geração de energia, pois os "investidores privados" se dispõem a aplicar apenas R$ 26 bilhões.
Dos cerca de R$ 50 bilhões anuais de investimentos que a Fiesp diz ser necessário para a economia crescer a 5% nos próximos quatro anos os empresários afirmam que se comprometeriam com R$ 35 bilhões. Mas, com as medidas acima tomadas pelo governo Lula nessas últimas semanas esses empresários já receberam do Estado R$ 27 bilhões. A Petrobras sozinha investe R$ 39 bilhões, mais do que todas as empresas dizem que investirão.
O governo propõe financiar as obras de saneamento básico com recursos da Caixa Econômica Federal e do FGTS, criando convênios e concessões para exploração dos serviços pelas empresas privadas, via Parcerias Público-Privadas (PPPs), entregando a lucratividade desses serviços para os capitalistas.
Não nos assustemos quando o governo Lula diminuir o já miserável valor orçamentário destinado ã saúde, como pedem os empresários. O governo liberaria recursos do orçamento que hoje estão "carimbados" (vinculados) para a saúde e poderia destiná-lo mais uma vez ás mãos dos capitalistas, sem restrições legais ou constitucionais. Neste sentido já se vem buscando alterar o DRU (Desvinculação de Receitas da União), de modo a liberar ao menos 30% do orçamento (hoje é 20%) que o governo poderia usar para financiar os negócios capitalistas.
Em nome de "destravar" os investimentos Lula afirma que partirá para cima das restrições ambientais, exigindo do Ministério do Meio Ambiente, dos órgãos públicos e da justiça "mais rapidez na concessão de licenças ambientais para determinadas obras". Ou seja, Lula vê as corretas ações dos ecologistas para restringir a degradação ambiental em nome do lucro como "travas" ao crescimento econômico. Com essa perspectiva poderemos ver acidentes ambientais e ecológicos que custarão recursos e prejuízos ao país e ás futuras gerações, mas para Lula tudo estará justificado porque os capitalistas precisam de "liberdade" para atuar.
Preparar a luta sindical política em defesa da classe trabalhadora e do país
Assim é o capitalismo real, que as fantasias "desenvolvimentistas" e "produtivistas" dos reformistas não podem esconder: os capitalistas fazem suas "reformas" e "modernizações" para elevar as taxas de lucros para essa classe parasita que se apropria de uma parte cada vez maior da riqueza nacional produzida pelo trabalho enquanto para a classe trabalhadora e o povo pobre sobra cada vez menos para dividir entre muitos. As centrais sindicais, principalmente CUT e Força Sindical e os sindicatos dirigidos por esses pelegos continuam aliados ao governo e aos patrões, defendendo as reformas trabalhistas e as medidas de crescimento econômico que só trarão mais lucros para a patronal e uma vida pior para a classe trabalhadora e o povo pobre. Dominando os sindicatos impedem a luta da massa trabalhadora contra o desemprego, a precarização, os baixos salários e a superexploração que sofrem enquanto os capitalistas lucram cada vez mais.
Nesses anos todos esses sindicalistas patronais e governistas falaram que se as empresas crescessem, se os trabalhadores abrir mãos de direitos e salários o país se desenvolveria e todos ganhariam. Os únicos ganhadores foram os patrões e esses pelegos, alguns deles até se tornaram ministros e empresários. Os trabalhadores e a maioria da população são os grandes perdedores.
Os trabalhadores da VW, da GM e tantos outros já viram que os novos investimentos, o crescimento econômico e os lucros das empresas, como falam os sindicalistas da CUT, resultam em demissões, disfarçadas por PDVs ou não, cortes de salários e direitos, precarização e mais horas trabalhadas para quem ainda fica empregado. Com esses dirigentes sindicais governistas e patronais iremos de mal a pior. É necessário que os trabalhadores mais conscientes avancem para uma política independente do governo e da patronal, expulsando dos sindicatos e organizações esses dirigentes vendidos que se aliam aos capitalistas e ao governo.
Por isso em cada fábrica e local de trabalho e cada sindicato os trabalhadores devem criar as condições e organizações para preparar o combate aos planos do governo e dos capitalistas. E essa preparação deve ser organizada por aqueles setores da vanguarda que já se colocam contra o governo e a patronal. Estes setores estão hoje na Conlutas e na Intersindical, e não podem continuar sem uma orientação clara e combativa de suas direções para fazer dos sindicatos e organizações que dirigem uma base efetiva para alcançar um programa operário e popular que atenda aos interesses da classe trabalhadora, do povo pobre e do país e seja discutido e agitado entre os trabalhadores dos sindicatos que ainda são dominados pelos pelegos.
Esta orientação exige um programa político que parta da defesa de emprego, nenhuma demissão nem PDV, salários e direitos iguais para todos, contra as reformas trabalhista, sindical e da previdência, salário mínimo do Dieese (R$ 1.450,00), entre outras demandas necessárias para evitar a degradação social da classe trabalhadora e do povo pobre. É fundamental organizar as lutas pelas reivindicações básicas, ampliando nossas forças. Mas não podemos parar aí, pois o que conseguimos com luta os patrões tiram depois, com vários métodos. Precisamos organizar e massificar a luta operária e popular para avançar no combate político contra as medidas do governo (reformas, leis, pagamento da dívida etc.), unindo e coordenando empregados e desempregados, independente de categoria ou sindicato, como uma só classe trabalhadora que dirija a luta anticapitalista e antiimperialista.
Porém, para garantir salários e direitos iguais, acabar com a precarização, o desemprego e a fome os trabalhadores precisam se preparar conscientemente para uma luta dura contra o capitalismo e os capitalistas, constituindo agrupamentos e organizações combativas e democráticas nas fábricas, locais de trabalho e sindicatos, expulsando os pelegos, que são um obstáculo para constituir uma nova direção classista, combativa e democrática que lute pelas reivindicações mais sentidas mas avance para lutas políticas contra os planos econômicas e reformas do governo, na perspectiva de derrotar o capitalismo, com uma revolução operária e socialista que reorganize a sociedade e a economia para os interesses da maioria da população.
Este processo preparatório deve ser a base para constituir uma vanguarda de trabalhadores e jovens avançados pela construção de um partido revolucionário de trabalhadores e organismos democráticos e de combate contra a exploração.