Marina terceira via ou “tucanismo pós-lulista”?
24/09/2014
Por Leandro Lanfredi
Sob ataques de Dilma e Aécio Marina ainda consegue se mostrar como “terceira via”. Porém, devido a um programa mais parecido com o dos tucanos e pela necessidade de ganhar os votos tucanos em um eventual segundo turno, a candidata se mostrará cada vez mais como uma centro-direita renovada, um “tucanismo pós-lulista”.
O “fenômeno Marina” é um fenômeno de difícil apreensão, e que, tal como seu programa está mudando a cada dia. Muda por ação própria, ação dos outros candidatos, percepção das massas sobre a mesma. O fator Marina é o que desestabilizou esta eleição e trás grande imprevisibilidade do resultado. Ele exige pensar este fenômeno em particular como parte de buscar entender o processo eleitoral como um todo.
A complexidade do fenômeno é muito maior do que o crescimento de sua votação em 2010 ao patamar que as pesquisas lhe dão hoje. É o que ela defende, como ela é vista e como estas coisas se encaixam ou não com a situação aberta com junho de 2013 o enigma do fenômeno. Não esgotaremos esta reflexão neste breve artigo.
O que Marina 2014 difere de Marina 2010?
A Marina de 2010, com seus 19,33% dos votos aparecia mais claramente como “terceira via” do que a atual. Tanto porque era mais marginal “nem um nem o outro”, como por uma ênfase mais específica em seu discurso em questões ambientais, com uma agenda diferenciada dos dois competidores principais. Agora não, se posta mais como “presidenciável de verdade”, impõe agendas e discute a agenda dos outros candidatos (e para fechar acordos com o agronegócio, sem o qual é muito difícil governar, mal fala de questões ambientais). Ser uma candidata tão importante é uma grande evolução para quem sequer conseguiu legalizar seu partido (a Rede) meses atrás e tinha como função ser puxadora de voto como vice para o falecido Eduardo Campos.
A dificuldade de entender o fenômeno Marina se dá porque o aumento de 10-15% dos votos entre 2010 e 2014 é algo muito mais qualitativo do que este número frio. Em 2010 o papel que ela cumpriu nas eleições foi sobretudo de tirar votos de Serra e do PSDB, com grande concentração dos votos na classe média e nos centros urbanos do centro-sul, mesmo que também tenha tirado votos de Dilma. Seus votos no segundo turno migraram tanto a Serra como a Dilma. Nesta eleição ela está tirando votos já no primeiro turno tanto de Dilma como de Aécio. Ela cresce ã “esquerda” e ã “direita”, e em termos de questões como direito ao aborto, casamento igualitário se coloca ã direita tanto do PT como do PSDB. E no caso de um segundo turno com Dilma os votos de Aécio migrariam quase completamente para Marina, segundo as pesquisas.
Quanto que Marina tira de Dilma, quanto de Aécio, e quanto do que estava nos votos nulos, é um fenômeno dinâmico. A única coisa que podemos ter certeza é que somado a tudo isto ela desidratou completamente a já pequena candidatura do evangélico e privatista Pastor Everaldo (do PSC de Feliciano) que tinha até 5% dos votos e agora tem só 1%. A cada pesquisa diferente e a cada semana podemos concluir uma predominância de um fator sobre o outro segundo as pesquisas mas que sempre aparece como uma soma de todos estes.
Porém, independentemente de sua expressão eleitoral, do discurso nos debates e na TV, o que parece ser o único caminho para Marina é crescer é para o lado tucano.
Um “tucanismo pós-lulista”
Em primeiro lugar suas declarações sobre a independência do Banco Central, a forma de suas críticas ã Petrobrás e ao pré-sal, sua política externa menos pró-Mercosul, a colocam mais em uma rota comum com os tucanos e buscando influir sobre esta parcela do eleitorado (por convicção ou conveniência, tanto faz).
Com estas demonstrações de neoliberalismo aberto em alguns planos da política, o PT e Dilma tem atacado Marina, isto pode consolidar o voto petista como anti-Marina e fechar o caminho dela para este flanco. Isto a empurra no outro flanco para crescer e vencer o segundo turno. Porém, por outro lado, Aécio também precisa atacar Marina como petista até ontem, vincula-la ao máximo com o PT, ao mensalào, ã corrupção, para retomar a votação histórica do PSDB (30%?) e assim tentar suplantá-la para o segundo turno.
Enquanto Dilma e Aécio atacam ao mesmo tempo ela aparenta ser algo de terceira via. Mas, se a tendência das pesquisas continuarem, ela emergirá no segundo turno apoiada pelo PSDB, se não por Aécio diretamente mas por FHC e pelo partido como um todo. O aspecto de terceira via e contra a “velha política” se enfraquecerá. Se este enfraquecimento será suficiente para uma velha disputa PT X PSDB travestida de PT X Marina, e se o PT prevalecerá com o mesmo discurso demagógico anti-neoliberal que conseguiu em 2006 e 2010 está em aberto (demagógico pois o PT leiloou o maior campo de petróleo do país e privatizou os 3 maiores aeroportos, para nem falar da continuidade, religiosa, de transferir 41% do orçamento aos detentores da dívida).
Mas o que já parece ser algo que podemos apontar é como Marina pode oferecer a setores neoliberais mais insatisfeitos com o PT (por querem mais do que o PT já lhes cede neste mesmo terreno) é algo que o PSDB não pode oferecer.
Mesmo com uma cara mais nova, com Aécio no lugar dos tradicionais Serra e Alckmin, o PSDB aparecia como anti-lulista e ante-lulista, como uma oposição que seria um retorno ao neoliberalismo dos 90, por mais que seus expoentes jurassem e jurem de pés-juntos que não pretendem privatizar tudo (em 2006 Alckmin chegou ao ridículo de posar para foto com um macacão com os símbolos de todas estatais), acabar com o bolsa família.
Marina, pode, por mais que defenda muito em comum com o PSDB, aparecer como um “tucanismo pós-lulista” e não anti-lulista. Afinal ela veio do PT e tal como Lula nasceu bem pobre. Setores de massa podem confiar mais em sua palavra que na de Aécio que ela não seria tanto uma negação do lulismo e do que este mesmo setor vê como conquistas dos governos do PT. Ou seja, se este caminho se consolidar, Marina pode ser ao mesmo tempo alguém que ajude a enfraquecer, e muito, o PSDB, pode ser alguém que finalmente dê uma cara renovada ao centro e ã direita anti-petista agora com uma cara pós-lulista finalmente encontrada.