Aceleração da recessão mundial e uma nova fase da crise financeira
O começo da Segunda Depressão?
02/02/2009
A crise financeira entrou em uma nova fase, desmentindo aos que afirmavam que com os resgates bilhonarios tinham conseguido contê-la. Nos EUA o governo teve que sair novamente em resgate do Bank of America enquanto o Citigroup será dividido. Na Europa se combinam a previsão de perdas do Royal Bank of Scotland (RBS) – que constitui o maior déficit histórico registrado por uma companhia no Reino Unido – a nacionalização do terceiro banco da Irlanda e as perdas do Deutsche Bank, o principal banco da Alemanha.
No dia 20 de janeiro as bolsas do mundo receberam a presidência Obama com uma forte queda: O Dow Jones fechou em baixa de 4,01%, ficando por baixo dos 8000 pontos, enquanto Nasdaq caiu 5,78% e o Standart & Poor’s 500, 5,28%. Nouriel Roubini, considerado guru econômico, disse que o sistema financeiro ‘está em bancarrota’, e projetou que a crise de crédito ocasionará perdas de US$3,6 trilhões nos EUA. Isto se dá em meio a uma forte desaceleração da economia mundial, do aumento galopante do desemprego, e das tentativas de ataque ã classe operária. Assim, cresce a perspectiva de grandes combates de classe, não só nos países dependentes e nas semicolonias, mas no mundo imperialista.
A aceleração da recessão e o perigo de fragmentação da economia internacional
Se setembro/outubro de 2008 foi o ponto de inflexão da crise financeira, os meses posteriores mostram uma brusca expansão da crise ã “economia real”, com o aumento das quebras e demissões em todos os países, a baixa dos investimentos e “expectativas” de produção. A indústria automotriz está vivendo a maior queda de sua história, levando a resgates estatais e fusões, como a que está sendo negociada entre a Fiat e a Chrysler. Mas a queda da demanda afeta todos os setores. Como consequência os fluxos comerciais, que cresceram mais rápido que o PBN mundial por décadas, estão diminuindo. Estima-se que em 2008 houve um descenso significativo no volume de exportações. Depois de anos de crescimento de dois dígitos, os da China estão caindo também.
Já não há país que não seja afetado. A queda do PBN nos EUA é brutal, como mostra a perda de mais de um milhão de empregos e a queda dos índices de consumo. A produção na área do euro caiu rapidamente, e o PIB do Japão despencou. A Grã-Bretanha segue os mesmos passos. E os famosos BRICs não ficaram imunes. A Rússia está ás portas de uma crise do rublo, com a perspectiva de desvalorização da moeda em relação ao dólar. O Brasil perdeu em dezembro 654.000 empregos, e na China no ano passado 4 milhões de trabalhadores migrantes perderam seus empregos.
Assim, economistas burgueses como Martin Wolf do Financial Times assinalam: “Pensem no que sucederá se depois de dois anos de monstruosos déficits fiscais, com os EUA em meio ao desemprego e ao crescimento lento. Nos perguntamos por que o país exporta tanto de sua demanda para sustentar empregos fora do país. A última vez que isso aconteceu – na década de 30 – o resultado foi uma série devastadora de desvalorizações “As custas do vizinho”, mais protecionismo. Podemos estar seguros de evitar estes perigos? Pelo contrário, o perigo é extremo. Uma vez que a integração da economia mundial começa a se reverter e o desemprego cresce, os demônios de nosso passado – sobretudo o nacionalismo – regressarão. As conquistas das últimas décadas podem colapsar da noite para o dia” (Financial Times, 6/1/2009).
Uma nova fase da crise financeira: o fracasso dos resgates estatais
Os problemas das megaentiades financeiras quebraram o mito de que o pior passou graças aos planos de resgate. Se uma injeção de 4,5 bilhões de dólares e garantias estatais de mais 26 bilhões de dólares não foi suficiente para salvar o Citigroup, é por que a situação é gravíssima. Um dos poucos “baluartes” que restavam no sistema financeiro dos EUA, o Bannk of America teve que receber uma segunda ajuda estatal, avaliada em 138 bilhões de dólares para sanar a dívida derivada da compra de Merrill Lynch. A entidade conseguiu uma injeção direta de 20 bilhões em troca de ações, além de 11,8 bilhões para respaldar os ativos duvidosos do banco. A estas somas adiciona-se 25 bilhões de dólares dos cofres públicos num pacote “forçado”.
Já o Deustche Bannk na Alemanha surpreendia os investidores ao anunciar que fecharia 2008 com perdas de 3,9 bilhões de euros. Por isso tem recorrido a uma ampliação de capital público: o Estado alemão entrará indiretamente no Deutsche Bannk depois que o Deutsche Post tornar efetiva a compra de uma parte desta entidade de crédito. Já as autoridades irlandesas nacionalizavam o Anglo Irish Bannk, o terceiro banco do país. Mas isso não era mais que aperitivo quando o Royal Bannk of Scotland (RBS), o segundo banco do Reino Unido, anunciou perdas de até 28 bilhões de libras em 2008, sendo o maior déficit histórico de uma companhia no país. Já os principais bancos britânicos são “tecnicamente insolventes”, se seu grau de capitalização for medido estritamente a preços de mercado.
A realidade dos bancos norte-americanos não é diferente. Como diz Frank Partnoy, professor de finanças e direito da Universidade de San Diego: “A queda dos ativos e o aumento dos passivos fez com que muitos bancos grandes sejam essencialmente insolventes, e tem sido durante muito tempo. É incrível que tenham perdido tanto dinheiro em derivativos, mas é mais surpreendente que tenham sobrevivido depois disso”. Em outras palavras, são bancos que tem capital só para se manter em pé, mas não para emprestar ás empresas e ás pessoas. Banco “mau” estatal: nacionalização temporária ou inevitável default A nova fase da crise financeira inaugurou uma inclinação em transformar os ativos tóxicos de um mau banco em estatais, sem tocar nos direitos de propriedade dos atuais acionistas. Isso busca evitar a nacionalização dos grandes bancos. A questão chave é como manejar estes ativos e a que preço seriam cotizados. Os bancos pensam que seus ativos valem mais do que os investidores estão dispostos a pagar. Se o governo apóia os investidores, os bancos são forçados a tratar a diferença como perda. Mas forçar os bancos a reconhecer perdas maiores derrubaria mais a pouca confiança que ainda resta junto aos investidores.
Portanto o governo teria que entregar aos bancos um montante superior ao valor de mercado pelos ativos tóxicos. Isso constituiria uma sobrecarga de proporções históricas que seria descarregada nas costas dos trabalhadores e do povo através de cortes sociais e novos impostos. Frente a tal subsídio, aumentou o pedido de alguns analistas, como Paul Krugman, sobre a necessidade do governo dos EUA reunirem as propriedades bancárias como compensação pelo resgate. Por sua vez, uma nacionalização temporária de amplos setores do sistema financeiro evitaria o problema de arcar e vender ativos tóxicos, já que seriam mantidos em quarentena antes de serem vendidos. Mas como diz o jornal britânico The Daily Telegraph “não há garantia de que estas medidas tenham êxito. A grande escala do empréstimo governamental pode esgotar o estoque de capital global”.
Os mercados já estão questionando a solvência de estados. À FED pode ser muito difícil se retirar da colossal intervenção nos mercados acionários. No final, a única saída da dívida global pode ser um perdão ‘bíblico’ da dívida. Os credores não gostarão disso”. Assim, seja avançando sobre os bens dos bancos no caso da nacionalização temporária, ou sobre o direito dos credores para em ambos os casos salvar o sistema capitalista, a aponta para uma resolução de força que golpeará o equilíbrio político e social.
Ataques diretos ã classe trabalhadora e perspectivas de grandes combates de classe
Isso está levando a crescentes ataques aos direitos dos trabalhadores. Na Europa isso se mostra na perda de qualificação creditícia por parte da Espanha, cujo informe de uma agência atesta ser especialmente ruim a previsão do aumento da dívida pública (emissões menos investimentos): cerca de 18% do PIB nos próximos quatro anos, o que equivale a 200 bilhões de euros a serem pagos pelas gerações futuras. Um famoso economista irlandês, David McWillians, ex-funcionário do banco suíço UBS informou ao The Daily Telegraph em 19/1: “É essencial ir ã Europa explicar que temos um problema grave. E que digamos: ou suspendemos os pagamentos, ou saímos da Europa. Se a Irlanda suspende os pagamentos, toda a Europa será afetada. O mesmo poderia ocorrer na Espanha, Itália ou Grécia”.
O governo irlandês está abaixando o salário dos funcionários públicos para diminuir a tendência de que o déficit público alcance 12% do PIB. Segundo os jornais locais o governo imporia os cortes com ou sem acordo sindical. A burocracia sindical é correia de transmissão deste brutal ataque com a seguinte ameaça: “Os detalhes das negociações emergiram após Dan Murphy, secretário geral do sindicato de serviços públicos, escrever aos secretários regionais de sua organização alertando que o governo deveria buscar um resgate do FMI. Alertou que isso poderia levar a demissões massivas no setor público”. (Financial Times 14/1/2009).
Mas perspectivas como a da Irlanda podem se generalizar na Europa, como é o caso da Espanha cujo desemprego pode saltar a 19% este ano (4 milhões). O Economista de 20/1 diz: “A única via de ajuste é uma queda brusca dos salários reais, que a rigidez salarial obriga a canalizar através de um aumento do desemprego”.
Frente a esta perspectiva os revolucionários temos que levantar um programa para que os capitalistas paguem a crise. Se a classe operária não intervier de maneira independente a catástrofe cairá sobre os ombros das massas exploradas do mundo, com desemprego em massa e novas guerras, como vimos na ofensiva de Israel sobre Gaza com o aval dos EUA. Ante este cenário há que defender a nacionalização sem pagamento de indenização e administração operária dos bancos. As demissões devem ser enfrentadas com a repartição das horas de trabalho sem cortes salariais. As empresas que demitem devem ser expropriadas e postas a funcionar sob controle operário. Estamos entrando numa etapa na qual se torna mais urgente avançar na construção de partidos revolucionários da classe operária e da reconstrução da IV Internacional. A esta tarefa convocamos as organizações que tomam parte da FT-QI.