FT-CI

Eleições na França

Os limites da Frente de Esquerda de Mélenchon e as tendências liquidacionistas no seio da extrema esquerda

29/04/2012


Por Juan Chingo, Corriente Comunista Revolucionaria do NPA
Corrente Comunista Revolucionária – Plataforma 4 do NPA

No último dia 22 de abril se realizou o primeiro turno das eleições presidenciais na França, no qual se saiu vencedor François Hollande, candidato do reformista Partido Socialista (PS), com 28,6% dos votos, que irá ao segundo turno com o atual presidente Nicolas Sarkozy do UMP (União por um Movimento Popular), que teve 27% de votos. Além desses candidatos, a “grande surpresa” foi Marine Le Pen, candidata da direitista e xenófoba Frente Nacional (FN), que conseguiu 17,9% dos votos, convertendo-se na terceira força eleitoral. O Frente de Esquerda que esperava receber mais de 15% de votos com seu candidato Jean Luc Mélenchon apenas chegou a 11%. Pela “extrema esquerda”, Philipe Poutou, candidato do Novo Partido Anticapitalista (NPA), obteve 1,15% dos votos e Nathalie Arthaud, do Lutte Ouvrière 0,56%. A alta votação da Frente Nacional é expressão de um sentimento antisarkozista frente aos devastadores efeitos da crise econômica (que não pode ser capitalizado pelo PS que participa de vários governos aplicadores de medidas tão neoliberais como as da UMP) e também é expressão da traição da burocracia sindical que levou a derrota do movimento de luta contra a reforma das pensões em 2010. Seja Hollande ou Sarkozy o vencedor do segundo turno, ambos se preparam para implementar maiores planos de ajuste. É necessário nos prepararmos para responder aos ataques do futuro governo, aos planos de demissões da patronal e para resistir contra a política racista e xenófoba da Frente Nacional. Apresentamos a seguir a continuação de um artigo sobre os perigos que representa a FN e a necessidade de enfrentá-la como também sobre os limites da Frente de Esquerda de Mélenchon que foi apresentado como a “nova figura” da esquerda francesa e os debates abertos no interior da extrema esquerda do NPA e a candidatura de Philipe Poutou.


O importante avanço da ultradireitista Frente Nacional (FN) é um alerta para todos os militantes e votantes da esquerda e, em especial, para as correntes da extrema esquerda. Os problemas que tem sido enfrentados na construção de uma força operária contra-hegemônica ã dupla UMP-PS, que vem governando a França desde décadas, que foi responsável pela ofensiva neoliberal e agora pelas políticas de austeridade para descarregar a crise capitalista nas costas dos trabalhadores, esses problemas são de uma enorme importância para os inevitáveis combates de classe que se aproximam, seja Sarkozy ou Hollande o vencedor no segundo turno.

Uma Frente dentro dos marcos do regime

Apesar de sua forte retórica e simbolismo, a Frente de Esquerda é uma opção dentro dos marcos da degradada democracia imperialista francesa. Esta apareceu como uma variante mais radical da esquerda institucional, com o objetivo de criar uma melhor relação de forças no terreno eleitoral para mudar a sua dinâmica. Quem pode acreditar numa alternativa de esquerda que busca pressionar uma centro-esquerda neoliberal, representada por Hollande e companhia, responsáveis desde os anos 80 pela flexibilização e as privatizações na França, na Europa e no mundo? Seja com Mélenchon se integrando num eventual futuro governo do PS ou não, sua política é subsidiária do “campo da esquerda” institucional que desde há tempos deixou de ser visto como uma alternativa para setores precarizados da classe operária e periferias mais pobres das classes médias. Mélenchon tem uma longa trajetória dentro das instituições do regime, como parte do Partido Socialista, desde que chegou a seu primeiro cargo público relevante, em 1978, até quando rompeu com esse partido há treze anos. Seus “padrinhos políticos” são nada mais nada menos que Miterrand e Jospin, o primeiro, responsável pelo giro neoliberal na França depois da crise dos 70; o segundo, primeiro ministro do governo mais privatizador. Por isso não é atrativo para amplos setores populares, para quem o PS é sinônimo de contra-reforma social. Menos ainda para aqueles totalmente desesperados pela crise, que buscam uma saída radical e que, na falta de uma verdadeira saída contra o sistema pela esquerda, terminam expressando sua cólera através do voto na Frente Nacional ou na abstenção.

Em outras palavras, a ausência de uma verdadeira opção revolucionária contra o sistema, que o fortalecimento relativo da Frente de Esquerda como opção reformista busca tapar, não permite que se expresse uma verdadeira aliança dos explorados contra a França da patronal e seus partidos. Por sua vez, o fato da Frente Nacional penetrar nessas camadas sociais não se explica só pelo desespero e polarização, mas fundamentalmente pelo papel das direções históricas e atuais do movimento operário organizado, que a todo momento apresentam a defesa do emprego não desde um ângulo do interesse dos trabalhadores, mas sim desde o ângulo do capitalismo francês.

O “republicanismo de esquerda” de Mélenchon não rompe com esse esquema, como não poderia deixar de ser, devido a sua localização como político responsável do Estado e da nação francesa, que até o levou a fazer uma reivindicação pela direita do colonialismo francês, o oposto dos valores internacionalistas do movimento operário. Desde então grande parte dos votantes de Mélenchon buscam uma alternativa de esquerda ao PS. Contudo, a questão é que sem superar esses limites do projeto da Frente de Esquerda, a construção de uma força contra-hegemônica operária e popular oposta ao bipartidarismo da V República é impossível, o que dá tempo para a Frente Nacional apresentar uma alternativa a este regime em decomposição e reacionário pela direita, um perigo que todos coincidimos que deve ser combatido e derrotado.

Poutou: um bom candidato, mas órfão de partido

Frente a isso, a campanha de Philipe Poutou (NPA) mostrou a enorme necessidade dos trabalhadores de uma voz que realmente expresse as demandas sentidas pela população. Em meio aos enormes obstáculos internos ã sua candidatura e a emergência da Frente de Esquerda como mediação, o fato do seu discurso ter conseguido ser ouvido durante a campanha é um grande feito. Não ter sido ainda mais ecutado e, sobretudo, que não ter conseguido mais apoio não se deve ao caráter “arquetipicamente setentista” ou “obreirista” da sua candidatura. Os primeiros responsáveis dessa situação são os dirigentes da corrente liquidacionista dentro do próprio NPA, que impressionados pela dinâmica eleitoral que aparentemente estava adquirindo a Frente de Esquerda, fizeram o partido apoiar abertamente Mélenchon. Contra sua cegueira oportunista, a “dinâmica” autoproclamada da Frente de Esquerda tem mostrado seus limites: longe dos 15% anunciado por algumas pesquisas, com um universo de votos a esquerda do PS, relativamente estável desde 1995, os votos de Mélenchon expressam essencialmente uma transferência de votos desde a extrema esquerda trotskista a um reagrupamento reformista. Aqui está toda a dinâmica! O que demonstra que a deriva desses setores vá além de um “erro de apreciação” é que inclusive depois de conhecidos os porcentuais eleitorais, falam do “honrável resultado” de Mélenchon, o que choca com a decepção dos votantes e simpatizantes da Frente de Esquerda ante a votação obtida, abaixo das expectativas.

Se a campanha de Poutou não teve maior impacto (independente do reduzido número de votos que alcançou) não foi por nenhum dos falsos motivos enunciados por quem, desgraçadamente, preferiu mesclar seu programa com o dos anti-neoliberais, mas porque não expressava a existência no NPA de uma corrente de operários revolucionários atraídos a suas filas por seu papel na onda de greves com métodos duros em 2009 ou nos combates generalizados no outono de 2010 contra a reforma das aposentadorias. Desde sua fundação o NPA não esteve estruturando um partido nos principais bastiões da classe operária industrial e dos serviços estratégicos, mas sim na “magia” eleitoral que hoje se volta contra o ascenso da Frente de Esquerda. Como mostrou a própria história do NPA com Olivier Besancenot, o êxito eleitoral não é suficiente para relançar um projeto de construção contra-hegemônico se este não é expressão de uma mudança do estado de ânimo e combatividade do movimento de massas.

É aqui que devemos buscar a explicação principal para as debilidades da campanha de Poutou e do porque Mélenchon pode canalizar os votos da esquerda do PS: é que quando os trabalhadores e estudantes franceses mostraram sua intenção de dar uma luta até o final contra o governo de Sarkozy, suas energias foram canalizadas pelas direções sindicais para uma estratégia de pressão “in extremis”, que somente buscava negociar o inegociável. O mais trágico é que frente a esse papel das direções sindicais, tanto o NPA como o resto da extrema esquerda como Lutte Ouvrière foram incapazes não só de oferecer uma alternativa real ã política de conciliação com o regime burguês e a ofensiva neoliberal, mas também de expor sua política frente ã vanguarda.

Por uma alternativa operária revolucionária

Hoje o NPA está pagando essas falências ligadas a concepção estratégica de um partido amplo sem uma clara delimitação de classe e com um programa ambíguo, quer dizer, de ter abandonado a herança trotskista para construir um novo partido sem “hipóteses estratégicas”, rompendo a relação indissolúvel entre os meios estratégicos (ditadura do proletariado, governo dos trabalhadores) e o objetivo, o “fim político” (a sociedade sem classes, quer dizer, o comunismo). Resolver este impasse estratégico é a única “decisão vital” que o NPA deve tomar se quer sair de sua crise. Enquanto que os dirigentes do NPA que seguiram a Frente de Esquerda insistem com sua política de fazer um bloco estratégico com variantes do regime burguês como Mélenchon e os reformistas para “enfrentar a FN”, nossa melhor arma contra a extrema-direita é nosso programa anticapitalista e revolucionário que diz alto e forte que há outra alternativa radical ã UMP-PS, a alternativa da revolução socialista.

Alternativa que opõe ã xenofobia e ao patriotismo um discurso internacionalista proletário. Que explica aos trabalhadores que o único “Estado forte” que estará a seu favor é o que eles próprios dirigirem democraticamente. A luta por esse programa anticapitalista, que não é o de Mélenchon, vai desde a necessidade de uma política audaz de frente única para a ação com todos os que se oponham a austeridade, mas sem confundir nossas bandeiras. O ascenso da FN, em um cenário de crise aguda como o que vive a Europa e que pode golpear a França mais aberta e catastroficamente faz urgente a discussão sobre o tipo de partido que se necessita para os futuros enfrentamentos. Nossa luta é por construir um partido revolucionário capaz de vencer as traições das direções sindicais, contra o método de ajuste de Hollande, e que se prepare estrategicamente para um endurecimento do regime, caso a decepção com o PS leve a um governo da direita recomposta em torno da FN. Este é o desafio para o apaixonante e dramático período que nos abre.

25-04-2012

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