FT-CI

Paquistão

Incerteza política diante da renúncia de Musharraf

01/09/2008

Incerteza política diante da renúncia de Musharraf

Em 18 de agosto passado, milhares de paquistaneses saíram ás ruas das principais cidades do país para celebrar o fim do governo de Pervez Musharraf. O ex-ditador renunciou ao seu cargo de presidente para evitar um julgamento político impulsionado pela coalizão opositora encabeçada pelo Partido do Povo Paquistanês (PPP), acusado de corrupção e "traição ã pátria", além de crimes e desaparecimentos cometidos pelo exército durante seu governo. A renúncia de Musharraf foi precedida por negociações entre o PPP, funcionários norte-americanos, britânicos e sauditas, que terminaram selando um acordo no qual garantiram imunidade jurídica ao ex-presidente.

Ascenso e queda de um aliado do imperialismo

Musharraf assumiu o governo através de um golpe de Estado em 1999, pelo qual substituiu o então primeiro ministro Nawaz Sharif, atualmente líder do partido opositor Liga Muçulmana Paquistanesa, e que era questionado pela burguesia local por seus desentendimentos com os Estados Unidos devido a sua política de desenvolver armamento nuclear e as tensões que isso gerava com seu rival histórico, a Índia. Sharif foi considerado culpado de corrupção e exilado.

Desde então, Musharraf teve o apoio dos Estados Unidos, que se aprofundou depois dos atentados de 11 de setembro, transformando-se em um dos principais aliados de George Bush em sua "guerra ao terrorismo". Musharraf rompeu relações com o regime dos talibãs e aceitou colaborar com as tropas imperialistas na guerra de ocupação do Afeganistão e com a perseguição de grupos islà¢micos em seu próprio território a pedido dos Estados Unidos, ainda que setores do exército e os serviços secretos mantiveram e mantêm laços com os talibãs. Em troca, recebeu não apenas apoio internacional, mas também uma ajuda de Washington no valor de US$ 11,8 bilhões.

Desde que assumiu o poder, implementou uma série de medidas neoliberais, como a privatização das indústrias do aço e da eletricidade, o que, junto a sua política abertamente pró-norte-americana rechaçada por amplos setores paquistaneses e do conjunto do mundo muçulmano, e ao seu ataque ás liberdades políticas elementares, foram aumentando a impopularidade de Musharraf. A exigência dos Estados Unidos de combater internamente as forças islà¢micas levou a sangrentos enfrentamentos entre essas e o exército (como os que levaram ao assalto ã chamada "mesquita vermelha"), transformando a fronteira entre Paquistão e Afeganistão em um campo de batalha. Essa situação radicalizou ainda mais as organizações islà¢micas como, por exemplo, a Ansar Al-Islam, que aumentaram consideravelmente seu apoio popular.

Durante o último um ano e meio, acelerou-se a erosão da base social do governo. Depois de um conflito prolongado por sua reeleição, que incluiu o abandono de seu cargo de titular da Suprema Corte de Justiça, em novembro de 2007 Musharraf tentou, sem êxito, impor o estado de emergência sobre mobilizações opositoras de massas e suspendeu uns 60 juízes que tinham que decidir sobre a legitimidade constitucional do segundo mandato presidencial de Musharraf, que havia começado em outubro daquele ano.

Somou-se a isso a deterioração da economia e a saturação de amplos setores das classes médias com sua ditadura, que empurraram ao protesto quase a totalidade das classes sociais, incluindo um setor fundamental do establishment da burguesia local, que começou a gerar as condições para uma substituição de governo. Diante da falta de sustentação para sua política, Musharraf se viu obrigado a chamar eleições no inicio de 2008.

No marco da crescente instabilidade e da persistência dos ataques dos talibãs contra as tropas da OTAN no Afeganistão, os Estados Unidos negociou, no fim de 2007, o retorno ao país da ex-primeira ministra Benazir Bhutto, dirigente do PPP exilada, apostando conseguir uma válvula de escape e estabelecer um governo com maior legitimidade. Mas Bhutto foi assassinada em dezembro, aumentando ainda mais o descontentamento com o governo.

Finalmente, Musharraf sofreu uma derrota humilhante nas eleições parlamentares de fevereiro, conseguindo o terceiro lugar, atrás do PPP e da Liga Muçulmana Paquistanesa.

Deste então, Bush realizou duas reuniões com o novo primeiro ministro, Yousaf Gilani, para recordá-lo de seu compromisso no combate contra os talibãs e a necessidade de limpar os serviços de inteligência paquistaneses de elementos que simpatizam com forças islà¢micas, acusados de facilitar que Osama bin Laden e outros importantes líderes da Al Qaeda se escondam.

Um fator decisivo na renúncia de Musharraf é que Washington não fez nada para evitar o julgamento político do ex-presidente, anunciado em 7 de agosto, e que a administração republicana parece considerar o PPP como o aliado mais confiável nesse momento, para enfrentar a resistência afegã que atua na fronteira do país.

Instabilidade política

Apenas 24 horas depois da renúncia de Musharraf já se manifestou a crise política que sacode o país. Os dois partidos patronais que formam a coalizão parlamentar são rivais históricos que só se manteriam unidos para enfrentar Musharraf. Agora começou a luta interna sobre quem será o novo presidente e sobre importantes questões políticas, como o restabelecimento dos juízes demitidos por Musharraf.

Soma-se a isso a relação historicamente tensa entre o exército e o PPP e a intensa pressão que faz os Estados Unidos para ampliar as operações militares nas zonas tribais das fronteiras com o Afeganistão[1], onde os talibãs têm reconstruído sua base de operações.

A ameaça de julgamento político que precipitou a renúncia de Musharraf restaurou em parte a popularidade do PPP e da oposição, que vinha de uma crise de seis meses e da perda acelerada de apoio de sua base por suas políticas econômicas similares ás do governo anterior e por terem sustentado Musharraf durante esses meses. O descontentamento social aumenta e a economia está em uma profunda crise, golpeada pelo aumento dos preços dos alimentos e do petróleo. A inflação anual está por volta dos 25%, a mais alta dos últimos 30 anos, a moeda local vem despencando enquanto cresce o déficit comercial. A acusação de corrupção contra Musharraf parece piada quando surge do líder do PPP, Asif Zarcadi, viúvo de Bhutto e o segundo homem mais rico do país, cuja fortuna aumentou consideravelmente quando sua mulher foi primeira ministra. As ilusões na oposição e na “renovação democrática” parecem estar destinadas a uma vida curta. O novo governo apenas se proporá a realizar de forma mais eficiente o que Musharraf já não podia levar ã diante, ou seja, privatizar o que ainda resta do setor público e se oferecer como sócio mais confiável para o imperialismo em sua “guerra ao terrorismo”. Essa situação explosiva pode oferecer oportunidades num futuro próximo para que os trabalhadores e as massas populares paquistanesas emerjam de forma independente contra o imperialismo e seus agentes no governo.

Traduzido por Beatriz Michel

  • TAGS
Notas relacionadas

No hay comentarios a esta nota

Jornais

  • PTS (Argentina)

  • Actualidad Nacional

    MTS (México)

  • EDITORIAL

    LTS (Venezuela)

  • DOSSIER : Leur démocratie et la nôtre

    CCR NPA (Francia)

  • ContraCorriente Nro42 Suplemento Especial

    Clase contra Clase (Estado Español)

  • Movimento Operário

    MRT (Brasil)

  • LOR-CI (Bolivia) Bolivia Liga Obrera Revolucionaria - Cuarta Internacional Palabra Obrera Abril-Mayo Año 2014 

Ante la entrega de nuestros sindicatos al gobierno

1° de Mayo

Reagrupar y defender la independencia política de los trabajadores Abril-Mayo de 2014 Por derecha y por izquierda

La proimperialista Ley Minera del MAS en la picota

    LOR-CI (Bolivia)

  • PTR (Chile) chile Partido de Trabajadores Revolucionarios Clase contra Clase 

En las recientes elecciones presidenciales, Bachelet alcanzó el 47% de los votos, y Matthei el 25%: deberán pasar a segunda vuelta. La participación electoral fue de solo el 50%. La votación de Bachelet, representa apenas el 22% del total de votantes. 

¿Pero se podrá avanzar en las reformas (cosméticas) anunciadas en su programa? Y en caso de poder hacerlo, ¿serán tales como se esperan en “la calle”? Editorial El Gobierno, el Parlamento y la calle

    PTR (Chile)

  • RIO (Alemania) RIO (Alemania) Revolutionäre Internationalistische Organisation Klasse gegen Klasse 

Nieder mit der EU des Kapitals!

Die Europäische Union präsentiert sich als Vereinigung Europas. Doch diese imperialistische Allianz hilft dem deutschen Kapital, andere Teile Europas und der Welt zu unterwerfen. MarxistInnen kämpfen für die Vereinigten Sozialistischen Staaten von Europa! 

Widerstand im Spanischen Staat 

Am 15. Mai 2011 begannen Jugendliche im Spanischen Staat, öffentliche Plätze zu besetzen. Drei Jahre später, am 22. März 2014, demonstrierten Hunderttausende in Madrid. Was hat sich in diesen drei Jahren verändert? Editorial Nieder mit der EU des Kapitals!

    RIO (Alemania)

  • Liga de la Revolución Socialista (LRS - Costa Rica) Costa Rica LRS En Clave Revolucionaria Noviembre Año 2013 N° 25 

Los cuatro años de gobierno de Laura Chinchilla han estado marcados por la retórica “nacionalista” en relación a Nicaragua: en la primera parte de su mandato prácticamente todo su “plan de gobierno” se centró en la “defensa” de la llamada Isla Calero, para posteriormente, en la etapa final de su administración, centrar su discurso en la “defensa” del conjunto de la provincia de Guanacaste que reclama el gobierno de Daniel Ortega como propia. Solo los abundantes escándalos de corrupción, relacionados con la Autopista San José-Caldera, los casos de ministros que no pagaban impuestos, así como el robo a mansalva durante los trabajos de construcción de la Trocha Fronteriza 1856 le pusieron límite a la retórica del equipo de gobierno, que claramente apostó a rivalizar con el vecino país del norte para encubrir sus negocios al amparo del Estado. martes, 19 de noviembre de 2013 Chovinismo y militarismo en Costa Rica bajo el paraguas del conflicto fronterizo con Nicaragua

    Liga de la Revolución Socialista (LRS - Costa Rica)

  • Grupo de la FT-CI (Uruguay) Uruguay Grupo de la FT-CI Estrategia Revolucionaria 

El año que termina estuvo signado por la mayor conflictividad laboral en más de 15 años. Si bien finalmente la mayoría de los grupos en la negociación salarial parecen llegar a un acuerdo (aún falta cerrar metalúrgicos y otros menos importantes), los mismos son un buen final para el gobierno, ya que, gracias a sus maniobras (y las de la burocracia sindical) pudieron encausar la discusión dentro de los marcos del tope salarial estipulado por el Poder Ejecutivo, utilizando la movilización controlada en los marcos salariales como factor de presión ante las patronales más duras que pujaban por el “0%” de aumento. Entre la lucha de clases, la represión, y las discusiones de los de arriba Construyamos una alternativa revolucionaria para los trabajadores y la juventud

    Grupo de la FT-CI (Uruguay)